As lutas e as vivências dos surdos no Ceará
Apesar das dificuldades que surdos ainda enfrentam, existem leis que buscam garantir a acessibilidade para pessoas com essa deficiênciaO Dia Nacional dos Surdos, celebrado anualmente no dia 26 de setembro, foi criado para promover a reflexão sobre os direitos dos surdos na sociedade brasileira.
“Nós somos iguais aos ouvintes, só não escutamos”, afirma a professora Germana Maria de Araújo, 33, por meio de um intérprete. Atualmente, é uma das duas únicas pessoas surdas concursadas na rede estadual de ensino do Ceará.
Desde quando ainda estava na infância, sua vida perpassa o Instituto Cearense de Educação dos Surdos (Ices). Começou como aluna e, há oito anos, é professora na escola pública. Ela reconhece que, além da oportunidade que teve, “é necessário ter muito mais concursos. Precisamos do estudo da língua de sinais no interior, na região metropolitana”.
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AssineAssim que saiu da escola, decidiu trabalhar em uma empresa no ramo da indústria têxtil. Sua comunicação era, porém, apenas o básico, com gestos que ela e os ouvintes entenderiam. “Essa questão é algo que a gente passa desde criança e vai moldando para conseguir sobreviver”, relata.
Porém, após perceber que não era o que queria, decidiu cursar Letras - Libras, na Universidade Federal do Ceará (UFC), onde também foi uma das primeiras alunas surdas. Essa escolha não agradou sua mãe, que tinha medo dos preconceitos que a filha enfrentaria durante sua vida. Hoje, “minha família acredita e confia muito em mim”.
A história de Germana é uma entre os mais de 10 milhões de brasileiros surdos, segundo dados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Por isso, o Dia Nacional dos Surdos é um símbolo dessa busca diária pela inclusão da comunidade no país.
Entre as diversas conquistas, uma das principais foi a lei que reconhece a Língua Brasileira de Sinais - Libras como um meio de comunicação legal em todo território nacional. Porém, mesmo com essas normas, as pessoas surdas ainda enfrentam diversas problemas.
De acordo com a coordenadora do Ices, Joseane Nunes Aguiar, a lei foi importante porque, agora, a comunidade tem normas que pode procurar. “Mas em relação à prática, ainda é muito difícil”, afirma. Segundo ela, “eles (os lugares) dizem que têm acessibilidade, mas não existe a estrutura”. A coordenadora ainda cita situações comuns que geram muitos obstáculos para os surdos, como ir em órgãos públicos.
“Minha maior dificuldade é o atendimento médico”, afirma a professora Germana Maria de Araújo. Para ela, o incômodo de depender de alguém para conseguir se comunicar com um profissional da rede de saúde é enorme. “Como os médicos têm um cargo de nível, um status tão alto, e não sabem falar com uma pessoa?”, questiona.
Essa situação da saúde também é reforçada pelo intérprete e professor de Letras - Libras do Instituto Federal do Ceará (IFCE), Bruno Carioca, 27. O profissional, que atua como voluntário na Associação de Surdos Organizados de Fortaleza, informa que as principais demandas por intérpretes são para atendimentos médicos e também processos jurídicos.
Outra situação que Carioca explicita é a falta de compreensão da família sobre seus parentes com deficiência. Por isso, a associação promove um bate papo, o “Café com Libras”, porque “às vezes, os pais não têm acesso à cultura da comunidade”. Assim, é uma forma de incentivar a discussão e o conhecimento entre as pessoas da sociedade civil.
Esse mesmo problema foi identificado também pela coordenadora Joseane Nunes. Dessa forma, a escola também investe em projetos para melhorar a comunicação, principalmente, entre pais e filhos.
Joseane acredita que, para que os surdos tenham inclusão, é necessário “um trabalho formiga, uma ou duas pessoas que tenham conhecimento de Libras em todos os lugares”. Já Germana afirma que “tem que ser uma questão obrigatória, porque nós vivemos aqui. A nossa língua é essa (Libras)”.
O que dizem as leis
Apesar das dificuldades que surdos ainda enfrentam, existem leis que buscam garantir a acessibilidade para pessoas com essa deficiência.
Confira:
Em 1989, foi implementada a LEI Nº 7.853 que dispõe sobre a integração social de pessoas com deficiência. Entre as principais normas, estão:
- Na área da educação, garante a inclusão da Educação Especial em estabelecimentos públicos de ensino, além da inserção em escolas especiais, públicas e privadas.
- Na área da saúde, assegura o acesso e o adequado tratamento nos estabelecimentos de saúde públicos e privados.
- Na área de trabalho, o Poder Público deve apoiar a formação profissional, além criar e manter empregos aos deficientes que não tenham acesso aos emprego comuns.
Em 2000, foi sancionada a LEI No 10.098 que estabelece normas para diminuir as barreiras enfrentadas pelas pessoas com deficiência. Nela, foram estabelecidos que:
- Todos os locais de espetáculo, aulas, etc. de edifícios públicos ou de uso coletivo devem garantir lugares específicos para pessoas surdas e seu acompanhante.
- O Poder Público promoverá a eliminação de barreiras na comunicação ao implementar alternativas para torná-la acessível, além de formar profissionais intérpretes.
- Os serviços de radiodifusão devem adotar medidas para a utilização da linguagem de sinais ou outra forma de subtitulação.
Em 2002, foi implementada a LEI Nº 10.436 que dispõe sobre as Libras. Ela garante que:
- A Língua Brasileira de Sinais é reconhecida como um meio de comunicação legal em todo o país.
- O Poder Público e todas as empresas concessionárias de serviços públicos devem apoiar o uso e a difusão das Libras, além de assegurar atendimento e tratamento adequado às pessoas surdas.
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