Corais do litoral do Ceará sofrem processo de branqueamento em massa

O litoral do Ceará está em alerta de nível 4, quando existe o risco severo de mortalidade de múltiplas espécies de mais de 50% dos corais

Os corais do litoral do Ceará e de outros estados do Nordeste estão passando por um processo de branqueamento em massa, de acordo com dados da plataforma Coral Reef Watch, da agência estadunidense National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), que monitora o oceano desde 1985. A região do Ceará está em alerta de nível 4, quando existe o risco severo de mortalidade de múltiplas espécies de mais de 50% dos corais. A situação acontece por conta do aumento da temperatura do oceano.

De acordo com Marcelo Soares, professor do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC), a temperatura do oceano no Ceará costuma ficar entre 26 graus Celsius (°C) e 29 °C, a depender do período do ano, mas desde janeiro ela está a 30 °C.

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“O alerta nível 4 quer dizer que nós estamos entre 16 e 20 semanas com calor acima da média. Isso é um recorde histórico. Desde janeiro a temperatura está muito acima da média, então a gente está tendo um evento de branqueamento em massa. Não é só aqui [no Ceará], no Rio Grande do Norte, em Fernando de Noronha, etc”, explica o professor.

Veja o monitoramento de estresse térmico dos últimos 90 dias:

Veja o comparativo dos últimos 20 anos:

A razão do aquecimento, conforme Marcelo, são as emissões de gás carbônico (CO2). Em março de 2024, 425.38 Partes Por Milhão (PPM) de CO2 foram emitidos na atmosfera, segundo dados da NOAA. No mesmo período do ano passado, 420.99 ppm foram emitidos.

“Esse [de 425.38 PPM] é o maior recorde da história da Terra nos últimos 10 mil anos. Em 1955, há 70 anos atrás, nós estávamos em 305 [PPM]. O aquecimento global é muito claro. Se a gente não fizer nada, todo ano vai ter branqueamento em massa de corais e o ecossistema vai ser extinto em aproximadamente 40 anos”, alerta o pesquisador.

Quais os impactos do branqueamento?

O coral é a árvore do mar. Ele funciona como se fosse um engenheiro do ecossistema. "Eles são organismos bio-construtores, também conhecidos como eco-engenheiros. Pense em uma cidade. Você tem casas, prédios e estruturas que tornam possível a vida de outros organismos. [No oceano], os corais fazem possível a vida de peixes, lagostas, caranguejos, lulas, etc", explica Sérgio Rossi, também professor do Labomar.

Os corais também são capazes de imobilizar carbono e purificar as águas. “Eles fazem parte dos ciclos biogeoquímicos. Se os corais desaparecem, os ecossistemas desaparecem. Vai haver menos peixes, menos lagostas, etc. Os sistemas se simplificam”, pontua o professor.

O branqueamento, além disso, gera consequências socioeconômicas. Uma delas é na questão do turismo. As cores dos recifes de corais, muitas vezes, são um chamariz para visitações. A situação ainda compromete a segurança alimentar dos pescadores e cadeias econômicas baseadas na pesca.

Vale ressaltar que o branqueamento não necessariamente significa a morte dos corais. Eles podem se recuperar, mas existem ressalvas. "O último evento [de branqueamento em massa] foi em 2020 e agora, em 2024, a gente tá vendo um evento ainda maior", destaca Marcelo Soares.

"É como se fosse um mega incêndio debaixo d'água. Eles aconteciam uma vez a cada dez anos. Mas, a gente já tá vendo um segundo em cinco anos. Não há tempo para o coral, que é um organismo como a gente, se recuperar do estresse. Ele pode se recuperar? Pode, se a temperatura abaixar", continua.

O que precisa ser feito?

Como já citado, o aquecimento global e a ocorrência de eventos extremos, conforme os pesquisadores, são potencializados pela emissão em excesso de gás carbônico na atmosfera. "O CO2 é emitido pelo desmatamento, pelas queimadas, pelas indústrias, pelos veículos, etc. Toda a indústria fóssil emite muito CO2”, explica Marcelo Soares.

"Então, a gente precisa paralisar o desmatamento, paralisar as queimadas, fazer a transição energética o mais rápido possível, ou seja, não depender de termelétricas, por exemplo, que já eram [para ter sido] desativadas", adiciona.

Entenda as categorias de alerta da NOAA

Quando a temperatura fica 1°C acima da média histórica, inicia-se a contagem de ‘semanas de calor acima da média’. Quanto mais tempo acima da média, maior o nível de estresse. Para isso, a NOAA divide os alertas em oito categorias:

  • No Stress (sem estresse);
    • A temperatura está normal;
    • Sem branqueamento.
  • Bleach Watch (em observação);
    • Aquecimento maior que 0 e menor que 1 °C;
  • Bleaching Warning (perigo de branqueamento);
    • Aquecimento maior ou igual a 1 °C;
    • De 0 à 4 semanas acima da média;
    • Risco de possibilidade de branqueamento.
  • Bleaching Alert Level 1 (alerta de branqueamento nível 1);
    • Aquecimento maior ou igual a 1 °C;
    • De 4 à 8 semanas acima da média;
    • Risco de branqueamento em todo o recife.
  • Bleaching Alert Level 2 (alerta de branqueamento nível 2);
    • Aquecimento maior ou igual a 1 °C;
    • De 8 à 12 semanas acima da média;
    • Risco de morte em todo o recife e risco de mortalidade em corais com baixa sensibilidade ao calor.
  • Bleaching Alert Level 3 (alerta de branqueamento nível 3);
    • Aquecimento maior ou igual a 1 °C;
    • De 12 à 16 semanas acima da média;
    • Risco de mortalidade de múltiplas espécies.
  • Bleaching Alert Level 4 (alerta de branqueamento nível 4);
    • Aquecimento maior ou igual a 1 °C;
    • De 16 à 20 semanas acima da média;
    • Risco severo de mortalidade de múltiplas espécies de corais (mais de 50%).
  • Bleaching Alert Level 5 (alerta de branqueamento nível 5);
    • Aquecimento maior ou igual a 1 °C;
    • Mais de 20 semanas acima da média;
    • Risco de mortalidade quase completa dos corais (mais de 80%).

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