Medo nas escolas: como acolher crianças e adultos impactados pelos casos

A comunidade escolar tensionada pela onda de ataques, neste momento em que todos estão abalados pelos casos recentes, indica que pais, alunos e educadores precisam verbalizar suas preocupações e serem ouvidos. É necessária uma discussão ampla e coletiva, incluindo o poder público

"Estamos aconselhando aos pais olharem mais para seus filhos, saberem quem são suas amizades, com quem e onde eles estão andando; prestarem atenção aos filmes que estejam assistindo, o computador; acompanhar mais de perto o que estão fazendo. Porque as crianças e adolescentes hoje estão mais doentes. Depois da pandemia, esses meninos e meninas voltaram mais estressados, mais nervosos, impacientes. E a gente tem que fazer um trabalho psicológico bem de perto".

A observação da pedagoga Graça Bringel, presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino do Ceará (Sinepe), é uma descrição que ajuda a entender como tem sido parte da rotina dos ambientes escolares, desde o início de episódios sequenciados de ataques em unidades de ensino pelo País.

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Ela cita uma percepção dela no portão de acesso da escola em que é diretora: "Hoje na frente dos colégios há muito mais carros dos pais indo buscar seus filhos. Como nunca houve, eu diria. Os pais estão muito presentes atualmente porque eles estão muito ansiosos e perdidos, tanto quanto as escolas".

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A psicóloga e professora universitária Letícia Bessa, especialista em Psicologia Escolar e Educacional e doutoranda na área, destaca que crianças, adolescentes e adultos, sejam eles pais ou educadores, precisarão ser percebidos "e acolhidos" a partir de suas reações e papéis nesse momento de crise — cada um em sua escala de compreensão e relação com os fatos.

Com as crianças, a psicóloga diz que é importante perceber qual o nível de entendimento, escutar qual a demanda dela e abordar o assunto respeitando esses limites.

Ela orienta que é importante que quaisquer sentimentos de uma criança que despontem nas conversas sejam validados e acolhidos. E que a abertura para uma nova oportunidade de contato seja logo indicada, caso o pequeno demonstre essa necessidade.

"Com os adolescentes e jovens também são muito importantes a escuta e o acolhimento, mas podemos pensar em estratégias de orientação, como conversas que contribuam para a educação virtual e para o respeito à diversidade humana: orientar para o não compartilhamento de mensagens de ódio, por exemplo", ressalta Letícia Bessa.

Sobre a situação de educadores e pais, a psicóloga define como "natural que eles também se abalem e fiquem receosos" com a onda de ataques reais e ameaças virtuais. E indica que "esse adulto precisa se acolher, conversar com quem pode lhe ajudar a entender um pouco mais esse contexto, para que não venha a tensionar ou gerar insegurança junto às crianças".

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A jornalista e professora universitária Helena Martins, doutora em Comunicação, defende que, pela complexidade da situação, é preciso pensar saídas não apenas imediatas, mas de longo prazo. "Digo isso porque, na ânsia de apresentar respostas imediatas, muitos estão defendendo a adoção de tecnologias vigilantistas na escola — ao passo que diversas pesquisas, inclusive sobre os investimentos tecnológicos nesse tipo adotados nos Estados Unidos, mostram que a implementação de câmeras e outros instrumentos não diminuiu a ocorrência de ataques nas escolas".

Integrante da equipe de transição que antecedeu o governo Lula, no núcleo que discutiu a área de comunicações, ela considera que a mídia tem dado "muito espaço para esse tipo de 'saída', mas seria fundamental pensar por que a escola se tornou um espaço difícil para muitos jovens".

Para pais que não têm sabido lidar com a complexidade do tema na conversa com os filhos — igualando a situações como violência sexual ou pedofilia, por exemplo — Helena Martins aponta que isso mostra a distância dos pais em relação à comunidade escolar. "Eles (os pais) são parte da comunidade escolar, devem pensar a escola, ajudar a construir a escola, defender melhorias para as escolas".

Graça Bringel, do Sinepe, admite que este é um momento assustador, mas que está além do cenário das escolas. "Acho que todo o País, todo brasileiro está sofrendo com a morte de crianças e adolescentes. Mas esse é um problema que não pode ser resolvido só no colégio. É um problema de uma sociedade e também um problema governamental. Tem que se juntar Estado, Município e Federação para encontrar alternativas para resolver essa situação”.

Segundo ela, nem escolas privadas, nem públicas têm condições de sair desse momento sem o apoio dos governos. Bringel se posiciona contra o uso de seguranças armados, pelo risco potencializado que criminosos ataquem esses profissionais para lhes tomarem justamente essas armas.

A psicóloga Letícia Bessa defende que esta é uma situação propícia para o estreitamento da parceria escola e família.

"Tivemos a oportunidade de fazer isso no início da pandemia e, depois, no retorno das aulas presenciais, dois momentos muito desafiadores para educação formal. Temos outra oportunidade agora. Seria muito interessante se as escolas trabalhassem com conselho de pais, por exemplo. O fortalecimento dessa relação só tem a gerar ganhos para o processo de ensino-aprendizagem e para as situações de conflito que são comuns à experiência humana", aponta Letícia Bessa.

 

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