Indígenas bloqueiam rodovias em Caucaia contra mudanças na demarcação de terras

Manifestantes protestam contra o chamado "marco temporal", que impõe barreiras à demarcação de terras para povos originários

Em protesto contra mudanças nas regras de demarcação de terras no Brasil, índios da etnia Anacé bloquearam parcialmente trechos da BR-222 e da CE-085, em Caucaia, Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), nesta quarta-feira, 25. O ato, que começou por volta das 13 horas, interrompeu o tráfego de veículos até as 17h30min, causando um congestionamento quilométrico. Segundo as lideranças do movimento, pelo menos 150 indígenas participaram da manifestação.

O foco da mobilização é o julgamento de uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) - previsto inicialmente para esta quarta-feira, mas adiado para amanhã, 26 - que pode instituir o “marco temporal” na delimitação de terras para povos originários. A regra prevê que os indígenas só poderiam reivindicar direito por terras ocupadas até a data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988. Na prática, o dispositivo condiciona a demarcação a um comprovante de posse, o que hoje não é exigido pela legislação.

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Para o indígena Miguel Anacé, 24, um dos organizadores do ato realizado no Ceará, a proposta de mudança nas regras de demarcação representa “um ataque direto à origem brasileira”. “Não fere só os índios. Fere a nossa cultura, a nossa memória como povo”, disse. Ele explicou que o foco principal da mobilização é chamar a atenção das autoridades e da população para o que classificou como um “retrocesso sem precedentes” na história do Brasil. “Nós estamos aqui pra dizer que Indígena nunca desiste. Onde for ferida a nossa existência, a gente vai resistir”, afirmou.

O ato ocorrido no Ceará se juntou a uma manifestação realizada na Praça dos Três Poderes, em Brasília, que contou com a participação de ao menos mil lideranças indígenas de várias partes do Brasil. Representantes de 170 etnias estão acampados desde o último domingo, 22, em frente à Praça da Cidadania, nos arredores da Esplanada dos Ministérios. De acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), no total, cerca de seis mil indígenas participam do acampamento, fazendo dessa a maior mobilização já realizada pelos povos originários do Brasil.

Segundo apurado pelo O POVO, ao menos 200 cearenses de 15 etnias diferentes viajaram à Capital Federal para participar dos protestos. Um deles é Thiago Anace, liderança indígena da reserva Taba do Povo Anacé, situada em Caucaia. “Saímos do Ceará sábado (21) à tarde e a nossa previsão é retornar no próximo sábado [28] pela manhã. Já tivemos várias plenárias e manifestações sobre pautas importantes para os povos originários”, detalha Thiago. Para ele, a votação do STF pode representar um divisor de águas nos direitos à exploração de terras por indígenas brasileiros. “A situação é muito grave, o que está em jogo é o futuro da demarcação das terras indígenas no País. Mesmo sendo um momento muito difícil, estamos confiantes que o STF vai cumprir o seu papel e fazer valer o texto constitucional”, afirma.

Delegação de indígenas do Ceará participa de manifestação contra mudanças nas regras de demarcação de terras, em Brasília
Delegação de indígenas do Ceará participa de manifestação contra mudanças nas regras de demarcação de terras, em Brasília (Foto: Débora Anacé)

A corte avalia, em particular, o caso de uma reserva indígena de Santa Catarina reivindicada pelo Governo do Estado com base no argumento do marco temporal. A decisão, no entanto, deve causar repercussão geral, afetando outras ações judiciais que tratem sobre o mesmo tema.

As lideranças indígenas acreditam ainda que uma eventual decisão favorável do STF poderia enfraquecer o PL 490/2007, aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados em junho, que além de instituir o marco temporal, também abre margem para a exploração de terras indígenas por garimpeiros e proíbe a ampliação de áreas já demarcadas.

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