Cigarros eletrônicos: Receita apreendeu 14 mil unidades no CE em 3 anos

Centro-Oeste é principal porta de entrada para cigarros eletrônicos no Brasil, afirma especialista. No Ceará, além das apreensões pela Receita, PF contabilizou recolhimento de 3.922 dispositivos eletrônicos para fumar

10:21 | Jan. 04, 2024

Por: Alexia Vieira
Cigarros eletrônicos podem causar graves problemas pulmonares com poucos meses de uso (foto: Freepik)

De 2020 a maio de 2023, a Receita Federal apreendeu 14 mil unidades de cigarros eletrônicos no Ceará. De acordo com os dados do órgão, os produtos equivalem ao valor de R$ 1.181.136,80. Apesar da importação e venda de dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs), acessórios e refis não serem autorizadas no Brasil, os objetos apreendidos passaram de duas milhões de unidades nesse período no território nacional.

Já a Polícia Federal (PF) contabiliza a apreensão de 3.922 DEFs de 2021 a novembro de 2023 no Ceará. Dos estados do Nordeste, o Ceará é o que mais registra apreensões de cigarros eletrônicos pela PF. No Brasil, o número chega a 501.585 dispositivos, sendo quase metade no Mato Grosso do Sul (233.757). O MS faz fronteira com o Paraguai e a Bolívia, fazendo parte da rota do contrabando.

O número de pessoas detidas por envolvimento com o contrabando de cigarros eletrônicos pela PF aumenta a cada ano, passando de oito detenções em 2019 para 313 em 2023. No total, no intervalo dos últimos cinco anos, 547 indivíduos foram detidos.

Popularidade de cigarros eletrônicos entre jovens preocupa especialistas

Pesquisa de 2022 feita pela Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), do Ministério da Saúde, mostra que pelo menos um a cada cinco jovens de 18 a 24 anos usa cigarros eletrônicos no Brasil. A quantidade crescente de jovens fumantes de DEFs preocupa o coordenador da comissão Científica de tabagismo da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT), Paulo Correa.

Segundo Paulo, os dispositivos são facilmente acessados na maioria das grandes cidades, comercializados até mesmo por aplicativos de delivery. Os DEFs também têm uma capacidade de gerar dependência química, pois os níveis de nicotina chegam a ser maiores do que os contidos nos cigarros tradicionais, conforme o especialista.

Para ele, a indústria do tabaco vê nos jovens um novo mercado a ser explorado. “Esse é o perfil de funcionamento da indústria do tabaco, ela faz o contrabando no início, depois fala que já está tendo muita gente usando e faz lobby junto do Congresso Nacional para liberar o cigarro eletrônico”, afirma.

A indústria também utiliza as mesmas rotas de contrabando de cigarros tradicionais para infiltrar DEFs no mercado brasileiro. “A gente sabe que a rota de entrada do cigarro eletrônico no Brasil é principalmente pela região Centro-Oeste. Dessa região, já existem rotas para contrabando de cigarros normais, que são aproveitadas”, explica Paulo.

Com mais de 2 mil substâncias químicas, DEFs podem causar problemas sérios de saúde

Para conseguir comercializar os cigarros eletrônicos, Paulo afirma que a indústria do tabaco “tratou de disseminar vários mitos, inverdades e mentiras para dizer que eles eram seguros”. No entanto, pesquisas científicas mostram a presença de substâncias cancerígenas em grande quantidade também nos dispositivos eletrônicos.

“Uma pesquisadora da Universidade de Rochester, nos Estados Unidos, fez uma análise exploratória com tecnologia de ponta e viu que tem cerca de duas mil substâncias químicas diferentes [no cigarro eletrônico]”, relata Paulo. Os DEFs podem conter inseticidas, pesticidas, propilenoglicol, glicerina, formol, ácido benzóico, dentre outras substâncias.

“Uma grande proporção dessas substâncias químicas é de natureza desconhecida, e isso faz com que os cigarros eletrônicos sejam extremamente perigosos”, afirma. Além dos riscos similares aos dos cigarros convencionais, quem usa os eletrônicos tem ainda a possibilidade de inalar os metais que compõem a bateria dos dispositivos.

Nos EUA, uma nova doença foi identificada em pacientes fumantes dos dispositivos, a Evali, sigla em inglês para lesão pulmonar induzida pelo cigarro eletrônico. “Ao contrário do cigarro convencional, que não tem doenças mais agudas relacionadas à sua utilização, ele [fumante de cigarros eletrônicos] pode desenvolver essa inflamação pulmonar que leva a pessoa até a necessidade de UTI, com deficiência respiratória e falta de ar”, explica.

Os danos já foram percebidos em pacientes que fumaram os DEFs por poucas semanas ou meses. Como os dispositivos não são vendidos de forma regular no Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ou o Ministério da Saúde não monitoram casos de Evali. Paulo afirma que as notificações da doença atualmente são feitas pelas experiências clínicas de médicos compartilhadas entre a categoria.