577 crianças e adolescentes esperam cirurgia ortopédica ou traumatológica no Ceará

Dado é da Secretaria da Saúde do Estado (Sesa). Demora para a correção cirúrgica de deformidades agrava quadro dos pacientes, que têm de zero a 17 anos

18:53 | Ago. 27, 2023

Por: Ana Rute Ramires
Guilherme, 12, e sua mãe Janir, 40. O menino está na lista de espera para realizar cirurgia nos joelhos (foto: FERNANDA BARROS)

A espera por um procedimento cirúrgico é difícil por si só. Quando a demora se prolonga por falta de oferta, a situação piora e pode agravar o quadro de saúde, sobretudo para crianças e adolescentes. No Ceará, 3.018 pessoas de zero a 17 anos aguardam por cirurgia. Destas, 577 para ortopedia ou traumatologia, conforme a Secretaria Estadual da Saúde (Sesa).

Leonardo Drumond, presidente da Cooperativa dos Médicos Traumatologista e Ortopedistas do Estado do Ceará (Coomtoce), explica que os procedimentos de ortopedia são para deformidades diagnosticadas e que precisam de correção cirúrgica. Elas são realizadas principalmente no Hospital Infantil Albert Sabin (Hias) e, em menor volume, no Hospital Geral de Fortaleza (HGF) e no Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC).

As malformações podem ser congênitas, que ocorrem durante a gravidez, ou adquiridas, durante a formação após o nascimento. Conforme o médico, os casos mais comuns são de problemas em pés e mãos, que correspondem a 80% dos casos de ortopedia. Pés planos, deformidades nos dedos das mãos e dos pés, um dedo a mais ou a menos, dedos unidos, deformidades angulares, como joelhos para fora, são alguns exemplos desses casos.

Ele também cita problemas nos quadris, que podem luxar, associados a doenças neurológicas, e deformidades na coluna vertebral. Os procedimentos traumatológicos se referem a quedas e fraturas, por exemplo, e são realizados principalmente no Instituto Dr. José Frota e no Hospital da Criança.

“À medida que o tempo vai passando, fica mais difícil ou impossível tratar do problema”, alerta o médico. “Muitas vezes, (o paciente) não consegue ir para escola, não consegue se inserir socialmente. Começa a se excluir, causa um dano não só motor, mas social. Quanto mais tempo leva, maiores são as sequelas, não só ortopédicas”, acrescenta.

Uma criança com pé torto tem dificuldade de marcha, o que pode causar “uma exclusão social, educacional, emocional”, relaciona Leonardo Drumond. “Existe no Governo do Estado uma tentativa de minimizar com várias estratégias, mas é uma demanda muito grande. Principalmente no Interior, é pior. As crianças e adultos têm que ter mais acesso ao médico especialista. Até mesmo um ortopedista geral tem dificuldade de manejar o paciente”, detalha.

Conforme a cooperativa, dados extraídos em julho deste ano indicam que 1.071 pacientes de zero a 17 anos aguardam na fila por cirurgia ortopédica. Conforme a Sesa, são 3.018 pessoas nessa faixa etária aguardando por cirurgia, sendo 577 para ortopedia e traumatologia.

A Sesa considera a “fila real”, após atualização do cadastro por meio de contato com o paciente. A secretaria afirma que já foram realizadas mais de 30 mil cirurgias eletivas em 2023, sendo 1.227 em pacientes de zero até 17 anos.

Breno Novais, coordenador da Regulação do Estado, afirma que há previsão de uma “contratualização para expandir a capacidade” do Hias, que realiza os procedimentos ortopédicos de alta complexidade.

“Olhando para o momento já conseguimos ver uma diferença significativa. Ano passado, fizemos menos de mil procedimentos nesses 7 primeiros meses. Esse ano passamos dos 1,2 mil”, compara.

Segundo Breno, a ortopedia é um dos procedimentos com maior demanda e "ganha destaque pelas anomalias congênitas". Embora o Estado esteja procurando expansão do atendimento de algumas especialidades no Interior, o coordenador explica que é melhor concentrar alguns procedimentos em unidades como o Hias.

"Temos dificuldades no Brasil todo de oferecer especialidades de alta complexidade no Interior. Alguns procedimentos menos complexos podemos realizar no Cariri e em outros locais. Colocar para rodar lá (no Interior) pode ser mais caro, pela dificuldade de equipamentos e mão de obra qualificada. A gente prefere centralizar em um lugar que tenha resolutividade e que seja referência", explica.

Paciente aguarda desde 2019 na fila para procedimento

Guilherme Nascimento, de 12 anos, é uma das crianças que aguarda na fila há anos por cirurgia ortopédica no Hospital Infantil Albert Sabin (Hias). Segundo a mãe, Janir Nascimento, 40 anos, a espera perdura desde 2019.

Com paralisia cerebral, o menino precisa realizar procedimentos no quadril e nos joelhos. Ela relata que a demora tem prejudicado porque “ele está crescendo e está ficando muito travado, ele conseguia andar com apoio mas agora tá cada vez mais difícil, pois sente dor no joelho e nas pernas sempre”, compartilha a dona de casa.

Segundo Janir, o retorno está marcado para setembro. “Aí vão marcar (a cirurgia) para outubro, assim espero. Porque toda vez é isso, marca a data e sempre fica adiando pro ano seguinte”, afirma.

Ela elogia o atendimento no Hias. “É muito bom, não tenho o que dizer do atendimento e do especialista, o problema é só a espera da cirurgia”.

“O Guilherme também está sem fisioterapia já há muito tempo pois não consegue pelo posto. Nunca tem vaga. No momento, está sendo só atendido no Sarah Kubitschek na natação, que já é uma benção. Mas gostaria mesmo da fisioterapia, pois ele está muito travado”, acrescenta.

Conforme a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), a Central de Regulação do Estado tentou entrar em contato com um familiar do paciente duas vezes. “A primeira tentativa foi em 5 de setembro de 2022 e a segunda, no dia 4 de maio de 2023”, disse a pasta em nota.

Sesa procura pacientes para atualizar cadastro

De acordo com Breno Novais, coordenador da Regulação do Estado, a “fila real” considera os casos atualizados, que somam 23,2 mil pessoas. Mas ele diz que a pasta não conseguiu contato com 13.887 mil pacientes.

Segundo ele, “alguns já fizeram procedimentos, foram alterados, fizeram tratamentos, mudou a conduta de cada caso”. Porém garante: “A gente não tira o paciente da fila até localizar”.

“Estamos aumentando o nosso pessoal para a força tarefa de conseguir encontrar essas pessoas. Tínhamos uma fila média de 68 mil congelada. Estavam fazendo essa qualificação. Boa parte nós conseguimos encontrar”, diz.

“A Sesa reforça que os pacientes que estão na fila aguardando por uma cirurgia eletiva precisam atualizar o seu cadastro. A pessoa pode ligar para nossa central telefônica 0800 280 5110 ou então acessar o aplicativo Ceará App para atualizar seus dados”, informa a pasta. 

Outra alternativa é o contato por WhatsApp pelos números: (85) 3219 6073, (85) 3219 9366 ou (85) 3101 2610. O atendimento é feito de de segunda à sexta-feira, das 7 às 18 horas