Enem 2020: Ceará tem quarta maior taxa de abstenção no Nordeste
Mais de 154 mil estudantes cearenses faltaram ao primeiro dia do prova no último domingo, 17. Medo de contaminação pelo novo coronavírus foi principal fator.
15:36 | Jan. 18, 2021
Em meio à pandemia, a agitada realização do Enem 2020 no Ceará contou com um pouco mais da metade dos participantes inscritos no exame. De 322.583 inscritos no Ceará, 154.545 (47,9%) faltaram ao primeiro dia de prova no último domingo, 17. Na taxa de abstenção do dia, o Estado fica abaixo do percentual nacional de ausentes de 51,5% — em 2019, foi de 23,1% — e ocupa a quarta maior abstenção entre os estados nordestinos.
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Entre os estados nordestinos, a Bahia teve a maior abstenção da região (51%), seguido do Maranhão (49,2%), Pernambuco (48,4%), Ceará (47,9%), Piauí (47.4%), Rio Grande do Norte (46,9%), Alagoas (46,4%), Sergipe (46,2%) e Pernambuco (44,9%).
Professor na Universidade Estadual do Ceará (Uece) e especialista em políticas públicas educacionais, Idevaldo Bodião avalia que o índice de abstenção é preocupante. "São mais de 150 mil adolescentes que tinham a expectativa de poder fazer um curso superior em 2021. O Enem é uma porta de entrada paras instituições federais, o Prouni, o Fies - então esses mais de 150 mil alunos tem sua porta fechada", pontua. "Foi um ano de 2020 escolarmente perdido e 2021 já está parcialmente perdido como um ano de estudo no ensino superior".
Ainda com o alto índice, 168.038 estudantes (52,1%) realizaram a prova no domingo. O Estado ultrapassou a média nacional de presentes apresentadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), cerca de 48,5%. Os números nacionais são preliminares e não incluem os dados do Amazonas e de dois municípios de Rondônia. A capital de Manaus não teve realização do exame no domingo devido ao colapso da saúde pública.
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Em ano de aulas remotas, Bodião avalia o aproveitamento do ensino híbrido para os estudantes de ensino médio como como falho. "A informação está disponível, mas apenas a escola te permite o aprendizado e o estímulo do pensamento. Isso é moderno, mas está obstacularizado devido às ferramentas digitais", explica. A escola, um espaço que antes era tido de diálogo acaba perdendo sua função com as aulas expositivas — modelos em que os professores apresentam o conteúdo e buscam outros meios de interação com os alunos, como as plataformas Google Meet e WhatsApp e não tão eficiente quanto o presencial, na visão do pedagogo.
O professor acompanhou a rotina de estudantes de um cursinho popular do bairro Serrinha para a realização da prova: além da pressão de "decisão do futuro através de uma prova" e da desigualdade social em meio aos milhares e milhões de alunos e alunas, há o medo da contaminação por parte dos estudantes. "Temos um aspecto que ainda não tratamos: todos os estudantes que estavam para valer no exame foram em um grau de insegurança muito grande porque todos acham que não haviam se preparado corretamente. O que estão corretos".
Ainda, aponta para um negacionismo em relação à pandemia por parte do Governo Federal. "Aquele que for ligeiramente bem, terá uma oportunidade enorme por ter se mantido pedagogicamente vivo, estudando", explica. Para o futuro, uma reorganização curricular pode ser uma das alternativas para recuperar o ano letivo. "Não houve ano escolar digno de nome em 2020. Ainda que o aluno tenha passado de ano, ele ficará com uma lacuna grande em termos de aprendizagem: isso para quem tem computador e possibilidade de acesso às ferramentas digitais de ensino", cita.
Um total de 5.523.029 pessoas se inscreveram no Enem no Brasil. Compareceram para prestar a prova 2.680.697 candidatos, cerca de 48,5%. Além disso, 2.967 participantes foram eliminados e outros 69 prejudicados por ocorrências logísticas.
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A realização do exame presencial segue até o próximo domingo, 24, em meio a mobilizações de estudantes e pedagogos como o #AdiaEnem e sob o aumento de casos do novo coronavírus no País. Ainda há a versão digital do exame, nos próximos dias 31 de janeiro e 7 de fevereiro.
Responsável pela aplicação do Enem, o Instituto (Inep) chegou a abrir uma enquete online no qual os estudantes opinariam sobre os dias das provas. O mês de maio foi o mais escolhido pelos inscritos e inscritas, entretanto, o Enem segue sendo realizado neste mês de janeiro e em fevereiro.
O POVO solicitou posicionamento ao Inep sobre a taxa de abstenção, que reforçou a coletiva de imprensa na noite de ontem. Após a prova, Milton Ribeiro admitiu que o nível de abstenção foi "significativo" e colocou parte da culpa pela "dureza e a questão do medo da contaminação, parte por um trabalho de mídia contrário ao Enem". A reportagem questionou se diante da alta taxa de abstenção alguma logística da prova seria alterada, o que ainda não foi informado pelo órgão.