Extração de palha de carnaúba é um dos setores mais envolvidos com o trabalho escravo no Ceará

Ministério Público do Trabalho no Ceará (MPT-CE) explica que setor vem retrocedendo em relação ao cumprimento das normas trabalhistas

Falar sobre trabalho escravo em pleno século XXI parece ser algo fora da realidade, porém a exploração ainda vem sendo registrada no Ceará. De 2017 a 2020, o total é de 59 resgates de trabalhadores em condições análogas à escravidão no Estado. Entre os setores econômicos mais envolvidos com a exploração, está a extração de palha de carnaúba, uma das principais atividades econômicas do Ceará. Os dados são do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho (Smartlab), plataforma conjunta com o Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT), consolidados nesta quinta-feira, 30.

A plataforma também mostra que, no Ceará, a maioria dos resgatados do trabalho escravo são homens, com idade entre 18 e 24 anos. Apenas em 2021, levantamento parcial do O POVO aponta que 20 trabalhadores foram resgatados em condições análogas à escravidão no Estado.

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Nessa quarta-feira, 29, fiscalização no município de XiqueXique, no sertão baiano, resgatou 53 lavradores em trabalho escravo, sendo que 43 deles foram aliciados em Martinópole, a 320 quilômetros de Fortaleza. Segundo o MPT-BA, os trabalhadores eram submetidos a condições subumanas e atuavam na extração de folhas e pó da carnaúba, palmeira espinhenta que fornece matérias-primas para diversas atividades.

Na última semana, outra operação de combate ao trabalho escravo, dessa vez do MPT-CE, entre os dias 20 e 24 de setembro, resultou no resgate de nove trabalhadores que estavam expostos a condições análogas à escravidão no município de Granja, a 332 quilômetros de Fortaleza. Os trabalhadores foram encontrados em uma residência destinada justamente à extração de palha da carnaúba, estavam alojados em uma casa abandonada, sem energia elétrica, água encanada e instalações sanitárias.

A fiscalização constatou em Granja que os empregados conviviam com porcos e fezes de animais, cozinhavam em fogareiro improvisado no chão e recebiam água acondicionada em vasilhames inadequados e com reutilização proibida, além de dormirem na parte externa do imóvel ou embaixo de um cajueiro.

De acordo com o procurador do MPT-CE, Carlos Leonardo Holanda Silva, há fiscalização no setor de extração de palha da carnaúba desde 2017 para a regularização das condições de trabalho dos empregados. “Uma melhora gradual vinha acontecendo em 2018. No entanto, não ocorreu fiscalização em 2019 e 2020 devido à falta de recursos. O retorno ocorreu neste ano, e a gente percebeu o retrocesso do setor [de extração de palha da crnaúba] com os trabalhadores”, disse.

O objetivo com a retomada das fiscalizações agora é que a cadeia produtiva do setor da carnaúba, principalmente na parte extrativista do produto, cumpra a legislação do trabalho. “Tem que dar condições de trabalho para o empregado, tem que fornecer equipamentos de proteção, explicar como utiliza”, ressalta o procurador do MPT-CE.

No Ceará, as atividades de extração de palha de carnaúba têm forte presença na região Norte do Estado, em municípios como Granja, Sobral, Jericoacoara, Santana do Acaraú, Camocim, Martinópole, entre outros. Para as fiscalizações do MPT, o procurador explica que é feito um mapeamento inteligente das regiões, pois muitas vezes as atividades de extração são realizadas em locais próximos aos carnaubais na mata e de pouco acesso.

Conforme Carlos, a atividade de extração de palha de carnaúba é economicamente muito rentável. “O pó da carnaúba é utilizado em várias indústrias. Ele está em chip de computador e em goma de mascar, por exemplo. A utilidade do pó da carnaúba está presente em diversos produtos e é um dos produtos que tem maior rentabilidade na balança comercial do Estado do Ceará”, destaca.

Fiscalização

Nas operações de fiscalização do combate ao trabalho escravo do Ministério Público do Trabalho (MPT), a equipe conta com a Auditoria Fiscal do Trabalho em conjunto com a Polícia Rodoviária Federal (PRF) ou outro órgão policial. Ao constatar o trabalho escravo no local, a equipe resgata os trabalhadores, realiza a rescisão indireta dos contratos de trabalho, com pagamento das verbas rescisórias e todos os direitos trabalhistas devidos.

Ao constatar o crime do artigo 149 do Código Penal (reduzir alguém à condição análoga à de escravo), os agentes fazem um relatório de ação fiscal, para detalhar a diligência, e o encaminham ao Ministério Público Federal (MPF). Posteriormente, os responsáveis pelo crime são chamados ao MPT, onde eles podem assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) ou podem vir a sofrer uma ação civil pública, com cobrança de indenização.

A escravidão moderna ainda consiste na falta de direitos básicos exigidos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Dentre os requisitos, estão a alimentação, a remuneração pelas horas trabalhadas e o descanso. Além disso, os funcionários devem receber tratamento adequado enquanto realizam suas funções, conforme a Norma Regulamentadora (NR 24), que trata das condições de higiene do trabalhador, como acesso a instalações sanitárias, como banheiros, vestiários, cozinha, alojamento e Equipamentos de Proteção Individual (EPIs).

As denúncias referentes aos trabalhos análogos à escravidão no Ceará podem ser feitas de forma anônima no Sistema IPÊ ou através do autoatendimento da Fiscalização do Trabalho: (85) 3878.3117.

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