"Urina preta": consumo de peixes deve ser evitado só com recomendação da Saúde
Quatros estados brasileiros registraram casos suspeitos da doença em 2021: Amazonas, Bahia, Ceará e Pará. Secretaria da Saúde do Ceará publicou nota técnica para alertar sobre a doença
21:57 | Set. 16, 2021
O consumo de peixes associados aos casos suspeitos da Síndrome de Haff, conhecida como doença da “urina preta”, só deve ser evitado temporariamente após uma recomendação das secretarias da Saúde dos estados que tiveram casos notificados, alertam infectologistas. No Brasil, quatros estados registraram casos suspeitos da doença em 2021: Amazonas, com 61 casos, Bahia (13), Ceará (9) e Pará (6). Um óbito suspeito foi relatado em março, em Recife, e outros dois em setembro, sendo um em Santarém, no Pará, e outro na cidade de Itacoatiara, no Amazonas.
Nos estados, os peixes Piraptinga, Pacu, Tambaqui, Badajo e Arabaiana estão entre as espécies com suspeitas de contaminar e, consequentemente, ocasionar a doença. A Síndrome de Haff consiste em uma rabdomiólise sem explicação. Ela caracteriza-se por ocorrência súbita de extrema rigidez muscular, mialgia difusa, dor torácica, dispneia, dormência e perda de força em todo o corpo, além da urina escura. Ela está relacionada, principalmente, com a ingestão de pescados e crustáceos contaminados.
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De acordo com o médico infectologista e membro-diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Antônio Carlos Bandeira, antes de recomendar a suspensão do consumo de algumas espécies de peixes ou crustáceos, é importante realizar uma investigação dos casos nas regiões. “É importante que seja feita a investigação dos casos de forma cuidadosa pelos setores de vigilância sanitária e epidemiológica porque existem outras patologias que dão quadros semelhantes ao da doença da urina preta”, informa.
O infectologista também complementa que esse tipo de recomendação deve ser analisada com cuidado, pois pode afetar a economia local e a cadeia alimentar das regiões. “Precisa ser feita uma análise muito cuidadosa e que leve em conta, principalmente, a confirmação dos casos e magnitude desses casos, por meio das taxas de incidência”, explica o membro da SBI. Antônio pontua que a suspensão só deve ocorrer após uma recomendação das secretarias da Saúde das regiões.
O presidente da Sociedade Cearense de Infectologia (SCI), o médico infectologista Guilherme Henn, também analisa a recomendação para o não consumo dos pescados em regiões com casos notificados da doença. Para ele, é difícil esse tipo de informação, pois os peixes e frutos do mar fazem parte da dieta e trabalho do brasileiro. “Há pessoas que dependem da pesca para viver economicamente e para se alimentar. É difícil realizar uma recomendação dessa. No geral, a gente orienta que as pessoas que vão comprar peixes ou crustáceos procurem comprar de um local que conheçam”, explica.
Outra orientação do infectologista é de que o consumidor tente procurar pescados onde há um selo de registro de que aquele produto foi inspecionado pelo Ministério da Agricultura. Segundo ele, quando a embalagem tem esse selo, significa que se conhece toda a cadeia de produção daquele alimento.
O presidente da SCI ressalta que a população deve aguardar as recomendações das secretarias da Saúde de cada região sobre o consumo dos pescados. “As secretarias são porta-vozes do órgão máximo de vigilância epidemiológica, e assim elas são responsáveis por repassar as informações para a população”, pontua Guilherme.
Post que viralizou no WhatsApp é de Santarém
No último sábado, 11, o médico da cidade de Santarém, Mario Roberto Albuquerque, publicou nas redes sociais que o consumo dos peixes citados e crustáceos, como lagosta, lagostim e camarão, deve ser evitado temporariamente devido aos casos notificados da Síndrome de Haff. O post viralizou no WhatsApp, inclusive entre usuários do Ceará, onde não se aplica. “É uma questão de consciência entre colegas de profissão, e isso deve ser orientado apenas nos locais onde há casos relatados de doença de Haff”, explicou Mário ao O POVO sobre a recomendação.
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Ainda conforme o médico, a orientação está sendo individualizada em cada estado e cada município, mas há uma recomendação entre colegas de que, onde houver casos relatados de doença de Haff, deve ser evitado o consumo das espécies que estão associadas à doença. Mário também reforça que, onde houver casos suspeitos da doença, cada secretaria da saúde vai realizar as recomendações adequadas para a população.
Em Santarém, a Prefeitura do município decretou a proibição temporariamente da venda dos peixes tambaqui, pirapitinga e pacu vindos do Amazonas desde o último sábado, 11. O documento com a medida foi publicado em decreto no dia 10 de setembro. Na região, quatro casos foram notificados e estão sendo monitorados pela secretaria municipal de saúde.
Casos no Ceará
No Ceará, nove casos suspeitos foram registrados, sendo seis em julho e três em agosto, e estão sendo monitorados pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa). A suspeita da doença está em quatro homens e em cinco mulheres. Do total, oito precisaram de internação hospitalar, e um foi acompanhado em ambulatório. Dois pacientes necessitaram de cuidados na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), uma mulher de 24 anos e um homem de 81 anos. Nenhum dos pacientes evoluiu para forma grave ou chegaram ao óbito.
A Sesa publicou uma nota técnica nessa quarta-feira, 15, para alertar sobre a Síndrome de Haff. A pasta orienta que os profissionais de saúde devem ficar atentos aos pacientes que relatarem dor e rigidez no sistema muscular, dificuldade de andar, falta de ar, perda de forças, dor no estômago, dormência, diarreia e mudança na tonalidade da urina, principais sintomas da doença. Não há proibição do consumo dos pescados e crustáceos pela secretaria do Estado.
A orientadora da Célula de Informação e Respostas às Emergências em Saúde Pública da Sesa, Sheila Santiago, indica que é importante, ainda, investigar se houve consumo de crustáceos e pescados em casos suspeitos. “A toxina encontrada nos animais pode ser advinda de algumas espécies de algas marinhas que servem de alimento para os peixes e crustáceos”, informa.
Conforme a pasta, as notificações de casos/surtos para a síndrome de Haff devem ser registradas no Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (Cievs) da Sesa. O alerta deve ser feito por e-mail: cievsceara@gmail.com ou pelo telefone: (85) 3101.4860 / (85) 98724.0455 em dias úteis, fins de semana e feriados. O aviso pode ser feito ainda ao município de Fortaleza nos telefones (85) 3452.6989 e (85) 98868.9893.
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