Cariri: facção controlava disciplina de criminosos em grupo de WhatsApp, aponta MPCE

Investigação utilizou a interceptação telefônica e quebra de dados telemáticos de integrantes de grupo de WhatsApp do PCC

21:20 | Ago. 12, 2024

Por: Jéssika Sisnando
Dados extraídos das conversas do grupo de WhatsApp do PCC são alvo de denúncia do MPCE (foto: reprodução/MPCE )

Um grupo de WhatsApp da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) possuía, além de criminosos de São Paulo, pessoas de 11 municípios cearenses, responsáveis por observar questões de disciplina da organização criminosa, principalmente na região do Cariri. As informações estão em uma denúncia do Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE). O documento, com 95 páginas, detalha a participação de cada integrante.

Conforme o documento, entre os participantes do grupo de WhatsApp estavam pessoas residentes nos municípios cearenses de Missão Velha, Tauá, Boa Viagem, Acopiara, Crato, Mombaça, Juazeiro do Norte, Independência, Milagres, Aurora e Fortaleza.

A investigação teve início em 2023 com a apreensão do aparelho celular de João Felipe Bezerra Martins, alvo de um mandado de busca e apreensão. No aparelho foi encontrado um grupo de WhatsApp do PCC com atuação em Juazeiro do Norte. As investigações também apontaram envolvimento de Breno Dantas Soares, conhecido como "Capetinha". O MPCE pediu pela prisão de ambos. 

Além dos dois, outras 26 pessoas faziam parte do grupo, que era denominado Coluna Regional Sul. As conversas faziam referências aos integrantes do grupo criminoso na região do Cariri, com assuntos relacionados ao estatuto do PCC, livro de "caixinha", que é a contribuição mensal, hierarquias denominadas STF (Sintonia Final) e STG (Sintonia Geral). 

O MPCE aponta na denúncia que é evidente a integração dos participantes na facção, uma vez que se apresentavam pelo vulgo e a respectiva "quebrada de atuação" (área de atuação), além de hierarquia de disciplina. Diante da situação foi instaurado um inquérito para apurar a instalação do PCC no Cariri, com o cometimento de crimes de organização criminosa, tráfico de narcóticos, crimes do estatuto do desarmamento e homicídios. 

Investigação atuou com interceptação telefônica e quebra de dados telemáticos 

A investigação pleiteou e obteve ordem judicial para utilizar a interceptação telefônica e a quebra dos dados telemáticos relativos aos participantes do grupo "Coluna Regional Sul", o que possibilitou a identificação dos integrantes com atuação na região Sul do Ceará. "Foi possível verificar a existência de uma facção criminosa, com atuação na região do Cariri e direcionada à prática de crimes de tráfico de entorpecentes, posse/porte de armas e munições e homicídios.

Conforme a denúncia do MPCE, o colegiado de juízes da Vara de Delitos e Organizações Criminosas deferiu as medidas cautelares (mandados de busca e apreensão) que foram cumpridas no dia 21 de março de 2023.  Durante os mandados houve prisão em flagrante referente à posse de droga.

Entre os presos em flagrante está Diego Vieira Ferreira, conhecido como "Verdinho", que durante o cumprimento dos mandados, foi encontrado com 144 gramas de maconha e 20 gramas de cocaína fracionadas em 15 porções. Além disso, foram apreendidos apetrechos usados no tráfico de drogas.

Outro dos investigados foi preso em flagrante durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão em razão da presença de 105 gramas de maconha, fracionadas em um tablete e cinco porções, o que resultou na prisão por tráfico.

Integrantes do PCC no Ceará estavam em contato direto com "liderança nacional" 

De acordo com o documento do MPCE, a investigação apontou pessoas responsáveis pela "disciplina" em bairros como Socorro, em Juazeiro do Norte, que também mantinham contato, no mesmo grupo, com  participantes de São Paulo. Os denunciados foram o casal Laís Arieli e Amauri Catarino Assunção. Amauri possui processo em trâmite em São Paulo após ser preso durante uma ocorrência relacionada a "tribunal do crime".

A denúncia descreve que o "tribunal do crime" é uma espécie de julgamento feito pelos criminosos integrantes do PCC, que analisam a situação e determinam uma "pena" para os acusados de crimes apontados contra a organização criminosa. Um sistema paralelo de julgamento e punições para quem prejudique os negócios. Entre as práticas estão presentes sessões de tortura de pessoas amarradas e amordaçadas em cativeiros e cárcere privado até que seja dado um "veredito". Integrantes da facção atuam como "jurados" e podem decidir se a vítima deve ser morta. O tribunal do crime ocorre a partir de ações como delação de ações de criminosos, conversas com terceiros sobre a facção e infrações leves como urinar na rua.

Laís e Amauri aparecem na investigação como uma "liderança nacional", pois além do grupo do Cariri, também participam de grupos do Amazonas, Rio Grande do Norte e Bahia. Já entre os participantes do Ceará foi constatada a presença de pessoas condenadas pela Justiça e já apontadas por integrar o PCC, outros com antecedentes por tráfico de drogas e roubo.