Custódio Almeida: "O interior agora participa verdadeiramente da história do Brasil"

Custódio Almeida, reitor da UFC, destaca os resultados do processo de interiorização e celebra a construção de uma universidade pública mais acessível, plural e democrática

16:51 | Set. 28, 2024

Por: Daniel Oiticica
CUSTÓDIO Almeida, reitor da UFC, na cerimônia de recepção da Caravana (foto: Samuel Setubal)

Como medir a importância de uma instituição como a Universidade Federal do Ceará (UFC) para o desenvolvimento do estado? A régua mais justa é a do professor Custódio Almeida. Doutor e licenciado em Filosofia, mestre em Sociologia e graduado em Computação, ele participou diretamente, desde o início, como pró-reitor de Graduação (2007-2015) e como vice-reitor (2015-2019), da expansão da UFC pelo interior do Ceará. Hoje, como reitor, lidera a consolidação deste processo.

Em muitos dos encontros da Caravana com Custódio ficou evidente o orgulho com que usa sua régua para medir o que está à vista de todos. "O processo de interiorização do ensino superior é uma das decisões de política pública mais acertadas na área de educação do Brasil nos últimos anos", afirma categórico, com o sentimento de que a continuação desse processo é puro avanço sem retrocessos.

O POVO - A Caravana testemunhou os resultados da interiorização da UFC visitando seus cinco campi. Que balanço o senhor faz desse processo?

Custódio Almeida - Chegar no interior é um ato de coragem e de muita determinação. É como começar do zero. São muitos dilemas. Vou abrir o curso de Engenharia de Minas, em Crateús. Como faço para trazer o professor doutor para a cidade? Passamos por isso em várias áreas. Mas tínhamos muita clareza de que o potencial do interior do Brasil e do Ceará corresponderia perfeitamente a esse projeto. E é o que estamos colhendo hoje. As avaliações dos cursos de graduação em todos os nossos campi são excelentes. Nossa sensação é de dever cumprido e já começamos a ver um movimento inverso.

O POVO - Em que sentido?

Custódio Almeida - No Brasil, historicamente, a migração é sempre do interior para a capital. Hoje, estamos vendo o inverso. Por exemplo, outro dia soube de professores de Goiânia que querem ir para Crateús. Filhos da terra que estavam longe, porque foram se formar nas capitais, estão voltando agora para serem professores e técnicos. Estudantes das capitais, que moram nelas, indo fazer os cursos no interior, Psicologia, Odontologia, Medicina.

O POVO - E quais são as consequências desse processo?

Custódio Almeida - As cidades começam a se tornar universitárias. E então outras instituições de ensino superior chegam porque veem que a coisa está crescendo e que empresas estão sendo atraídas. O campus da universidade, que geralmente fica longe do grande centro, começa a ser abraçado. A cidade vai crescendo em sua direção. Esse processo de interiorização do ensino superior é uma das decisões de política pública mais acertadas na área de educação do Brasil nos últimos anos. Traz desenvolvimento, resgata áreas do conhecimento para o interior, com um processo migratório contínuo, que antes ficava esvaziado. O interior agora não é só o interior agrário, é o interior que tem tudo. É o interior que participa verdadeiramente da história do Brasil.

O POVO - Como a UFC tem se articulado para promover um ambiente de diversidade e inclusão?

Custódio Almeida - Aderimos àquilo que inicialmente era uma polêmica, que foi a lei de cotas. Se a gente quer falar de pluralidade e diversidade, a lei de cotas é um marco ineliminável que explica tudo. A universidade era de elite, até antes da lei de cotas. E passou a ser uma universidade que recebe estudantes da escola pública, pretos, pardos e indígenas. Isso é um desafio, porque pluralidade significa complexidade na convivência. Encontramos nos campi todos os perfis de raça, de etnias, de classe social, de partido político, de opção religiosa. Por isso, a universidade é um lugar onde o respeito ao outro e à diferença é algo fundamental. A universidade é o maior de todos os laboratórios de Humanidades. Porque se queremos experimentar a humanidade, temos que olhar para o outro, que não é um espelho do que eu sou, mas que me desafia, justamente, por ser outro, por ser diferente. Na universidade, temos a possibilidade de nos tornar mais humanos. E isso significa mais tolerância e mais diálogo.

Colaborou Nicolly D'Lorrainne/Especial para O POVO