90% dos casos de violência contra mulheres atendidos pela Defensoria Pública ocorrem dentro de casa

Os números da violência doméstica são ainda maiores. No período entre 19 de março, início do isolamento, até o dia 30 de abril, foram 288 casos.

14:45 | Mai. 04, 2020

Por: Angélica Feitosa

O contexto de reclusão social imposto pela pandemia do coronavírus tem submetido às vítimas de violência doméstica a uma dupla situação: o maior contato com o agressor aumenta a exposição aos ataques e a reclusão diminui a possibilidade de denúncia. Este ano, entre os dias 19 de março, início do isolamento social decretado pelo governador Camilo Santana e o dia 30 de abril, 288 casos de violência doméstica foram atendidos pela Defensoria Pública do Ceará.

Os números de agressões, no entanto, são bem maiores, de acordo com a defensora pública e supervisora do Núcleo de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (Nudem), Jeritza Braga. De acordo ela, cerca de 90% dos casos foram de agressão foram cometidos por cônjuge, companheiro, ex-companheiro, namorados ou ex-namorado dentro de casa.

“Uma coisa é o aumento da violência e outra é o registro dela. As mulheres estão tendo dificuldades de fazer a denúncia porque antes elas conseguiam sair de casa para fazer o B.O. (boletim de ocorrência) e ir até a defensoria”, aponta a supervisora. Segundo ela, agora existe a dificuldade de ela sair do lar e, com o fechamento da Casa da Mulher Brasileira por conta da pandemia e o fato de o número do telefone fixo da defensoria ter mudado, ampliou ainda mais os impedimentos para os registros de agressões.

Perfil

O perfil do agressor já havia sido identificado em pesquisas anteriores feitas pelo Núcleo. As  vítimas recorrentes são mulheres em idade adulta, entre 36 a 45 anos, e com filhos vivenciando rotinas de agressão. Na pesquisa realizada em 2019 mostrou que são os ex-companheiros e os cônjuges, com 47% e 36% respectivamente, os responsáveis pela agressão.

Isolamento social 

Ao praticar o distanciamento social como medida necessária de prevenção à Covid-19, mulheres passam a conviver de forma ininterrupta com os companheiros e expõem-se ainda mais à opressão e à violência. A casa se torna também um ambiente perigoso e a quarentena dificulta ainda mais a denúncia. Por isso, o silenciamento dessas mulheres precisa ser debatido. Familiares, colegas de trabalho, amigos, atendentes de serviços essenciais e vizinhos: prestem atenção nas mulheres em sua volta.

Mesmo antes da existência da Covid-19, a violência doméstica já era uma das maiores violações dos direitos humanos do mundo. Nos 12 meses anteriores à pandemia, 243 milhões de mulheres e meninas (de 15 a 49 anos) foram submetidas à violência sexual ou física por um parceiro íntimo em todo o Mundo. Outro estudo, realizado pelo Instituto de Pesquisa DataSenado em parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência, mostra que cerca de 24% das vítimas convivem com o agressor, 34% dependem dele economicamente e 31% das entrevistadas afirmaram não ter feito nada em relação a última violência sofrida.