Cinco pessoas não binárias podem ser as primeiras a retificar certidão de nascimento no Ceará

No Estado, retificação não binária ainda não é feita diretamente nos cartórios e é preciso recorrer judicialmente. Defensoria acompanha casos que tramitam há mais de um ano

No Ceará, cinco pessoas podem se tornar as primeiras a terem o gênero identificado como não binário na certidão de nascimento. Como a retificação não binária ainda não é possível diretamente nos cartórios do Estado, a população tem de recorrer judicialmente. Há mais de um ano a Defensoria Pública do Estado do Ceará (DPCE) atua nos casos.

"O respeito a sua identidade é um direito garantido constitucionalmente a qualquer pessoa. É uma forma de prevenção à discriminação e de garantia da dignidade e de uma sociedade efetivamente democrática", explica a defensora Mariana Lobo, supervisora do Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas (NDHAC) da DPCE. 

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A não binariedade é um termo que abrange identidades diferentes dos gêneros atribuídos no nascimento. A identificação das pessoas não binárias ultrapassa a compreensão de apenas duas identidades serem possíveis: feminino e masculino.

Para essa população, sua identidade de gênero está fora ou entre as identidades feminina e masculina. Cada indivíduo expressa sua identidade à sua maneira e a autodeclaração é um direito constitucional. Há quem faça questão de demarcar também por meio do vocabulário adotando a linguagem neutra e o termo "não binárie".

No Brasil, são cerca de 2,5 milhões de pessoas não binárias. O número foi calculado em um estudo pioneiro na América Latina que mapeou adultos transgêneros e não binários no País, realizado pela Faculdade de Medicina da Universidade Estadual Paulista e divulgado em novembro de 2021.

Não binariedade na certidão de nascimento: o que diz a Justiça

Desde 2018, o Provimento nº 73 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) permite que a retificação de prenome e de gênero seja feita diretamente nos cartórios. No entanto, a decisão contempla apenas alterar o gênero do feminino para o masculino e vice-versa. Como não há menção à população não binária, é necessário o procedimento judicial.

Brune Bonassi, 30 anos, é psicanalista e uma das cinco pessoas que aguardam a resposta da Justiça. "Eu me identifiquei como não binárie em 2015. Tinha disforia com meu gênero, me hormonizava com testosterona e tentei também a identidade masculina. Não me identifiquei com o masculino", conta. "Aí conheci uma pessoa não binária e entendi que essa seria uma identificação possível."

"A identificação como não binárie me conectou com muita gente e me ajudou muito a diminuir a disforia, porque entendi que não precisava transicionar ou expressar os gêneros binários. Antes da não binariedade havia uma pressão muito forte no meio transexual para expressar o binarismo", continua.

Há cinco anos, com a decisão do CNJ, Brune retificou o prenome e deixou para trás o Bruna registrado em seu nascimento. Entretanto, a retificação de gênero não foi possível. O processo judicial corre desde fevereiro de 2022.

"Como já retifiquei meu nome, não tenho tanta urgência. No entanto, há mais pessoas junto comigo nesse processo e elas não retificaram o nome ainda. Isso gera vários constrangimentos em todas as vezes que se vai apresentar o documento, por exemplo", completa. "É um desgaste que produz muita ansiedade e, em decorrência, doenças psicológicas."

Pessoas não binárias: como retificar no Ceará 

"O STF já decidiu, existe uma série de direitos oriundos da liberdade de orientação sexual e de identidade de gênero, que vem da autodeclaração de uma pessoa. Não cabe a ninguém atribuir a qualquer pessoa um gênero diferente daquele com o qual ela se autodeclara e com o qual socializa", enfatiza Mariana Lobo.

Ela explica que em alguns estados brasileiros o Tribunal de Justiça, por meio da Corregedoria, já possibilita que a pessoa vá a um cartório, faça a autodeclaração para alterar o registro civil na certidão de nascimento e conste a identidade não binária. Isso acontece, segundo a defensora, no Rio Grande do Sul, na Bahia, em Pernambuco e no Rio de Janeiro, por exemplo.

No Ceará, é necessário entrar com uma ação judicial para que o juiz determine ao cartório que realize a alteração. "Essas ações normalmente têm um trâmite rápido. Nenhum juiz pode deixar de dar uma decisão", diz.

A defensora orienta a entrar em contato com o Núcleo de Direitos Humanos e Ações Coletivas por meio do telefone (85) 98895 5514, pelo WhatsApp (85) 98873 9535 ou pelo e-mail [email protected].

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