Ceará registra pelo menos três mortes por linha com cerol em um ano

Vítimas eram motociclistas com idades entre 22 e 37 anos e foram atingidas pelo material em rodovias. Fabricação, comercialização e uso do cerol são proibidos desde 2020

Pelo menos três mortes ocasionadas por uso da linha com cerol foram registradas em quase um ano no Ceará, sendo dois casos em julho e agosto do ano passado e um registro neste mês. As vítimas eram motociclistas e morreram após serem atingidas pelo material cortante usado para empinar pipas. O levantamento é do O POVO e foi consolidado nessa sexta-feira, 19.

O caso mais recente aconteceu na tarde do último dia 12, quando um motociclista de 22 anos morreu após ser atingido no pescoço pelo material na BR-116, no bairro Jardim das Oliveiras, em Fortaleza. O condutor chegou a estacionar o veículo e sentar no acostamento da via após ser atingido, mas não resistiu ao ferimento e morreu no local.

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A Secretaria de Segurança Público do Ceará (SSPDS) informou ao O POVO, no dia 16, que a Polícia Civil do Ceará (PCCE) segue com as investigações sobre o caso. Ainda não foi informado se os responsáveis pela linha foram identificados, presos ou apreendidos nem se houve apreensão do material que provou a morte do motociclista.

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As outras duas ocorrências com uso do cerol aconteceram em julho e agosto de 2023. O primeiro caso foi registrado também na BR-116, no bairro Messejana, em Fortaleza. Um motociclista de 37 anos foi atingido por uma linha de pipa com cerol na via. Ele chegou a ser socorrido pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), mas veio a óbito dentro da ambulância.

Em menos de um mês, o segundo caso foi registrado. Dessa vez, um homem de 26 anos transitava na BR-020, no município de Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), quando foi ferido no pescoço por uma linha de pipa com cerol. Ele foi encontrado sem vida por populares à margem da rodovia.

Cerol e linha chilena são proibidos por lei no Ceará

A atividade tradicional de soltar ou empinar pipa ou raia é registrada, anualmente, no início das férias escolares de julho. No entanto, o uso do cerol é proibido pela legislação estadual. A ei n.º 17.226, sancionada em 2020 pelo então governador Camilo Santana, proíbe o uso, a fabricação ou a comercialização de cerol, de linha chilena e de qualquer outro tipo de material cortante nas linhas de pipas ou artefatos semelhantes.

Conforme o presidente da Comissão de Trânsito, Tráfego e Mobilidade Urbana da Ordem dos Advogados Brasil no Ceará (OAB/CE), Daniel Siebra, o descumprimento às determinações da lei implica apenas na apreensão do material. Em casos mais graves, quando o uso do material leve à morte de uma pessoa, por exemplo, o responsável poderá responder pelo artigo 132 do Código Penal Brasileiro — que dispõe sobre "expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente".

“Esse artigo pode ser enquadrado para quem está empinando a pipa com cerol e também para quem está fabricando [linha com cerol]. A pena é de três meses a um ano, se o fato não constituir crime mais grave”, informa Siebra. Caso o delegado ou promotor responsável entenda que houve característica no crime que agrave a pena, o caso pode ser definido como homicídio, cuja pena mínima é de seis anos de reclusão

Segundo a legislação estadual, o cerol é a mistura de pó de vidro (ou material similar) moído ou triturado com a adição de cola (ou de outra substância glutinosa). Já a linha chilena, também proibida, é toda linha, fio ou barbante cobertos com óxido de alumínio e silício, quartzo moído ou qualquer substância de efeito cortante.

No último domingo, 14, uma quantidade de linha com cerol, raias com cerol e linha chilena foi apreendida pela Polícia Militar do Ceará (PMCE), no município de Itaitinga, na RMF. Na ocasião, um homem de 37 anos foi autuado com base no artigo 132 do Código Penal.

O POVO solicitou à Polícia Militar do Ceará e à Secretaria de Segurança Pública do Ceará (SSPDS), na última terça-feira, 16, o número de mortes ocasionadas pelo uso da linha com cerol no Estado. Também foi questionado o total de apreensões de materiais com linha de cerol e linha chilena, como pipas, no ano passado, neste ano e, especificamente, neste mês de julho.

Além disso, foi solicitado um levantamento de quantas pessoas foram apreendidas por fabricarem, comercializarem os materiais e por soltarem pipa/raia com esse tipo de material neste ano no Estado. A SSPDS informou, nessa quinta-feira, 18, que não mantém cadastros específicos desse tipo de ocorrência no sistema e que, diante disso, não tem como gerar os dados solicitados.

Os dados também foram solicitados à Polícia Rodoviária Federal (PRF). Até o fechamento desta matéria, a PM e a PRF não responderam com as informações.

O Instituto Doutor José Frota (IJF), em Fortaleza, também foi procurado para saber o número de pessoas que vieram a óbito em virtude de acidentes provocados com o material. A unidade de saúde informou que não tem dados desse tipo de ocorrência.

Mais de 700 antenas corta-pipas foram distribuídas em Fortaleza desde 2021

Uma das ações para alertar sobre o perigo do uso da linha com cerol, principalmente para proteção no trânsito e durante as férias escolares, é a instalação de antenas corta-pipas em motocicletas. A Autarquia Municipal de Trânsito e Cidadania (AMC) afirma que, desde 2021, mais de 700 antenas foram distribuídas aos condutores em Fortaleza.

“Embora não seja obrigatória, a antena corta-pipa impede que as linhas chilenas e o cerol atinjam o pescoço, tórax e braços dos motociclistas e passageiros, já que as motos não possuem nenhum tipo de proteção frontal”, informa a AMC.

O gerente de educação para o trânsito da AMC, André Luís Barcelos, explica que “quando a linha bate na antena, ela bate e sobe até a ponta em uma espécie de guilhotina e é cortada”. A antena corta-pipa é obrigatória para motociclistas profissionais, como mototaxista, desde 2009 por meio da lei n.º 9.580.

No entanto, para os demais usuários, é um item essencial de trânsito, principalmente, neste período do ano. O valor do equipamento varia de R$ 12 a R$ 50.

Atualmente, a AMC não distribui as antenas em virtude das eleições municipais — a distribuição pode ser configurada como brinde, o que é proibido em período eleitoral. As ações da pasta estão concentradas na educação sobre o tema no trânsito. “Abordamos nas vias de grande movimentação e nos pontos de espera dos motociclistas. Indicamos que o condutor use o equipamento para preservar a vida dele”, informa.

Barcelos orienta que os condutores observem as regiões em que estão trafegando e, em caso da presença de raias, diminuam a velocidade e busquem uma área segura.

Bombeiros alertam para cuidados em acidentes com cerol

> Não tocar no cerol ou na linha chilena ao ser atingido, pois pode ocasionar outros cortes

> Ao tentar tirar o material do corpo, utilizar luva ou pano para garantir que não haja contato direto com o material

> Manter a calma diante dos acidentes para entender a situação do acidente

> Lavar o local com água ou soro e estancar o ferimento

> Em casos mais graves, como em acidentes atingindo o pescoço, buscar ajudar do Samu e dos Bombeiros pelo 190

Fonte: Romário Fernandes, capitão do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará (CBMCE)

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