Conheça o esperanto, língua planejada mais falada do mundo

Idioma internacional agrega até milhões de adeptos ao redor do mundo. Fortaleza sediará neste sábado, 28, o Exame Internacional da Língua Esperanto pela primeira vez

Considerado um idioma mais simples e rápido de aprender que a maioria, o esperanto foi criado em 1887 pelo médico polonês e judeu Luís Lázaro Zamenhof. Apesar de ser a língua planejada mais falada do mundo, ainda encontra obstáculos geopolíticos para alcançar seu propósito de internacionalização baseado na ideia de fraternidade. Neste sábado, 28, Fortaleza receberá o Exame Internacional da Língua Esperanto, realizado simultaneamente em nove países.

O conceito de língua planejada tem a ver com o fato de o idioma ter sido definido, em vez de ter evoluído como parte da cultura de algum povo. Estimativas da Associação Universal de Esperanto (UEA) indicam que o número de pessoas com algum conhecimento da língua esteja em centenas de milhares ou até milhões.

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O professor universitário Saulo Esteves, 35, se interessou no esperanto ainda em 2015 por curiosidade. “Comecei a estudar pela internet, depois na Casa de Cultura da UFC (Universidade Federal do Ceará), mas não me dedicava muito e o aprendizado foi pequeno. Na pandemia, me interessei novamente. Praticamente tudo que aprendi foi agora durante a pandemia”, relata.

Em poucos meses, Saulo acredita ter alcançado um nível avançado de compreensão do idioma. “O esperanto é fácil de aprender, mas algumas composições gramaticais são diferentes e não existem no português, mas nada muito complicado. O que é mais complicado no esperanto é bem simples se comparado às outras línguas cheias de exceções e problemas”, opina.

Para Saulo, outra vantagem do esperanto é a regularidade da língua, que possui 16 regras fundamentais, sem exceções. Ele atribui sua evolução rápida no idioma às aulas online com um professor designado pela Associação Cearense de Esperanto (CEA – Cearaa Esperanto-Asocio), Roberto Albuquerque.

Roberto, que também é diretor da Associação, aponta que uma das maiores facilidades do esperanto é que se fala justamente o que está escrito. “No esperanto não há uma letra com vários sons. Cada letra produz um som e a gramática não tem exceções, é muito enxuta. Todos os substantivos terminam com a letra ‘O’ e todos os adjetivos com a ‘A’”, exemplifica.

De acordo com Roberto, geralmente em três ou quatro meses de estudo já é possível que alguém chegue a bons níveis de compreensão e pronúncia da língua, mas essa estimativa depende também do tempo que cada aluno se dedica. Ele destaca que a internet proporciona materiais interessantes para quem se interessa pelo idioma.

Características do esperanto

O esperanto é uma língua planejada com base no latim, mas incorpora elementos eslavos, franceses, portugueses e germânicos. O idioma é falado como está escrito. Seu léxico provém principalmente das línguas da Europa Ocidental, enquanto sua sintaxe e morfologia mostram fortes influências eslavas.

Conforme atesta a Associação Universal de Esperanto (UEA), os morfemas do esperanto são invariáveis e quase infinitamente combináveis em palavras diferentes, de modo que a língua também tem afinidades com línguas isoladas como o chinês. Já sua estrutura vocabular apresenta semelhanças com línguas aglutinantes como o turco, o swahili e o japonês.

 

Primeiramente, o esperanto consistia de cerca de 1.000 radicais, dos quais podiam derivar-se 10 mil ou 12 mil palavras. Hoje os dicionários de esperanto costumam ter entre 15 mil e 20 mil radicais, a partir dos quais é possível formar centenas de milhares de palavras, e a língua está em constante evolução.

A UEA tem associações nacionais em 62 países e sócios individuais em quase o dobro disto. Existem falantes de esperanto no mundo todo, com notáveis concentrações em países tão diversos como China, Japão, Brasil, Irã, Madagascar, Bulgária e Cuba. Além disso, é possível que existam hoje aproximadamente 1 mil falantes que têm o esperanto como língua materna.


Resistência do esperanto ao longo da história

Em sua essência, o esperanto não busca substituir línguas nacionais, mas sim servir como uma segunda língua. O idioma chegou a ser perseguido pela sua essência e seu autor, mas resiste ao longo do tempo conectando pessoas ao redor do mundo.

Quando o médico polonês Lázaro Luís Zamenhof (1859-1917) lançou o livro denominado "Unua Libro de la Lingvo Internacia", ele tinha a pretensão de propor um idioma que rompesse fronteiras geopolíticas e disseminasse uma cultura internacional de paz entre as nações.

O nome original do esperanto é, portanto, "Lingvo Internacia", que melhor se traduz por "língua internacional". No entanto, para se proteger contra eventuais represálias Zamenhof usou o pseudônimo de "Doutor Esperanto" na publicação, que significa no idioma "aquele que tem esperança", e era assim que a língua viria a ser conhecida.

Nascido na cidade de Bialystok — na época pertencente ao império russo, mas atualmente território da Polônia —, Zamenhof viveu durante sua infância numa região marcada pela multiplicidade étnica e repleta de conflitos violentos em função da identidade linguística.

“Ele tem essa preocupação com uma humanização e ruptura de fronteiras a partir de um idioma que pudesse proporcionar uma comunicação de igual para igual”, descreve o professor do José Leite Júnior, do Departamento de Literatura e do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Leite Júnior também responde pela curadoria da Coleção Paulo Amorim Cardoso, do Acervo de Esperanto da UFC. O professor esperantista Paulo Amorim Cardoso dirigiu o Curso de Esperanto das Casas de Cultura da universidade por mais de duas décadas.

O docente menciona como um dos marcos na história do idioma o primeiro Congresso Universal de Esperanto (Universala Kongreso - UK, em esperanto), realizado em 1905 na França com representantes de todo o mundo. Ele também destaca a ação dos esperantistas na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), em que se construiu um escritório da Associação Universal de Esperanto (UEA), hoje com sede na Holanda.

“Houve um escritório na Suíça que intermediou a correspondência que era censurada entre esperantistas habitantes de países que estavam em luta. Foi uma possibilidade de atuação pacífica em pleno momento de deflagração de guerra no mundo”, conta.

Ainda de acordo com Leite Júnior, essa característica pacifista do idioma gerou grande identificação com movimentos sociais e com a classe trabalhadora. Isso foi uma das motivações para que seus praticantes fossem perseguidos por regimes totalitários, como o nazimo de Adolf Hitler, para quem o esperanto era “uma língua de judeus”, referência a Zamenhof que tinha origens judaicas.

 

Desafios para internacionalização

Na análise do professor José Leite Júnior, existem muitos obstáculos de natureza geopolítica que ainda impedem o esperanto de alcançar o objetivo de ser uma língua internacional. Ele menciona que o domínio da língua inglesa, por exemplo, se reflete em campos diversos, como político, econômico e cultural.

“Não é só a língua, existe toda uma indústria cultural e uma supremacia científica que não têm interesse em patrocinar [outro idioma]. As línguas precisam de um apoio oficial”, afirma.

Apesar das dificuldades, ele garante que o movimento esperantista se fortalece ao longo dos anos. “Existem redes de turismo espontâneo. É uma comunidade ativa e [o esperanto] não se enquadra na ideia de língua morta uma vez que uma quantidade de praticantes superior há muitas centenas de língua do mundo. É a língua planejada mais falada de todas”, finaliza.


Movimento esperantista no Ceará

Em Fortaleza, o esperanto está lembrado até no nome de uma rua do bairro Vila União, e além disso, há um busto do criador do idioma na praça da Gentilândia. Um dos maiores entusiastas do movimento esperantista no Estado foi Demócrito Rocha Dummar, fundador do O POVO, que ensinava esperanto e chegou a participar em algumas publicações esperantistas. Sua filha, Lúcia Dummar também foi esperantista e grande apoiadora do movimento.

“Tudo e todos evocavam a memória de Demócrito Rocha, largamente reverenciada naquele dia”, registra um documento do XV Congresso Brasileiro de Esperanto sobre a data de fundação da Associação Cearense de Esperanto (CEA – Cearaa Esperanto-Asocio), em 15 de março de 1945.

O movimento esperantista cearense ganhou ainda mais atenção com a criação do Curso de Esperanto, reconhecido pelo Conselho de Educação do Ceará desde 1965, e projeto de extensão de iniciativa da Coordenadoria Geral das Casas de Cultura da UFC à época da gestão do reitor Antônio Martins Filho.

A Associação trabalha hoje promovendo cursos, palestras, congressos anuais e preparando jovens para intercâmbios que possibilitam troca de experiências com outros esperantistas de outros países.

Uma vez por mês os praticantes se reúnem na sede localizada na Parquelândia. São cerca de cinquenta frequentadores mais assíduos. Porém, conforme o atual presidente Wandemberg Ribeiro, o número de pessoas que passaram pelo local desde sua criação é impossível de estimar.

“Sou muito suspeito para falar. No entanto, é voz nacional que o movimento esperantista cearense é um dos mais fortes no Brasil”, constata Wandemberg. O presidente avalia, porém, que ainda falta no Estado apoio para a formação de professores para atender a demanda de interessados em aprender o idioma

Ele também defende a viabilização do ensino de esperanto nas escolas na condição de língua estrangeira na parte diversificada do currículo escolar. “Temos lei para tal proposta pelo ex-senador Cristovam Buarque, também aprovada pela comissão de educação na Câmara Federal, aguardando ser colocada em pauta para votação”, reforça.

Exame Internacional em Fortaleza

Neste sábado, 28, ocorrerá outro marco do movimento esperantista em Fortaleza com a realização do Exame Internacional da Língua Esperanto. O evento está em sua nona edição e será realizado simultaneamente em cidades de nove países: Bélgica, Benim, Brasil, China, Equador, Japão, México, Rússia e Vietnã.

No Brasil, Maceió também aplicará o exame. No Ceará, 14 candidatos de três municípios estão inscritos. O exame é organizado pela Associação Universal de Esperanto e conta com o apoio, no Estado, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), do Iracema Coworking e da Associação Cearense de Esperanto. 

O exame possui ainda parceria com o Centro de Exame Linguístico da Universidade Eötvös Loránd, com sede na Hungria, e tem como base o Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas. A prova consiste das modalidades oral e escrita, sendo que o candidato pode escolher se fará ambas ou apenas uma delas. 


Marcos do movimento esperantista no Ceará


- Associação Esperantista Cearense é fundada em 15 de março de 1945, em sessão solene, à rua Major Facundo, 490, tendo como primeiro presidente o Sr. Fernando Bezerra Fernandes.

- Somente Brasília e Fortaleza realizaram um Congresso Universal de Esperanto (Universala Kongreso - UK, em esperanto), ocorrido em 2002 na capital cearense

- Fortaleza sediou um Congresso Internacional da Juventude esperantista em 2014. (Internacia Junulara Kongreso - IJK, em esperanto).

- Lei de 2015 facultando o ensino de esperanto em escolas públicas no município de Itaitinga, sancionada, não regulamentada ainda

- Criação do Curso de Esperanto, reconhecido pelo Conselho de Educação do Ceará desde 1965, que é projeto de extensão de iniciativa da Coordenadoria Geral das Casas de Cultura da UFC. A Resolução foi assinada pelo reitor Antônio Martins Filho.

- Perspectivas de um curso de esperanto promovido em parceria com o IFCE com previsão para 2021

 

Para aprender mais sobre esperanto no Ceará

Curso de Esperanto das Casas de Cultura da UFC

Onde: avenida da Universidade, 2683 – Benfica
Contato: (85) 3366 7606 / 3366 7607 e culturaestrangeira@ufc.br
Mais informações: acesse a página do curso https://casasdeculturaestrangeira.ufc.br/pt/curso-de-esperanto/

Kurso de Esperanto
Programa multimídia gratuito para aprendizado do esperanto, a língua internacional. O curso está disponível para Windows, Mac OsX e Linux. Confira mais informações aqui

“Programa MIA AMIKO”
Une os interessados em aprender esperanto com amigos esperantistas possui um grupo no WhatsApp para trocar ideias e aprendizados. Saiba mais aqui.

 Associação Cearense de Esperanto (CEA – Cearaa Esperanto-Asocio)

Reúne uma vez por mês interessados no esperanto e oferece cursos, palestras e outras atividades.

Onde: rua Armando Oliveira, 413, Parquelândia.

Mais informações: Instagram (@esperantoceara) e Facebook 

 

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