Dia de São Francisco: fé expressada por devotos toma conta de Canindé

Por todos os lados da cidade de Canindé nesta quarta-feira, 4, alguém estava rezando, pedindo uma bênção ou pagando promessas por graças alcançadas. O dia marcou o fim da festa de São Francisco de Assis, celebrada desde 24 de setembro na cidade do Sertão Central do Ceará. Os dez dias de festejos reuniram devotos de diversos estados do Brasil com a intenção de expressar a fé pelo santo.

O evento realizado no Ceará é considerado o segundo maior do mundo em comemoração à vida e aos milagres de São Francisco, ficando atrás apenas da celebração na cidade de Assis, na Itália. Cerca de um milhão de fiéis eram esperados na cidade durante a festa.

Os pedidos ao santo são dos mais variados, desde a cura por dores de cabeça, a conquista da casa própria, até a saúde de um animal de estimação. Na Casa de Milagres, parte do Santuário de São Francisco dedicada às graças alcançadas dos devotos, fiéis transitavam durante todo o dia enquanto cumpriam e registravam promessas.

Ana Cláudia de Jesus, 35, e a mãe, Raimunda de Jesus, 58, viajaram da cidade de Pedreiras, no Maranhão, distante mais de 500 km de Canindé, para completar uma promessa feita a São Francisco.

Cláudia conta que há mais de 10 anos prometeu cortar o cabelo apenas no dia do santo para se livrar de dores de cabeça constantes. A romeira fez o corte com outras dezenas de fiéis que faziam fila na Casa de Milagres para deixar os fios como prova do cumprimento do prometido.

Os cinco dias de viagem de ônibus de Castanhal, no Pará, até o sertão cearense não impediram Júlia Ventura, 88, e a filha, Maria Isabel Ventura, 63, de prestar as homenagens e pedir bênçãos. Isabel conta que as duas compraram fitas de cetim e tiraram as medidas dos parentes enfermos. As fitas do tamanho da parte do corpo adoentada foram amarradas na imagem de São Francisco como súplica pela cura.

“Eu trouxe pelos meus filhos e por mim mesmo, pela minha saúde, pela prosperidade, para conseguir uma casa própria para eu morar. É um sonho, é nossa fé. Agora é esperar pelo milagre”, diz Isabel.

Levar representações de partes do corpo que receberam bênçãos do santo é uma das tradições mais fortes. Alguns levam réplicas de madeira, outros preferem expor uma foto de quem foi agraciado. Antônia Fabiana dos Santos, 39, levou uma imagem dela e da filha, de 18 anos, para compor o mural da Casa dos Milagres.

“Quando ela tinha nove meses e estava bastante doentinha, eu falei com São Francisco. Eu estava sem fé, não estava lembrando de Deus, só queria ver minha filha boa”, conta a costureira de Chapadinha, no Maranhão. “Agora ela é uma pessoa saudável, não sente mais nada e graças a Deus nós estamos aqui. Esse é o último ano da promessa.”

As turbulências de viver uma gravidez durante a pandemia de Covid-19 também levaram Raquel Rocha, 40, a fazer uma promessa pela saúde dela e da filha. Até os cinco anos de Eva Maria, 3, as duas devem participar dos dez dias de festa usando marrom, como a cor da túnica de São Francisco.

“Eu estava com muito medo de morrer, passei a gravidez toda com depressão. O pós-parto também foi bem complicado, e então eu fiz a promessa. Eu me sinto realizada e agradeço a Deus e a São Francisco por mais um ano estar aqui com ela, porque a gente passou por muitos momentos difíceis”, relata.

A festa deste ano marcou o centenário da presença da Ordem dos Frade Menores (OFM) — uma ordem religiosa fundada por São Francisco — na cidade. A celebração de 2023 trouxe como tema principal “São Francisco nos ensina a evangelizar em fraternidade”. De acordo com o frei Gilmar Nascimento, o assunto perpassou todas as atividades.

“Num mundo onde se prega o individualismo, Francisco prega a comunidade, a fraternidade, daí a importância de nós celebrarmos essa temática”, explica. Para ele, o santo continua sendo uma inspiração devido ao modo simples como viveu, o que aproxima pessoas mais pobres de sua figura. “Ele encontrou a felicidade na providência divina”, diz.

Entorno da estátua de São Francisco recebe fiéis ainda em obra

Em obras desde julho de 2022, o entorno da estátua de São Francisco em Canindé recebeu os fiéis para a festa do santo ainda sem a estrutura prometida. O projeto prevê a requalificação das vias de acesso à estátua, estacionamento para veículos de grande porte, rampas, paisagismo, bloco comercial, um centro cultural e uma capela.

De responsabilidade da Superintendência de Obras Públicas, a obra foi orçada em R$ 11 milhões. Durante as celebrações de 2023, os devotos e os comerciantes ainda não puderam contar com a estrutura completa.

Francisco Pereira Oliveira, 43, que comercializa artigos religiosos no local há 12 anos, foi informado que os boxes para os comerciantes seriam entregues até o fim do ano. “Estamos esperando para ver.” Para ele, a obra representará melhorias para quem vive do turismo religioso na cidade.

Neste ano, os comerciantes ainda precisaram se instalar em estruturas improvisadas. O calor é uma das reclamações de Francisco, já que o estande onde trabalha não tem proteção adequada contra o sol.

O POVO entrou em contato com a SOP para obter informações sobre a previsão de finalização da obra, o que já foi feito e o que ainda está em curso nas intervenções. O órgão não respondeu até o fechamento desta edição.