Violência entre policiais: "Nós do ódio estão mais visíveis", aponta psicanalista
Em entrevista à rádio O POVO CBN, o psicanalista e professor da USP, Christian Dunker, falou sobre a percepção social da violência entre policiais diante da chacina recente no CearáOs recentes casos de mortes de policiais ocasionadas por colegas da corporação, em Camocim, no Ceará, nesse domingo, 14, e no município de Salto, no interior de São Paulo, na segunda-feira, 15, trouxeram à tona o questionamento do potencial de propagação desses episódios de violência entre policiais.
O psicanalista e professor titular do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (US), Christian Dunker, descreve isso como sintoma da maior visibilidade dos “nós de ódio”, o que não necessariamente subentende um aumento da violência propriamente dita. Seria, para ele, “uma insubordinação e inquietude das pessoas” que buscam medidas para resolução de uma violência que tem-lhes afetado.
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“Quando eu digo que os nós do ódio estão mais visíveis, é porque a percepção social da violência é um fenômeno que acompanha um pouco a violência real, mas nem sempre. Nós podemos enxergar com maior clareza, podemos dar mais relevância, nos indignar mais com a violência, ou podemos viver num estado de extrema violência, mas aquilo não é percebido e não gera a indignação necessária para que a gente faça uma transformação”, afirmou o professor em entrevista à jornalista Maisa Vasconcelos, da rádio O POVO CBN, nessa terça-feira, 16 de maio.
Segundo Dunker, no Brasil há uma espécie de acúmulo de erros que “concorre para uma situação que já estava, em termos de saúde mental, bastante problemática". Seria um "efeito de contaminação de violência”.
Entre esses elementos, citados pelo professor durante a entrevista, estão uma complacência para a violência exercida especialmente contra jovens negros e de perifieria e um discurso que a violência é um tratamento ideal para a violência.
Outro fator que influencia nesse fenômeno é a reprodução de discursos que apontam a inépcia das instituições de segurança.
“Eventualmente, até discursos midiáticos que vão convencendo as pessoas de que a Polícia não está fazendo o seu papel, que há muita corrupção e, na verdade, o País está na mão das milícias. Isso vai produzindo e incitando uma sensação de que temos que fazer justiça com as próprias mãos. É um efeito da nossa representação de como a gente está ensinando e sendo ensinados sobre a maneira como os conflitos são resolvidos”, argumentou.
Dessa forma, Dunker explica que, atualmente, “a gente colhe efeitos de uma crença de que a violência se resolve com mais violência, e cada um pode ter então as suas armas, acertar o seu mal estar do seu jeito". "No fundo, isso é uma primatização da questão da segurança.”
Essa percepção, segundo o psicanalista, está em desacordo com um consenso mundial de que a boa segurança é a segurança comunitária, que é feita em uma rede, na qual os casos de violência são perspectivamente acolhidos, tratados e encaminhados.
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Na madrugada de domingo,14, um policial civil matou três escrivães e um inspetor da Polícia Civil do Ceará (PC-CE) dentro da Delegacia Regional de Camocim. O suspeito e colega das vítimas, um homem de 44 anos, confessou o crime em um vídeo gravado ainda no domingo, no qual afirmou ter sofrido assédio moral e perseguição dentro da corporação.
Durante a audiência de custódia do suspeito, que aconteceu no dia seguinte, a defesa do policial apresentou um atestado emitido no último dia 11 de maio por uma psicóloga particular em Camocim para 15 dias de afastamento do policial.
No documento, a psicóloga alega que o profissional apresentava transtorno de ansiedade e depressão, além de sintomas como insônia, desânimo e instabilidade mental. A chacina de Camocim, além da questão da violência entre policiais, também trouxe à tona a deficiência de apoio à saúde mental dos profissionais de segurança pública.
Também nesta semana, um caso de violência entre policiais aconteceu na cidade de Salto, no interior de São Paulo. Na segunda-feira, 15, um sargento disparou contra dois policiais militares na 3ª Companhia do 50º Batalhão de Polícia Militar do Interior, ocasionando a morte de ambos.
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