Mutirão da Defensoria Pública reforça importância do reconhecimento de paternidade

O Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) realizou ações para reconhecimento de paternidade neste sábado, 12. No Ceará, foram mais de 715 inscrições para o mutirão "Meu Pai Tem Nome"

19:10 | Mar. 12, 2022

Por: Ana Rute Ramires
QUASE 70% dos atendimentos são de mulheres em busca de reconhecimento de paternidade (foto: Thais Mesquita)

"Eu só quero que ele não passe o que eu passei". Há cinco anos, uma mãe busca os direitos do filho quanto ao reconhecimento da paternidade. Além de prejudicar questões burocráticas e judiciais, não ter o nome da filiação nos próprios documentos traz prejuízos emocionais e sociais. São histórias diversas que as Defensorias Públicas nos Estados buscam solucionar. 

Neste sábado, 12, o Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) realizou o mutirão "Meu Pai Tem Nome", com ações relacionadas ao reconhecimento de paternidade. No Ceará, os atendimentos acontecem nas sedes da instituição nas cidades de Crato, Fortaleza e Sobral. Ao todo, 715 pessoas se inscreveram para os atendimentos nas três localidades. 

"A princípio, foi uma investigação de paternidade e agora a gente tá com o reconhecimento. O teste de DNA já foi feito desde 2019. A pandemia meio que postergou tudo. Quando eu vi essa possibilidade gratuita, fiz o cadastro. Mas ele falou que não poderia vir", explica a mãe. Com o não comparecimento, o pai será notificado.

Além do reconhecimento da paternidade, ele precisa responder por outras questões como abandono afetivo e a revisão da pensão alimentícia. "Eu não estou querendo nada para mim, quero que meu filho seja reconhecido. Não só o nome, quero que ele participe da vida da criança. A gente sabe que isso traz danos muitas vezes irreversíveis. Psicológicos, sociais", conta.

"Eu falo por experiência própria. Sou filha única de mãe solteira e não tenho o nome do meu pai no registro. Na fase escolar, isso abala muito a criança", relata, sobre o ciclo que quer romper na família. 

A busca pelo nome do pai nos documentos não se restringe a crianças. No caso de Juliana Silva, 37, e Junior Silva, 40, a falta persiste há décadas. Apesar de eles dois e outro irmão conviverem durante toda a vida com o pai, o genitor nunca os reconheceu oficialmente.

"Nunca partiu dele essa vontade. Esperei 40 anos e ele nunca teve iniciativa. A gente viu o mutirão na televisão e resolveu dar início. Ele não veio, mas espero que ele tenha boa vontade para encerrar esse ciclo e reconhecer paternalmente perante a justiça", conta o filho. 

Eles deram entrada na ação judicial de reconhecimento de paternidade. Assim, foi feita uma petição chamando o indivíduo a realizar o exame de DNA. Nessa situação, o pai também pode reconhecer voluntariamente durante a audiência de conciliação. Se ele não reconhecer ou não realizar o exame, será intimado a fazer o exame. "A minha mãe morreu há 10 anos e era um desejo dela. Estamos atrás", diz Junior. 

Outras histórias: quando o pai busca o reconhecimento

 

Quase um terço dos casos, contudo, é de inscrições feitas pelos próprios pais. No corredor da Defensoria Pública do Estado do Ceará, na manhã deste sábado, um pai e um filho se encontraram pela primeira vez. Ele conta que, após a namorada terminar o relacionamento que mantinham, ela teve o filho e o entregou para adoção. 

Após orientação do Conselho Tutelar, ele deu início ao processo de reconhecimento da paternidade. Durante o mutirão, fizeram o exame de DNA. "Me emocionei, coloquei ele nos braços. A minha benção. Lá em casa, eu ficava imaginando ele", conta. Os planos são de criar, "trabalhar e dar o melhor" ao filho.

Com a emoção, ele quase esquece de dar os primeiros presentes ao pequeno: uma mala de bebê com roupinhas, entregues aos responsáveis do abrigo no qual a criança vive. 

As ações também incluem outro processo de reconhecimento, o do vínculo socioafetivo. Na família Alves, um dos filhos teve o reconhecimento do padrasto como pai oficialmente. O casal tem seis filhos, sendo duas adotadas e dois de outros relacionamentos.

"Nós quisemos que fossem todos reconhecidos porque sempre entendemos que o afeto é o mesmo para todos. Essa questão do reconhecimento é para suprir demandas necessárias, como questões legais. É importante para fazer valer o direito para todos", diz a mãe.

Dados do mutirão

 

A ideia do mutirão é dar visibilidade para a importância de ter o nome do pai no registro de nascimento, explica Elizabeth Chagas, Defensora Pública-Geral do Ceará. "Para além de alimentos, questões sucessórias, também tem uma questão de mudanças de vidas, de realidades. A gente viu as mais diversos histórias", destaca. 

Foram 715 agendamentos para o mutirão, sendo 69,1% de mulheres em busca de reconhecimento de paternidade dos filhos. Em 30,9% dos casos, as inscrições foram realizadas pelos pais que voluntariamente querem reconhecer os filhos.

Desse total, 288 dos agendamentos são para que as ações aconteçam de forma extrajudicial e outros 206 são para pedidos de judicialização. "60% dos atendimentos foram para acordos. Quer dizer que as pessoas precisavam de uma campanha como essa para tomar iniciativa", avalia.

A maioria dos agendamentos (561) foi para Fortaleza. O município de Sobral teve 72 inscrições e Crato registrou 82 agendamentos. Dos inscritos, 353 são para reconhecimento de crianças e adolescentes menores de 18 anos. Outros 118 são inscrições de pessoas acima de 18 anos. 

"Esse momento é de identidade. A gente faz esse atendimento durante todo o ano. Aqui é um mutirão concentrado", afirma. "Eu posso dizer que sei o que é isso porque também tive o registro tardio. Meu pai me registrou posteriormente e também fiquei um tempo sem o nome de pai. A gente sabe o que isso influencia na vida das pessoas", acrescenta a defensora geral.

Reconhecimento de paternidade no Brasil

 

No Brasil, 6% das crianças brasileiras nascem sem registro do pai. O Ceará está acima da média nacional, com índice de 7%. Essa é a nona maior taxa, atrás de Roraima (11,8%), Amapá (11%), Acre (10,5%), Distrito Federal (10,4%), Amazonas (10%), Maranhão (9,9%), Pará (7,9%) e Alagoas (7,3%).

Em 2022, até 7 de março, 29.165 nascidos com pai ausente entre 432.465. Nos últimos 4 anos, a País registrou um total de 686.146 pessoas o nome do genitor no registro. 

Serviço

 

Defensoria Pública Geral do Estado do Ceará 

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* O nome de algumas das fontes ouvidas pelo O POVO foi omitido a pedido das famílias.