Racismo: entenda quais são os tipos e as consequências
14:12 | Mai. 31, 2023
O racismo é uma ideologia baseada na crença de que algumas raças, etnias ou até características físicas são superiores a outras. Previsto como crime pela Lei 7.716/89, que pune todo tipo de discriminação ou preconceito, o ato é composto por diversos aspectos e, mesmo sendo passível de punição, ainda é muito presente no Brasil.
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), entre 2018 e 2021, os casos de racismo saltaram de 1.429 para 6.003, representando um aumento de 31%. Levando em conta que uma das manifestações mais cruéis do racismo é revelada através da violência, é de se considerar dados como esses preocupantes, principalmente quando as diferentes faces do racismo ainda são desconhecidas e muitas vezes negadas.
“Ao negar a realidade do racismo, essas pessoas contribuem para a perpetuação das práticas discriminatórias. A negação do racismo impede o reconhecimento e o enfrentamento das desigualdades raciais, permitindo que a discriminação continue a ocorrer impunemente. É fundamental enfrentarmos essa negação e promovermos a conscientização sobre a existência e os impactos do racismo, a fim de construir uma sociedade mais justa e igualitária”, diz Simone Santos, mestre em educação, escritora e mentora de mulheres.
Para elucidar o assunto, Simone Santos, a advogada Andrea Peres e a psicóloga Renata Tavolaro explicam quais são os tipos de racismo e como agir diante da situação. Veja!
Tipos de racismo
O racismo pode ser dividido em diferentes categorias, pois, sendo um ato baseado na convicção de predominância, é cometido em diversas situações, como:
Racismo institucional
O racismo institucional consiste na prática de atos discriminatórios dentro de uma instituição ou sistema, como escolas, trabalho e órgãos públicos, que resulta em um tratamento desigual com base na raça ou etnia das pessoas. “Esse tipo de racismo pode resultar em disparidade sistemáticas de oportunidades, acesso a recursos e tratamento injusto com base na raça”, diz a advogada feminista e especialista em Direito da Família Andrea Peres.
Racismo estrutural
Semelhantemente ao racismo institucional, o racismo estrutural refere-se a padrões sociais e políticos, nos quais as desigualdades sociais são perpetuadas nas práticas cotidianas, conforme explica a advogada Andrea Peres. “Isso pode incluir a segregação residencial, a segregação racial nas escolas, as disparidades no sistema de justiça criminal e a falta de representatividade racial em posições de poder”.
Racismo individual
Este é um dos tipos mais conhecidos de racismo. Atitudes, crenças e comportamentos são direcionados diretamente a uma pessoa em específico, incluindo comentários, ofensas, exclusão e violência física e verbal, o que pode causar efeitos prejudiciais duradouros na saúde mental das pessoas que são alvo dele.
Racismo internalizado
Apesar de ser pouco discutido, esse tipo de racismo é mais frequente do que se imagina, sobretudo considerando os demais tipos de racismo que uma pessoa pode sofrer. Isso porque, nessa categoria, as atitudes e as crenças preconceituosas são, como o próprio nome diz, internalizadas por membros de grupos racializados, que não aceitam a si mesmos ou a membros de seu próprio grupo.
Racismo ambiental
Para Renata Tavolaro, head em psicologia da Orienteme, esse tipo de racismo é detectado quando pessoas que vivem em regiões periféricas não recebem a mesma atenção daquelas que vivem em áreas central. “Um exemplo disso são as desapropriações realizadas de maneira arbitrária para dar lugar às represas ou instalações de eventos esportivos”, expõe a psicóloga.
Racismo recreativo
Principal assunto abordado no livro do escritor Adilson Moreira, o racismo recreativo, apesar de ser pouco conhecido, é um dos mais cometidos no entretenimento e comemorações do dia a dia. Isso porque, nele, características e costumes raciais são empregados de forma pejorativa, reforçando estereótipos e preconceitos.
“Essas formas de entretenimento podem incluir, por exemplo, festas temáticas que reforçam estereótipos raciais, fantasias raciais ofensivas em festas de Halloween ou práticas culturais apropriativas que desrespeitam a cultura de determinado grupo étnico. Essas ações podem parecer ‘recreativas’ para algumas pessoas, mas são prejudiciais e contribuem para a perpetuação do racismo e da discriminação racial”, conta Simone Santos.
Racismo cultural e comunitário
O racismo cultural, assim como o comunitário, está ligado à ideia de superioridade de um grupo. A diferença é que o primeiro é baseado na linguagem, nas crenças religiosas e nos costumes de um coletivo, enquanto o segundo privilegia a comunidade.
“Ele torna-se racista à medida que sempre privilegia a sua comunidade em detrimento de outra. Como consequência, o racismo comunitarista se dirige a um grupo como uma aldeia indígena, uma comunidade quilombola, e não só aos indivíduos específicos”, explica a psicóloga Renata Tavolaro.
Diferenças entre racismo, injúria racial e discriminação
Conforme explica a advogada Andrea Peres, a injúria racial é prevista como crime no artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal, e consiste em atos que ofendem a honra de alguém com base na raça, cor, etnia ou religião, diferentemente do racismo, que aplica-se na superioridade de grupos com base na raça. “A injúria racial é uma forma de agressão verbal ou gestual direcionada a uma pessoa específica, com o intuito de ofender sua dignidade em relação a sua raça ou [às suas] características físicas”, explica a especialista.
Por sua vez, a discriminação trata-se de um termo mais amplo, mas ligada aos mesmos motivos que a injúria, e é pautada no tratamento injusto e diferente a um grupo ou pessoa. “Pode ocorrer tanto de forma individual quanto institucional, envolvendo a negação de direitos, oportunidades e tratamento igualitário. A discriminação pode ser manifestada em diferentes contextos, como educação, emprego, moradia, serviços públicos, entre outros”, relata a advogada.
Passo a passo para denunciar o racismo
Denunciar situações como essas é fundamental para combatê-las e encorajar outras pessoas a fazerem o mesmo. Para isso, Andrea Peres explica que devem ser tomadas as seguintes atitudes:
- Registro da ocorrência: em casos de injúria racial, é importante registrar um boletim de ocorrência em uma delegacia de polícia. Relate os detalhes do incidente e forneça o máximo de informações possível. Certifique-se também de obter uma cópia do boletim de ocorrência após o registro;
- Provas: se possível, reúna evidências do ocorrido. Essas provas podem fortalecer sua denúncia e ajudar nas investigações;
- Denúncia aos órgãos competentes: é recomendável também fazer a denúncia aos órgãos competentes, como a Delegacia de Polícia especializada em crimes raciais e delitos de intolerância e a Polícia Civil local. “Também é possível buscar o auxílio de órgãos como o Ministério Público, a Defensoria Pública e a Comissão de Direitos Humanos”, informa a especialista;
- Denúncia online: algumas instituições disponibilizam a possibilidade de realizar denúncias online, mas é necessário verificar a oferta no seu estado ou município;
- Apoio de organizações: buscar o apoio de organizações e grupos que lidam com questões raciais e direitos humanos é essencial, pois eles oferecem orientação, suporte emocional, encaminhamento para serviços jurídicos e auxílio no processo de denúncia.
Importância do acolhimento
De acordo com a psicóloga Renata Tavolaro, o racismo é uma atitude que afeta diretamente a autoestima e a autoconfiança das vítimas, podendo gerar ansiedade e outros problemas emocionais. Isso porque a ideia de não pertencimento é extremamente prejudicial à saúde, já que o sentimento de companheirismo é fundamental para o convívio social entre os pares.
“A base [para ajudar as vítimas de racismo] é o acolhimento, o respeito e o não julgamento. Precisamos entender que todos somos iguais, independentemente de nossa etnia, raça ou cor”, diz a médica, que completa explicando a importância da assistência psicológica nessas situações. “Os profissionais de psicologia podem ajudar principalmente no acolhimento da pessoa, tendo como objetivo o bem-estar, elevar a autoestima, trabalhando as questões relacionadas, como ansiedade, estresse, depressão ou outras questões emocionais”.
Como ajudar a combater o racismo?
O combate ao racismo é um trabalho constante que exige atenção a atitudes e práticas diárias, mas sobretudo estudo e conhecimento sobre o assunto. Nesse sentido, a advogada Andrea Peres lista o que pode ser feito:
- Eduque-se: busque conhecimento sobre o racismo, suas raízes históricas, seus impactos na sociedade e os mecanismos de privilégios. Isso ajudará a compreender melhor as experiências e desafios enfrentados por pessoas racializadas;
- Escute e acredite: ofereça espaço para as vozes das pessoas que vivenciam o racismo. Escute suas experiências, histórias e perspectivas. Acredite nelas e não minimize ou desvalorize suas vivências;
- Combata o racismo cotidianamente: esteja atento aos comportamentos e comentários discriminatórios no seu ambiente cotidiano. Desafie essas atitudes e estereótipos racistas, promovendo uma cultura de respeito e igualdade;
- Seja um aliado ativo: utilize sua posição e privilégio para defender a igualdade racial. Interrompa conversas ou situações racistas, não seja conivente com piadas ou comentários ofensivos;
- Apoie iniciativas antirracistas: engaje-se em ações e projetos que promovam a igualdade racial e apoie financeiramente organizações que trabalhem na promoção dos direitos humanos e no combate ao racismo;
- Reconheça seus próprios preconceitos e privilégios: esteja disposto a questionar e desconstruir suas próprias crenças e comportamentos racistas internalizados. Trabalhe constantemente para se tornar uma pessoa mais consciente e antirracista;
- Eduque outras pessoas: compartilhe o conhecimento e conscientize pessoas ao seu redor sobre a importância da igualdade racial e os impactos do racismo. Busque promover mudanças de mentalidade e comportamento.