Secretário da Segurança avalia criação de metas para redução de homicídios

Empossado, Roberto Sá conversou com O POVO sobre as diretrizes que nortearão seu trabalho. Ele afirmou que haverá uma maior presença policial nas áreas mais necessitadas

Logo após a cerimônia de posse — realizada na manhã desta segunda-feira, 3, no Centro Integrado de Segurança Pública (Cisp) — o novo secretário da Segurança Pública e Defesa Social Roberto Sá conversou com O POVO sobre as principais diretrizes do seu trabalho.

Ele afirmou que os homicídios precisam ser reduzidos “ontem”, mas disse ainda avaliar se metas específicas serão estabelecidas. Na tarde desta segunda, uma reunião com os comandantes das forças de segurança foi realizada para identificar a dinâmica da criminalidade no Estado.

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Sá também afirmou ter determinado um levantamento de pessoas com mandados de prisão por homicídio em aberto e prometeu identificar “implacavelmente” autores de homicídios. 

O POVO: Secretário, o que foi que o governador Elmano pediu para o senhor quando fez o convite? Qual foi a demanda que ele fez?

Roberto Sá: Esse convite, com essas argumentações, para mim, foram, na verdade, uma convocação para me somar às forças de segurança em busca de uma maior proteção para o povo do Ceará. O governador está muito preocupado com o aumento dos CVLIs (Crimes Violentos Letais Intencionais, índice que soma homicídios dolosos, feminicídios, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte) e com a sensação de insegurança.

Então, esse convite foi aceito no sentido, de somando às forças de segurança do Ceará, estabelecer estratégias que consigam reverter essa tendência de crescimento de CVLI e também de CVPs (Crimes Violentos contra o Patrimônio, ou seja, roubos), mas, paralelamente, atuando sobre outra vertente da Segurança Pública que é a percepção, que é o dado subjetivo. Embora o número de CVLIs esteja elevado, em determinadas regiões em que o CVLI não está alto, as pessoas não estão com essa percepção.

A violência urbana no Brasil — já acompanho há 40 anos — tem sazonalidades, tem movimentos cíclicos, com algumas melhoras, mas ela, em regra, é muito elevada. Nós (Brasil) somos 2,7% da população mundial, nós contribuímos com 20% dos homicídios dolosos.

Nós temos um número muito elevado, um número vergonhoso. Então, como nação, como Estado, como poder público, nós temos que sentar e estabelecer estratégias nesse sentido. A presença, hoje, maciça na posse me empolgou muito, com a percepção de que eu vou ter ao lado Poder Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Poder Legislativo, as prefeituras, o Governo Federal, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Penal, Exército, Marinha, Aeronáutica, Abin (Agência Brasileira de Inteligência). Então, todos juntos, nós vamos estabelecer estratégias e vamos mudar esse cenário.

OP: Essa presença hoje na posse foi muito destacada, emblemática. Mas é um momento de cobrança já com essa presença.

Roberto Sá: Sim, sim, mas isso eu já percebi na primeira conversa com o governador. Eu senti que havia essa urgência e o governador representa os mais de 9 milhões de cearenses, né? Na nossa conversa, eu percebi que há essa urgência de ações, seja no campo da polícia ostensiva, seja no campo da Perícia Forense, da Polícia Judiciária do aperfeiçoamento dos policiais.

OP: A política de meta de redução de homicídios é uma política que o senhor aplicou nos estados em que o senhor conduziu a segurança. O que é que foi falado sobre isso com o governador e o que vai ser adotado em relação a isso?

Roberto Sá: Independentemente da gente estabelecer uma meta em áreas geográficas, uma coisa já é meta: reduzir o que a gente tem. Agora, estabelecer um número percentual, isso a gente ainda não sentou para conversar. A minha experiência, onde eu consegui implantar, envolveu uma série de outras medidas que requer metodologia, planejamento e implantação.

Então, eu tenho que verificar se a tecnologia permite a transmissão do dado em tempo real, se eu tenho análise em tempo real, se eu tenho áreas geográficas coincidindo para cobrar de interlocutores das instituições locais, para poder fazer reuniões de nível — o nível operacional, nível tático nível estratégico, o nível governamental…

Então, por isso, eu vou estudar com a minha equipe para verificar se a gente cria ou não alguma metodologia dessa, estabelecimento de metas, e depois algum tipo de reconhecimento e remuneração.

OP: E o que é que vai ser objetivamente feito para isso?

Roberto Sá: Isso vai acontecer com o passar do tempo, mas essa mudança de postura, no sentido de, principalmente, nesse caso específico da presença em área onde o crime está acontecendo, a polícia estará presente.

OP: Esse mapeamento, o senhor já recebeu? O senhor pode indicar, sem estigmatizar, quais são essas áreas?

Roberto Sá: Já recebi. Eu prefiro não falar nesse primeiro momento. Vocês sabem onde estão acontecendo, há uma transparência do governo nesses números muito grande, todo mundo sabe. Agora, logo após a nossa reunião, eu vou receber (durante a tarde desta segunda-feira, 3) os dirigentes das vinculadas (Polícia Civil, PM, Pefoce, Corpo de Bombeiros, Academia Estadual de Segurança Pública) para que a Supesp (Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública) me apresente não só o dado, onde está acontecendo (o crime): eu pedi para me apresentar o modus operandi, georreferenciado no tempo e no espaço onde está acontecendo, quando aconteceu.

Porque, aí, com a experiência anterior, eu vou conversar com as agências exatamente o seguinte: não adianta estar no local se não foi no horário que mais está acontecendo. Não adianta estar no horário que está acontecendo, se você não estiver bem localizado. Então, qual o recurso humano que nós estamos colocando para atuar ali? É o policiamento ordinário, extraordinário complementar, com hora extra, é o Raio (Comando de Policiamento de Rondas de Ações Intensivas e Ostensivas), é o (Batalhão de Policiamento de) Choque, é o Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais)? Quem é que está disponível para a gente massificar essa presença, fazer uma operação de saturação?

Porque, enquanto a gente investiga, e a gente tem que respeitar o tempo da investigação — o delegado tem que representar, indiciar, representar por busca e apreensão, representar pela prisão, há manifestação do Ministério Público… Enquanto isso, a PM tem que estar presente, mas, quando nós tivermos isso na mão, aí as duas vão atuar para efetuar a prisão.

Já determinei o levantamento também de mandados de prisão em aberto de CVLIs. A história, nas experiências anteriores, mostra que há muitos matadores já identificados, indiciados, denunciados e com o decreto de prisão em aberto, mas que estão homiziados, escondidos. Nós vamos atrás deles, implacavelmente, com todas as forças.

OP: Quando o governador Camilo iniciou o seu mandato, havia no Ceará três facções. Hoje, com o governo Elmano, são cinco. O que pode ser feito para reduzir esse contingente?

Roberto Sá: Aí é inteligência, inteligência, inteligência e investigação. Porque, enquanto nós estamos nas ruas com a polícia ostensiva — nos lugares onde os crimes estão acontecendo, tentando alcançar a sensação de segurança e fazendo a prevenção para não acontecer — a nossa área de investigação vai estar fazendo um trabalho muito importante, ouvindo as inteligências de todas as agências — Abin, inteligência de Forças Armadas, PF, PRF, polícias de outros estados, que as nossas relações são muito boas…

Inteligência é o dado com qualidade e com velocidade. Quem tem informação boa que não circula, ela deixou de ser boa. Então, também por experiência, já enfrentei, em alguns momentos, em alguns lugares, às vezes, a resistência de passar o dado, pela vontade de querer fazer a prisão. E eu consegui convencer as agências que, a prisão não importa, quem vai fazer, o importante é o bandido preso.

Se aquela agência tem a informação, mas não tem a oportunidade de fazer a prisão imediata, passa a informação para quem tem e, nesse aspecto, a Polícia Militar é muito capilarizada, ela tem a oportunidade. Então, é canalizar a informação, a inteligência para quem está no terreno poder fazer essa busca, fazer essa abordagem, fazer essa ação mais repressiva.

OP: O senhor pretende fazer trocas de comandos e postos nas polícias Civil, Militar e Corpo de Bombeiros? Quanto tempo o senhor vai se dar para avaliar se mantém ou se troca?

Roberto Sá: Eu não vou estabelecer prazo porque eu vou determinar missões e, nessas missões, eu vou observar o comportamento, como a tropa está reagindo a essa cadeia hierárquica. O exemplo, a postura, o planejamento, a cobrança, a presença… Tudo isso vai ser observado. Não tem prazo para isso, mas assim tem a missão e a observação

OP: O que foi demandado para o senhor em relação ao ano eleitoral, que é um ano difícil de ser conduzido em qualquer lugar, em qualquer situação, nessa pasta? Agora muito mais por que está se tendo o crime inserido no ambiente eleitoral.

Roberto Sá: Nada demandado de forma especial. A preocupação do governador é a segurança da população. Sabemos todos que, em anos eleitorais, essas coisas se acirram um pouco, mas isso não é uma peculiaridade aqui do Ceará, por onde eu passei — seja pela Secretaria de Segurança, seja pela Polícia Federal — realmente, as discussões ficam mais acaloradas. Eu é que já tenho essa experiência de saber que, nesses períodos, a gente tem que estar mais presente ainda.

OP: O que o senhor vai ajustar das suas duas experiências no Rio de Janeiro e no Espírito Santo, trazendo ou evitando aqui?

Roberto Sá: Não teria o que nomear. As convicções continuam as mesmas. Lógico que, cada vez que a gente vai passando, a gente vai aprendendo. No Rio, eu tive, por exemplo, uma experiência em que o conceito de ocupação com polícia comunitária começa na minha subsecretaria. Depois ela se expande, vira uma política, um programa, que eram as UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora).

E a gente acabou percebendo que, lamentavelmente, só a Polícia entrou e só a Polícia ficou. Então, esse tipo de experiência, de colocar a presença policial fixa com um projeto de inclusão social, precisa ser muito cauteloso, porque, se não, só a polícia fica e o eixo de proteção social não entra.

É importante que as coisas caminhem juntas e que a polícia esteja presente, mas ela não pode estar estática. Ela tem que estar dinâmica porque o crime também é dinâmico. Embora a gente tenha unidades fixas em algumas regiões, elas, em algum momento, vão permanecer e, em outros momentos, vão ter que se deslocar, porque a dinâmica do crime ocorre e nós temos que acompanhar essa dinâmica.

OP: Eu gostaria de um comentário do senhor sobre o projeto que acaba com a saidinha de presídios.

Roberto Sá:  Eu vinha estudando, lecionando e apoiando estudos estratégicos no sentido de gestão estratégica de segurança e políticas públicas de segurança. E, vendo as políticas públicas, ela vem ao encontro de um dos eixos que eu sempre digo que são ainda fragilidades do modelo brasileiro de enfrentamento à violência — e aí falam em todos os aspectos, não só de força de segurança, mas um modelo de enfrentamento da sociedade e do do núcleo político. Uma delas é o poder bélico dos criminosos. A outra é a impunidade. Tem ainda o financiamento da segurança pública e ausência do Estado lato sensu.

No campo da impunidade, a gente percebe que, determinados crimes praticados com muita violência, eles requerem um tratamento diferenciado. E esse tratamento diferenciado é o que o Código Penal já dá, através da dosimetria da pena.

No entanto, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal — na minha visão, com respeito às opiniões contrárias — apostavam em uma política de reinserção social — que eu também aposto, eu acho que ela deve existir — presos com graus de violência (diferentes) de forma muito parecida.

E eu sempre defendi que, na dosimetria da aplicação da pena, deveria valer para a reinserção social. Ou seja, presos por crimes muito violentos deveriam ter um retorno para a sociedade com critérios diferentes de outros criminosos.

Então, o fim da saidinha, do jeito que ele foi adotado, ele vai ter que ser respeitado. Acho que facilita um pouco o trabalho das forças de segurança porque, infelizmente, muitos criminosos saíam e voltavam, mas, aqueles que não voltavam e acabavam delinquindo novamente, tiravam vidas de pessoas e a vida a gente não devolve.

Temos que ter como premissa máxima a preservação da vida. Isso não deve valer só para a Polícia, deve valer para os outros poderes: Judiciário, Legislativo, Executivo. Se alguém tira a vida de alguém, passa por todo o crivo do devido processo legal — atua o Ministério Pública, a defesa e o Poder Judiciário decreta uma prisão —, se, na hora da reclusão social, isso não foi considerado, a gente também está tratando pessoas com crimes desiguais de forma igual. E a gente precisa tratar desigualmente para ter uma verdadeira isonomia material.

OP: O senhor já está montado aqui ou o senhor vai ter que se adequar, precisar viajar e voltar?

Roberto Sá: Eu já tô direto. Eu vou precisar voltar lá para trazer até mais coisas. Vi numa primeira leva, para essa primeira empreitada. Mas não tenho nem prazo para. Até porque a minha família já sabe que quando eu entro de corpo e Alma… Infelizmente, eles sofreram muito com a minha ausência e, agora, não vai ser diferente. Mas me apoiam, o importante é isso.

OP: Esse dado de quase 1.500 mortes em cinco meses, é um número que lhe traz que sensação de responsabilidade?

Roberto Sá: Isso me traz a certeza de que o desafio é hercúleo, mas que, juntos, unidos e com a expertise e a força que as agências de segurança do Ceará têm, a gente vai conseguir reverter. O Estado tem que ser mais forte que o crime sempre e vai ser mais forte. (Colaborou: Lucas Barbosa)

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