Entidades criticam proposta de eletrochoque para tratar autismo

A consulta pública do Ministério da Saúde visava o uso da eletroconvulsoterapia como ferramenta terapêutica para pessoas autistas

21:52 | Dez. 19, 2021

Por: Ana Flávia Marques
PREPARAÇÃO de um paciente em uma sessão de eletroconvulsoterapia (foto: DIVULGAÇÃO)

Após o Ministério da Saúde, através da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias), propor o uso de eletroconvulsoterapia (ECT), mais conhecida como eletrochoque, para tratar pacientes do espectro autista, mais de 50 entidades e grupos das áreas da psiquiatria, psicologia e direitos humanos publicaram uma nota de protesto. O documento argumenta que o protocolo apresenta “estudos de valor científico muito precários".

A técnica defendida pela Conitec consiste em utilizar uma corrente elétrica para produzir uma convulsão generalizada e deve ser feita sob anestesia geral. No entanto, as entidades que assinaram a nota questionaram o método, ressaltando que ele viola a Convenção dos Direitos Humanos e é considerado como tortura pela Organização das Nações Unidas (ONU)

"As referências bibliográficas apresentadas no protocolo do Ministério da Saúde apontam para as situações de catatonia (caso em que psiquiatria argumenta que há evidências científicas para o seu uso) e estudos de valor científico precário. Das 17 citações para fundamentar o procedimento, nenhuma delas se dirige à questão central do documento que é o comportamento agressivo", afirmam.

As entidades também questionaram as críticas feitas à imprensa sobre a luta antimanicomial, já que no passado a ECT foi associada a torturas e abusos cometidos por profissionais de hospitais psiquiátricos.

“O documento ainda ousa afirmar que uma cobertura midiática inadequada durante a luta antimanicomial e relatos de pacientes que foram submetidos a essa técnica sem uma indicação adequada ou até de maneira punitiva [...] estigmatizaram o uso da ECT. Os ataques à imprensa também têm sido parte da engrenagem bolsonarista de uma escalada fascista com reprodução dos mecanismos necropolíticos e de silenciamento e opressão de minorias e grupos sensíveis, como negros, pessoas com deficiência, usuários da Saúde Mental”, diz o texto.

"Enquanto pessoas ao redor do mundo lutam pela emancipação de pessoas com grande sobrecarga emocional, as correntes físicas e as amarras estão sendo substituídas por contenções químicas e vigilância ativa. O olhar do Estado e o investimento em recursos continuam ainda nesse foco limitado de controle do indivíduo com 'necessidade médica', a qual é geralmente invocada como a base para justificar tal controle", afirmaram.

"Dessa forma, exigimos a retirada desta versão do documento da consulta pública, visto que a inserção da eletroconvulsoterapia como ferramenta terapêutica para pessoas autistas viola princípios éticos e científicos e coloca em risco ainda maior autistas em situação de vulnerabilidade ligada à persistência de barreiras e às adversidades socioeconômicas. A inserção do tema no documento se deu por mera pressão e opinião de especialistas e não levou em consideração a participação de autistas na sua formulação, o que viola a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD)", destacaram.

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