Seminário Estadual em alusão ao Dia do Combate ao Trabalho Escravo discute o combate ao trabalho escravo contemporâneo

Evento reacende o debate sobre a precarização do trabalho e relembra os esforços voltados ao combate dessa prática

O Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE), a Secretaria dos Direitos Humanos do Estado do Ceará (Sedih) e a Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae-Ce) realizaram, nesta segunda-feira, 27, o Seminário Estadual "Trabalho Escravo Contemporâneo: Desafios e Perspectivas para a sua Erradicação nos 30 Anos do Grupo Móvel".

O encontrou discutiu as formas atuais de escravidão no Brasil, apresentando desafios e estratégias para combatê-lo. De acordo com Christiane Nogueira, procuradora do Trabalho e vice-presidente da Coetrae, o evento foi criado em alusão ao Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, comemorado no dia 28 de janeiro.

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A data marca o assassinato de três auditores fiscais e um motorista, que investigavam denúncias de trabalho análogo à escravidão, na zona rural de Unaí, cidade no noroeste de Minas Gerais (MG), em 28 de janeiro de 2004. O crime ficou conhecido internacionalmente como Chacina de Unaí.

De acordo com a procuradora, as denúncias de trabalho escravo continuam ocorrendo em todo o Brasil, não só na zona rural, como também na zona urbana; especialmente em atividades como agricultura, construção civil e costura.

“É preciso a sociedade se conscientizar para denunciar cada vez mais e os órgãos do Estado poderem combater esse problema, que é diferente do trabalho escravo colonial. O trabalho escravo contemporâneo vai trazer, especialmente elementos das condições degradantes de trabalho, mas que precisa ser visibilizado. Então, é muito importante a participação de todos”, destaca.

A programação celebra também os 30 anos de atuação do Grupo Móvel de Fiscalização do Trabalho Escravo (GEFM), reconhecido como uma boa prática no enfrentamento ao trabalho escravo e se tornou referência pela articulação interestadual para denunciar práticas de trabalho escravo em todo o País.

A secretária dos Direitos Humanos no Estado do Ceará, Dra. Socorro França, ressaltou que, desde 1988, o Brasil conta com várias normas de inclusão, o que tem contribuído para o fortalecimento de políticas públicas que fomentem o respeito aos direitos humanos no Estado e no País. A titular da pasta destacou a seriedade do trabalho realizado pela Coetrae e enfatizou a importância do Seminário para reavivar o debate sobre o tema.

“É necessário dizer que o trabalho escravo ainda existe. O trabalho escravo está aí, vigente. E é preciso alertar (...). Nós temos aí a fiscalização do Ministério Público do Trabalho que nos demanda para que a gente possa acompanhar, tanto na área da Assistência Social, como também da Psicologia, as pessoas que ficaram traumatizadas pelo trabalho escravo”, pontua.

Precarização do trabalho contemporâneo é tema de reflexão durante Seminário Estadual

Conforme dados do Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, entre 1995 e 2023, 63.516 trabalhadores foram encontrados em situação de trabalho análogo à escravidão no País. Ao todo, 719 dessas atuações foram registradas no Ceará. O município com o maior número de autos de infração registrados foi Fortaleza, com 312 notificações; seguido de Granja, com 141.

O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Universidade Federal do Ceará (UFC), Rafael dos Santos, pontuou a importância do Seminário Estadual frente ao cenário que classificou como “ameaçador da função trabalho”. De acordo com o presidente é preciso discutir, rediscutir e tematizar esse tema, uma vez que “hoje a gente sabe que a escravidão pode estar, inclusive, dentro das próprias leis. Pode ser oficializada”.

Segundo Rafael, ao discutir sobre o trabalho escravo na contemporaneidade, é preciso entender que não se fala, necessariamente, de uma pessoa acorrentada ou encarcerada dentro de uma senzala; mas sim sobre a modernização desse tipo de escravidão; é preciso entender como ela se apresenta nos dias de hoje.

“É a própria definição de trabalho que está sendo ameaçada a partir dessas novas formas de precarização: terceirização e se fala agora até em quarteirização do trabalho. Então, guardar essa função para a sociedade, a função trabalho, é fundamental para a gente pensar a nova forma de organização da vida social (...)”, alerta o presidente.

A precarização das formas de trabalho contemporânea também foi discutida pelo deputado estadual Renato Roseno (Psol). O parlamentar ressaltou a importância de enfrentar o crime de Escravidão Moderna ou Trabalho Análogo à Escravidão, tipificado no artigo 149 Código Penal, por meio da prevenção, responsibilização e reparação.

“O trabalho escravo é um irmão da precarização do trabalho. Veja, ao contrário do que o senso comum pensa, que o trabalho escravo ficou no passado, ele é contemporâneo. As plataformas de internet, a precarização do trabalho, as reformas trabalhistas que destituem o trabalho de proteção social facilitam as formas análogas ao trabalho escravo”, atenta.

Para o deputado, o trabalho de plataforma, dentre outras coisas, simboliza as formas contemporâneas de precarização. “Além disso, o Brasil passa por um processo de reprimarização, com o avanço das formas de plantation, com as formas do agronegócio, novas fronteiras de reprimarização facilitam processos de formas análogas ao trabalho escravo”.

Renato Roseno lembrou o caso de 11 cearenses que foram resgatados em condições de trabalho análogas à escravidão em um canteiro de obras no município de Serranópolis, em Goiás, em setembro de 2024.

“O que é que esse fenômeno social nos diz? Que esse jovens não encontraram aqui condições dignas de trabalho, eles queriam mobilidade social, eles queriam inserção de vida digna. E eles vão bater no Centro-Oeste a partir de recrutamentos que são feitos de maneira criminosa”, pontua.

Avanço de políticas públicas para o combate ao trabalho escravo é destaque em seminário

Confira as principais medidas de combate ao trabalho escravo nos últimos 30 anos:

  • 1995 - Brasil reconhece oficialmente a existência do trabalho escravo no país. Criação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel, que realiza operações para o combate ao trabalho escravo
  • 1997 - Criação da Campanha Nacional da Comissão Pastoral da Terra de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo
  • 2001 - Criação da ONG Repórter Brasil, organização dedicada a denunciar e combater o trabalho escravo e outras formas de violações e direitos humanos
  • 2002 - Criação do 1º Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo
  • 2003 - Criação da Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae). Reformulação do artigo 149, que atualiza as definições de trabalho escravo. Criação do Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à escravidão, conhecido como Lista Suja
  • 2004 - Chacina de Unaí. Criação do “Escravo, nem Pensar!”, primeiro programa nacional de prevenção ao trabalho escravo
  • 2005 - Criação do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo
  • 2006 - Criação do Formulário de denúncia de Casos de Trabalho Escravo e Superexploração
  • 2008 - Criação do 2º Plano Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo
  • 2014 - PEC do Trabalho Escravo. Emenda Constitucional 81 prevê o confisco de propriedades de quem, comprovadamente, pratica trabalho escravo
  • 2017 - Suspensão da Portaria que afrouxava as regras de combate ao trabalho escravo

 

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