"Quem tem jurisdição sobre escolas é Estado e Município. Não temos esse tipo de interferência", diz ministro da Educação
Milton Ribeiro afirmou também que o papel do MEC na volta às aulas será repassar recursos e divulgar um protocolo de segurança
13:53 | Set. 24, 2020
O ministro da Educação, Milton Ribeiro, reconhece que a pandemia de Covid-19 acentuou a desigualdade educacional no País, mas diz que este “não é um problema do MEC, mas um problema do Brasil”. Em entrevista ao jornal Estadão, ele afirmou também que "quem tem jurisdição sobre escolas é Estado e município", se referindo à questão da volta às aulas.
À frente do MEC há dois meses, Ribeiro declarou ainda que a função federal será repassar recursos e divulgar um protocolo de segurança. Segundo ele, o MEC não pode resolver a falta de acesso à internet de alunos que não conseguem acompanhar aulas online.
"A lei é clara. Quem tem jurisdição sobre escolas é Estado e município. Não temos esse tipo de interferência. Se eu começo a falar demais, dizem que estou querendo interferir; se eu fico calado, dizem que se sentem abandonados", alegou.
O pastor prebisteriano, que segue conduzindo cultos em Santos (SP) a cada 15 dias, afirmou ainda que recebeu do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) o desafio para melhorar ensino infantil e básico e promete mudanças em relação à educação sexual.
Segundo ele, muitas vezes a disciplina é usada para incentivar discussões de gênero. "E não é normal. A opção que você tem como adulto de ser um homossexual, eu respeito, não concordo", afirmou o ministro, que atribui a homossexualidade de jovens a "famílias desajustadas."
Escolhido para substituir o polêmico Abraham Weintraub, Ribeiro disse ter um estilo diferente e admite ter sido cobrado pelo presidente por ter recebido a deputada Tabata Amaral (PDT-SP), opositora ao governo, em seu gabinete. "Eu os receberei sempre. Não tem problema." Ele explicou, porém, que recebeu a Comissão Externa da Câmara (da qual Tabata faz parte), que acompanha o trabalho do MEC, e não a deputada em particular.
"O presidente não gosta, porque são muito críticos, para mim, de uma maneira totalmente desequilibrada, mas eu vou ouvi-los. A mídia conservadora estranhou o fato de tê-los recebido, mas eu não vou mudar. Respeito o antigo ministro (Weintraub), até pela maneira de fazer gestão, mas eu sou eu", ressaltou.
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Recursos para as escolas
Na entrevista, o ministro informou que foram remanejados R$ 525 milhões para as escolas públicas do País, que devem ser destinados a pagamentos de professores e estagiários.
"O diretor e sua equipe que vão manejar para comprar insumos, pequenos reparos, tudo para proporcionar que o aluno volte com segurança, incluindo máscaras. Vamos mandar para todas", assegurou.
Nesta semana, o ministro disse que seria publicado um protocolo de biossegurança para a escola básica, como já foi feito com universidades. Mas voltou a reiterar que a pasta não tem "o poder de determinar" sobre a volta às aulas.
"Por mim, voltava na semana passada, uma vez que já superamos alguns itens, saímos da crista da onda e temos de voltar. Mas essa volta deverá ser de acordo com os critérios de biossegurança", completou.
Desigualdade educacional
Em relação aos problemas de acesso às aulas remotas enfrentados por alunos de todo o País, Ribeiro alegou que o problema só foi evidenciado com a pandemia, e não causado por ela.
"Mas hoje, se você entrar numa escola, mesmo na pública, é um número muito pequeno que não tem o seu celular. É o Estado e o município que têm de cuidar disso aí. Nós não temos recurso para atender", considerou.
O ministro ainda acrescentou que esse "não é um problema do MEC, é um problema do Brasil" e que a sociedade brasileira é desigual e não é atribuição do MEC solucionar a questão.
Ensino superior, educação básica e material escolar
Sobre o foco no ensino superior no Brasil, o ministro da Educação avaliou que a "ambição sadia de ter um curso superior tem seu valor, mas em termos de política nacional é equivocado".
"Não adianta ter o diploma e não ter a expertise, o conhecimento. Vemos figuras que têm o curso, mas são incapazes, haja vista o número de reprovação na OAB", comentou.
Já acerca de planos para a educação básica, o ministro pontuou que pretende dar aos professores maior atenção. "Hoje ser um professor é ter quase que uma declaração de que a pessoa não conseguiu fazer outra coisa. Está na hora de parar de ter como protagonista somente o aluno, a infraestrutura, a comida, o assistencialismo, e a gente olhar com carinho maior para os professores."
Ribeiro também disse que pediu uma revisão no material didático escolar, ao ser perguntado sobre a retratação de períodos históricos, como a Ditadura Militar. Na visão do ministro, o movimento militar, na época, impediu "que o Brasil se tornasse uma Cuba".
"É uma grande injustiça julgar uma pessoa fora do seu tempo. Em 1964 [ano em que começou a Ditadura Militar no Brasil], sabemos hoje, o resultado de toda aquela guerra era para transformar países como Venezuela, Cuba e a própria Rússia, que depois se desmembrou. A história mostrou que eles estavam equivocados".
Educação sexual nas escolas
Ao abordar as diretrizes para a revisão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do ensino médio, a ser feita em 2023, o titular da Educação disse que o "Enem tem sido um balizador dos conteúdos que a gente requer, porque senão começa a falar lá de ideologia, sabe tudo sobre sexo, como colocar uma camisinha, tirar uma camisinha, sabe tudo."
Para Ribeiro, "as crianças têm de aprender outras coisas". Embora admita que a educação sexual pode proteger a criança de abusos sexuais, o ministro diz que há "o outro lado que é uma erotização das crianças".
"Tem vídeo que corre na internet das meninas aprendendo a colocar uma camisinha com a boca", indicou o ministro. De acordo com o Estadão, porém, o vídeo citado por Ribeiro foi gravado em uma universidade no interior da Bahia.
"É importante falar sobre como prevenir uma gravidez, mas não incentivar discussões de gênero. Quando o menino tiver 17, 18 anos, ele vai ter condição de optar. E não é normal. A biologia diz que não é normal a questão de gênero. A opção que você tem como adulto de ser um homossexual, eu respeito, não concordo", continuou o titular da Educação, mencionando ainda ter "certas reservas" quanto a professores transgêneros em sala de aula.