Número de mulheres presas por envolvimento com facções criminosas sobe 65,1% no Ceará

São 71 prisões em flagrante pelo artigo 2º da Lei 12.850 (organização criminosa) entre janeiro e outubro de 2020, segundo dados da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública

O número de mulheres presas em flagrante no Ceará pelo Artigo 2º da Lei 12.850, chamada Lei das Organizações, que diz respeito a promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa, aumentou 65,1% em relação ao ano de 2020. A estatística é da Superintendência de Pesquisa e Estratégia de Segurança Pública da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado (SSPDS).

O dado é referente aos meses de janeiro a outubro de 2020, que registrou 43 prisões; e de 2021, que contabilizou 71 casos. Enquanto isso, o número de prisões de homens com base na Lei das Organizações teve uma diminuição de 4,3%, sendo 442 prisões em 2020 e 423 em 2021. 

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O quantitativo de presos por mandados de prisão (que não são em flagrante), incluindo homens e mulheres, por organização criminosa no Estado em 2021, entre janeiro e outubro, chega a 300. Neste ano, foram ainda 494 prisões em flagrante pelo mesmo crime.  Juntos, os números de prisões em flagrante e os mandados de prisão cumpridos com base na Lei 12.850 somam 794 pessoas detidas no Ceará. São 66 pessoas presas por mês por envolvimento com facções.

Um recorte desse aumento das mulheres nas organizações criminosas é a prisão de Valeska Pereira Monteiro, conhecida como "Majestade". Ela foi detida em agosto em Gramado, no Rio Grande do Sul, por meio da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco). A partir da prisão da Majestade, a Polícia Civil chegou aos gerentes do Comando Vermelho (CV) e concluiu a maior operação da PCCE contra uma só facção. O segundo escalão do grupo criminoso foi identificado. 

O titular da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas Draco, delegado Klever Farias, pontuou que entre 2019 e 2020 percebeu uma participação maior de mulheres nas organizações criminosas. "Em 2019 houve a prisão de todas as lideranças das facções no Ceará. Entre 2020 e 2021 foi feito um enfoque no grupo do Rio de Janeiro. A gente, de 2019 para 2020, percebeu e efetuou a prisão de mulheres", explica.

No caso da Majestade, por exemplo, ela manteve um relacionamento com o Max Miliano Machado da Sail, que era o número 1 do Comando Vermelho no Ceará. Ele foi preso na operação Guilhotina, deflagrada no Ceará e no Pará. Na ação da Polícia Civil foram presas 16 pessoas e apreendidos mais de 600 quilos de droga. 

Max Miliano é apontado como responsável por ordenar a chacina de Caucaia e, atualmente, está no Presídio de Segurança Máxima do Ceará. O delegado Klever Farias não soube precisar se Majestade entrou na organização por causa do companheiro, mas confirmou o relacionamento. 

Mulheres se tornam substitutas

 

Quando prendeu lideranças, o delegado Klever afirma que muitas mulheres ocuparam a posição de substitutas. São companheiras, irmãs, que, pelo vínculo de confiança ou familiar, assumiram o papel de chefia na organização.

Conforme o delegado, as prisões da facção originada no Ceará (GDE), muitas companheiras de "conselheiros" fundadores estavam exercendo papéis na organização. "Como ela é companheira é natural que tenha uma certa relevância na facção, mas ela tem uma posição de destaque quando ocupa o espaço do companheiro que foi preso", afirma.

Klever Farias explica que a função do conselheiro na organização criminosa é tomar decisões finais, como a morte de uma pessoa específica ou mortes que venham a ter uma relevância. "Dependendo de quem venha a morrer, pode dar uma repercussão maior na tomada de territórios. Eles também atuam na distribuição de drogas, dizem quem vai receber essa droga, quem pode fornecer entorpecentes, para onde vai esse entorpecente. Em uma empresa seriam decisões de gestão", explica.

 

Tráfico de drogas representa 52,5% da população carcerária feminina no CE; organização criminosa 10% 

 

De acordo com a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), atualmente, são 1.152 mulheres recolhidas no sistema prisional do Ceará. A maior parte está detida pelo crime de tráfico de drogas: 441 mulheres. Desse total, 153 foram autuadas por associação ao tráfico, 43 na lei antidrogas, 246 por roubo, 121 por homicídio, 80 por organização criminosa e 72 por furto. 

O maior índice de mulheres presas é pelo crime de tráfico, 52,5%. Organização criminosa representa 10% da população carcerária feminina. A maioria das mulheres presas tem entre 18 a 24 anos, são 236 mulheres nessa faixa etária. Seguida pela faixa etária de 25 a 29 anos, que são 233 detidas. 

O delegado Klever Farias comentou ainda sobre o principal crime das mulheres do sistema penitenciário ser o tráfico de drogas. O titular da Draco relatou que este crime tem relação direta com as organizações criminosas.  

"É natural que a prática do tráfico de drogas e a organização criminosa estejam ligados. Você não vai conseguir ser traficante de drogas sem ser membro de organização criminosa. A partir desse momento que você vê a simbiose, percebe que o número de prisão por organização criminosa vai aumentar. Infelizmente o carro-chefe do crime é o tráfico", avaliou.

 

Em 2016, O POVO publicou uma reportagem sobre mulheres que chefiaram o tráfico de drogas em comunidades. As histórias de Gabi, Célia do Oitão Preto e Valkiria tiveram destinos trágicos. 

Execuções de mulheres no tribunal do crime 

 

Além do aumento do número de mulheres nas organizações, há relatos de execuções de vítimas do sexo feminino, motivadas pela disputa dos grupos rivais e do "tribunal do crime".  

As duas vítimas foram capturadas por criminosos e executadas
As duas vítimas foram capturadas por criminosos e executadas (Foto: reprodução/vídeo )

No dia 29 de outubro deste ano, duas jovens foram mortas nas proximidades da Lagoa do Mondubim, em Fortaleza. As duas foram filmadas por criminosos que faziam referência a uma organização. De acordo com apuração do O POVO, integrantes de facção vasculham os aparelhos celulares das vítimas em busca de algum indício de envolvimento com o crime, que pode ser apenas o bairro onde elas residem. Nas imagens do caso do Mondubim, os homicidas conversam ao telefone e recebem orientações sobre o que fazer com as meninas. Elas foram executadas. 

No dia 11 de novembro, duas mulheres, de 21 e 18 anos de idade, foram resgatadas no bairro Santa Maria, em Messejana. Elas eram mantidas em cárcere privado por participantes de uma facção que, segundo a Polícia, planejavam matá-las. Sobre a motivação, os criminosos presos afirmaram à Polícia que as vítimas moravam no bairro há cinco dias e resolveram executá-las por entender que elas passavam informações para a facção rival. As vítimas estavam amarradas e haviam sido espancadas por quatro horas 

Num dos casos que mais chocou o Estado, que ocorreu no dia 2 de março de 2019, Nara Aline Mota de Lima, de 23 anos, Ingrid Teixeira Ferreira, de 22 anos, e Darcyelle Ancelmo de Alencar, 31 anos, foram arrebatadas, torturadas e mortas por esquartejamento no Vila Velha, em Fortaleza. As vítimas foram encontradas no dia 9 e os corpos foram identificados por exame de DNA. Toda a violência foi registrada pelos próprios criminosos em vídeos divulgados na Internet. A motivação também foi relacionada a facções criminosas, pois os indivíduos atribuíam uma das vítimas a participação em um grupo rival. 

Conforme o delegado Klever Farias, a morte das mulheres vítimas do tribunal do crime se dá a partir da participação e da efetividade delas nas facções. Ele afirma que não há vinculação com o gênero, já que o tribunal é o mesmo para homens e mulheres, mas que vê o fato de que mulheres estão, cada vez mais, praticando crimes. 

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