Servidores da UFC criticam ações da administração durante pandemia

Sindicato aponta que Instituição teria feito "compra de testes sorológicos não confiáveis e que os resultados não teriam sido divulgados". Administração refuta e cita "cegueira ideológica de um sindicato"; matéria atualizada às 17h do dia 10/04

16:34 | Abr. 09, 2022

Por: Lara Vieira
Docentes e alunos teriam sido excluídos dos diálogos (foto: Iana Soares em 06/10/2011)

O Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (ADUFC-Sindicato) publicou um manifesto nessa sexta-feira, 8, criticando ações realizadas pela Universidade Federal do Ceará (UFC) em relação à pandemia da Covid-19. Segundo a Entidade, a administração superior da instituição de ensino mostrou "atitudes negacionistas", além de "favoráveis ao uso de medicamentos comprovadamente ineficazes para o tratamento da doença". A administração superior da UFC rebate as acusações alegando que "ofendem não apenas a presidência, mas toda a comunidade acadêmica" (leia abaixo nota na íntegra).

Segundo a declaração, o posicionamento ocorre após o Sindicato ter analisado algumas atas disponíveis do Comitê de Enfrentamento do Coronavírus da UFC, que se reuniu pela primeira vez em 16 de março de 2020. O Comitê é liderado pelo vice-reitor Glauco Lobo. De acordo com o ADUFC, o reitor Cândido Albuquerque só esteve nas quatro primeiras reuniões do Comitê, de um total de 41. Por sua vez, os representantes docentes foram excluídos das sessões, enquanto estudantes participaram de apenas duas reuniões.

Em uma das ocasiões verificadas pela Entidade, ocorrida no dia 4 de fevereiro de 2021, já na segunda onda da pandemia, Glauco Lobo teria defendido o uso do “tratamento precoce". Nessa época, conforme denúncia, o método já estava invalidado pela comunidade científica e já se alertava, inclusive, sobre os efeitos colaterais da superdosagem desses medicamentos. Segundo o ADUFC, o vice-reitor teria questionado se a universidade poderia fornecer esses remédios

Outra ocasião reportada pelo Sindicato aponta que o vice-reitor sugeriu, em reunião no dia 24 de março de 2020, a formação de um grupo de estudo em Covid-19 a ser formado por integrantes sem “grandes vieses ideológicos”. Além disso, em outra reunião, desta vez para discutir sobre o possível atendimento de alunos, Lobo teria defendido que "não se deve colocar médicos que são contrários, a priori, aos tratamentos disponíveis”, fazendo menção ao uso do tratamento precoce.

O ADUFC também aponta que a UFC teria feito a compra, reportada pelo Comitê no dia 9 de junho de 2020, de 13.460 testes sorológicos pelo valor de R$ 1,4 milhão, a partir de recursos liberados pelo Ministério da Educação (MEC). Na época descrita, conforme o ADUFC, esses testes para detecção de anticorpos já eram considerados inadequados pela comunidade científica para estabelecerem presença ou não de imunidade.

O Sindicato informou que, de acordo com as atas analisadas, esses testes foram utilizados, mas não há informação detalhada sobre os resultados, tais como o percentual de alunos, docentes, servidores técnico-administrativos e terceirizados testados, e a taxa de positividade.

Contra a vacina

A ADUFC criticou, ainda, a postura antivacinal adotada pelo Comitê. De acordo com o texto publicado, a administração da Universidade teria declarado rejeitar qualquer medida de implementação do comprovante de vacinação para o retorno presencial das atividades em várias atas, desde setembro de 2021.

A falta de transparência da Instituição de ensino também é um ponto discutido. De acordo com a ADUFC, das 41 reuniões realizadas entre 16 de março de 2020 e 10 de março de 2022, só foram encontradas 30 atas no Sistema Eletrônico de Informações. Além disso, entre 8 de setembro de 2020 e 4 de fevereiro de 2021 não haveria registro em ata de reuniões do Comitê de Enfrentamento do Coronavírus da UFC. "A não disponibilidade de várias atas de reuniões não surpreende e revela a falta de transparência da atual administração superior", criticou o Entidade.

"A ADUFC-Sindicato lamenta que a administração superior tenha utilizado recursos públicos e espaços institucionais da universidade para disseminar a cartilha negacionista do governo Bolsonaro, ignorando até mesmo pesquisas sérias desenvolvidas dentro da própria universidade para o enfrentamento da Covid-19 e proteção da comunidade acadêmica", finalizou o Sindicato, em manifesto.


Administração da UFC condena ataques do sindicato

Após publicação do manifesto do ADUFC-Sindicato, a administração da UFC divulgou nota rebatendo as acusações. Leia, na íntegra:

"Nota da administração: ataques da ADUFC não maculam trajetória do Comitê de Crise da UFC contra a Covid-19Imprimir

A Reitoria da Universidade Federal do Ceará vem a público manifestar sua profunda decepção não somente com as últimas publicações divulgadas pelo Sindicato dos Docentes das Universidades Federais do Estado do Ceará (ADUFC - Sindicato), como também com a ocorrência visível de desvios em suas finalidades.

Finda praticamente a pandemia do coronavírus, a entidade direciona agora seus ataques ao Comitê de Crise para o Enfrentamento da Pandemia da Covid-19 da UFC, instância consultiva oficializada pela Portaria nº 48, de 13 de março de 2020, com mais de dois anos ininterruptos de exemplar atuação, que contou, desde o seu nascedouro, com a participação ativa de servidores docentes, técnico-administrativos e estudantes, prestando um serviço de altíssimo valor social e científico.

O Comitê incentivou a vacinação, assessorou a testagem para SARS-CoV-2 e estabeleceu junto com as Pró-Reitorias de Graduação e de Pesquisa e Pós-Graduação os calendários do ensino híbrido e os protocolos de biossegurança. Deu suporte à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas na elaboração dos protocolos de biossegurança para o retorno das atividades administrativas, tendo executado com maestria seu mister.

Graças aos esforços desse Comitê e de outros agentes, a Universidade não interrompeu o cumprimento de sua missão durante a crise pandêmica, apesar das tentativas frustradas da ADUFC, a qual, sempre com ofensas e inverdades, tentou paralisar as atividades, sem levar em conta o grande prejuízo que tal interrupção causaria aos nossos alunos.

A Universidade, na verdade, evoluiu durante a pandemia, atingindo marcas históricas e inovadoras como 26 patentes próprias, crescimento vultoso em rankings de inovação, conclusão de 51 obras em estado de abandono, implantação do maior plano de inclusão digital de sua história e ampliação de bolsas e auxílios ao corpo estudantil.

Para nosso pesar, o pequeno grupo de radicais que ora ocupa a ADUFC, não tendo o que propor e incomodado com o triunfo da união da comunidade acadêmica em torno de interesses maiores que brigas políticas, insulta pessoalmente a gestão superior da Instituição, escolhendo no momento o Comitê como alvo. Um sindicato docente deve representar todos os professores, não uma minoria afiliada a entidades estranhas ao ambiente universitário.

É de se lamentar a cegueira ideológica de um sindicato que se tornou balcão de uma agremiação partidária radical, tanto que a esposa do parlamentar e mandatário maior do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) integra a diretoria da ADUFC, em claro aparelhamento. As acusações feitas, irresponsável e injustamente, ofendem não apenas a presidência do Comitê, mas toda a comunidade acadêmica pelas decisões dele beneficiada e, hoje, unida em prol da normalização plena da vida universitária, pela qual todos lutamos.

Seguiremos, unidos e conscientes de que as aleivosias do Sindicato não terão forças para jogar sombra sobre as importantes conquistas da nossa Universidade nos últimos dois anos.

Administração Superior da UFC"

Neste domingo, 10, a ADUFC entrou em contato com O POVO para repudiar a nota acima enviada pela administração da UFC. Confira íntegra:

A ADUFC repudia a prática antissindical da UFC e as ilações sobre instrumentalização do sindicato, feitas com o intuito de evitar o debate sobre as ações da administração superior e criminalizar a ação sindical. As denúncias sobre a condução da universidade na pandemia, apontadas a partir de análise criteriosa da ADUFC, não foram respondidas, o que confirma o pensamento negacionista da intervenção na UFC. Medidas jurídicas em relação às falsas acusações reiteradas em notas da reitoria estão sendo estudadas.

ERRAMOS: Diferente do publicado na primeira versão desta matéria, o título foi atualizado com a retirada da palavra “negacionista” para não confundir a opinião da reportagem com a dos servidores. O termo é utilizado pelo ADUFC-Sindicato para criticar a administração da UFC, e não pelo O POVO.