Olhos esbugalhados e inofensiva: espécie de cobra é registrada pela primeira vez no Ceará

A serpente tem um pequeno porte, geralmente menor do que 1 metro

06:00 | Out. 22, 2024

Por: Gabriel Damasceno
A serpente é de pequeno porte, geralmente menor do que 1 metro (foto: Acervo pessoal/Rodrigo Gonzalez)

Ainda em 2022, moradores de Guaramiranga, a 105,76 km de Fortaleza, ficaram espantados com os olhos esbugalhados da 'cobra dormideira', registrada cientificamente pela primeira vez no Ceará em outubro deste ano por um artigo publicado no periódico 'Herpetologia Brasileira'.

Rodrigo Gonzalez, curador das coleções de herpetologia do Museu de História Natural do Ceará (MHNCE) e um dos autores do artigo, destaca que a própria população foi atrás dos pesquisadores para falar sobre o animal. "Eles tinham encontrado uma serpente, mas não sabiam o que era. É um animal conhecido de outras localidades do Brasil, mas, até então, não ocorria no Ceará".

A principal característica física da espécie, chamada cientificamente de Dipsas indica Laurenti, são os olhos. Gigantescos. Daí a dúvida: porque dormideira se os olhos são tão esbugalhados? "Nenhuma cobra tem pálpebra. Nenhuma pisca, nem fecha o olho. As Dipsas tem o olho muito grande, mas se chama de dormideira porque é muito calma, muito sossegada, vive em cima de árvore", explica Rodrigo.

A dormideira, segundo o pesquisador, é uma serpente de pequeno porte, geralmente menor do que 1 metro. Ela, que é arborícola e noturna, é completamente inofensiva. O animal, além disso, é conhecido por ter uma alimentação especializada em caracois e lesmas, pois possui adaptações na mandíbula que permitem arrancar os animais das conchas antes de se alimentar.

No Brasil, a espécie ocorre de forma disjunta: com populações na Amazônia, na Mata Atlântica e, agora, na Serra de Baturité. De acordo com Rodrigo, a ocorrência da dormideira no Ceará é uma surpresa, mas, ao mesmo tempo, já era algo esperado.

"A Serra de Baturité é um local que a gente chama de relictual. Um dia a Amazônia e a Mata Atlântica foram conectadas, há muito tempo, mas essa conexão foi extinta, porque tiveram muitas mudanças climática e geográficas. Mas, alguns locais [resistiram], principalmente em áreas de altitude", destaca Rodrigo.

"A região de Baturité guarda elementos da fauna e da flora da Mata Atlântica e da Amazônia. Então, têm várias espécies que ocorrem por lá que são compartilhadas [entre os dois biomas]. Em 2022, a gente encontrou outra espécie, a Jararaca Verde, da mesma forma", adiciona.

Para o pesquisador, isso reforça a necessidade da região ser mais pesquisada. "Tem potencial para mais estudos, além de ser um apelo pela conservação da área. Veja a importância que elas têm. Têm espécies de ocorrência nova aparecendo agora, depois de tanto tempo", pontua.

O estudo que registrou a ocorrência da espécie no Ceará foi feito por Rodrigo, Thabata Cavalcante, Francisco Robson Figueiredo da-Costa e Daniel Cassiano-Lima. Todos são do MHNCE, que é ligado a Universidade Federal do Ceará (Uece).