Socialismo e comunismo são iguais? Comunismo matou mais que nazismo? Entenda a discussão
Marx afirmou que o fantasma do comunismo rondava a Europa. Para muitos, também ronda o Brasil. Mas, afinal, o que é comunismo? É o mesmo que socialismo? EntendaEm seu Manifesto Comunista, de 1848, os alemães Karl Marx e Friedrich Engels apontam que as primeiras tentativas do proletariado de impor seus interesses à sociedade de classes “falharam necessariamente por não estar ainda desenvolvida a figura do próprio proletariado e por faltarem ainda as condições materiais da sua libertação - que só são precisamente o produto da época burguesa”.
Ao se referir, no século XIX, a classe, proletariado, burguesia, os teóricos lançam luz sobre alguns dos termos mais recorrentes em duas das ideologias mais discutidas e revisitadas do inventário humano, o comunismo e o socialismo. As duas são, sim, distintas, ainda que intrinsecamente ligadas. E a segunda antecede Marx em quase quatro séculos, sendo formulada, pela primeira vez, pelo britânico Thomas More em sua obra “Utopia”, de 1516.
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Nos séculos seguintes, nomes como Saint-Simon (1760-1820), Charles Fourier (1772-1837) e Robert Owen (1771-1858) também se debruçaram sobre a sociedade alternativa aventada por More, essencialmente utópico. Estes pensadores teorizaram então termos como a divisão de classes, sendo com predomínio do aspecto econômico. Para Saint-Simon, a sociedade era dividida entre “produtores” e “ociosos”, semente do proletariado (produtor) e burguesia (ocioso) mais tarde desenvolvidos na teoria marxista.
“De forma simplificada, é possível compreender o socialismo como o momento que antecede o comunismo, idealizado por Karl Marx”, explica a professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Socorro Osterne, mestre em sociologia. Ambos são considerados pelo alemão como superação do sistema capitalista, nascido das ruínas da sociedade feudal. Se, como preconizou no Manifesto Comunista, o proletariado, enquanto classe, carecia de forma fixa no feudalismo, após a Revolução Industrial na Inglaterra, entre os séculos XVIII e XIX, o grupo se consolidou em sua distinção e oposição à burguesia.
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Ainda que tenha sido discutido por pelo menos quatro séculos, a primeira experiência de governo proletário foi somente em 1871, a chamada Comuna de Paris. Após a derrota da França para o Reino da Prússia e a assinatura de um acordo favorável aos prussianos, um grupo de operários franceses tomou a capital e instalou um governo composto diferentes segmentos socialistas, que propôs uma série de medidas trabalhistas, como salário-mínimo, ensino gratuito e redução da jornada de trabalho. Ao fim de 72 dias, a Comuna foi derrotada. Quase 50 anos, estourava em terras eslavas a Revolução Russa, em 1917.
Mas, afinal, o que caracteriza o socialismo? E o que caracteriza o comunismo? Confira um resumo a seguir
A teoria desenvolvida por Marx e Engels é chamada socialismo e comunismo científico, também conhecida por marxismo. Neste modelo, pode-se entender as duas ideologias como estágios de uma mesma ideia, a superação do capitalismo. Primeiro, nasce a sociedade socialista, posteriormente vertida em uma sociedade comunista. “O comunismo seria a materialização dos ideais socialistas, onde existe um governo formado pela classe trabalhadora a quem compete o poder de decisão sobre a vida do sistema”, explica Socorro Osterne. Veja as diferenças:
Economia
Socialismo: sistema econômico empenhado em alcançar a igualdade entre os membros de uma sociedade mantendo os bens de produção como bens coletivos, ou seja, sob tutela de empresas públicas ou cooperativas. Os indivíduos são pagos com base na contribuição individual.
Comunismo: sistema econômico que propõe uma sociedade sem classes, em que os meios de produção são de propriedade comum e os lucros/produção são divididos igualmente entre todos.
Política
Socialismo: propõe uma democracia participativa voltada aos interesses coletivos, em que um Estado e um governo continuam a moderar a vida social; coexiste com outros sistemas políticos.
Comunismo: alcançada a igualdade entre todos, a sociedade comunista torna-se apátrida, ou seja, sem uma nação; o Estado é abolido, não havendo mais necessidade de sua intervenção, e a sociedade se auto-regulamentaria, sem mecanismos de coerção social.
Religião
Socialismo: é desencorajada até ser abolida.
Comunismo: abolida.
Propriedade privada
Socialismo: convive com a propriedade privada, como roupas e casa; e propõe a propriedade coletiva dos meios de produção, administrados pelo Estado sob controle dos trabalhadores.
Comunismo: não há propriedade privada em nenhum formato; existem apenas os bens comuns, ou seja, de todos.
Correntes
É possível encontrar uma miríade de correntes dos pensamentos socialista e comunista. As diferenças são conceituais ou mesmo de metodologia (como instalar uma sociedade nesses moldes, pela via democrática ou pela força?).
Socialismo: socialismo libertário, socialismo científico, socialismo democrático, social-democracia.
Comunismo: marxismo, leninismo e marxismo-leninismo, estalinismo, trotskismo, maoismo, anarcocomunismo.
O que é uma ditadura do proletariado?
A origem do termo é atribuída ao militar alemão Joseph Weydemeyer, entusiasta do comunismo. Em carta a Karl Marx, em 5 de março de 1852, Weydemeyer diz que “a luta das classes conduz necessariamente à ditadura do proletariado; que esta mesma ditadura só constitui a transição para a superação de todas as classes e para uma sociedade sem classes”. O termo foi adotado posteriormente por Marx, Engels e mesmo por Lênin, fundador da União Soviética, mas ainda antes, em 1848, no Manifesto Comunista, a síntese aparece no final do texto, em que os autores indicam que os objetivos do proletariado “só podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda a ordem social existente”.
Como explica a professora Socorro Osterne, “a ditadura do proletariado refere-se a um estágio no qual o proletariado, ou seja, a classe trabalhadora, artífice da produção de bens, passa a deter o controle do poder político. Trata-se de uma fase entre o capitalismo e o comunismo”. Mas pondera que, na época, o termo ditadura não tinha a acepção de hoje e, mais que autoritário, referia-se à dominação do aparelho estatal. “Chamava-se ditadura porque absorvia os aparelhos do Estado”, pontua.
A União Soviética era socialista ou comunista?
A União das Repúblicas Socialistas Soviética (URSS) foi um megaestado, formado por 15 repúblicas, capitaneado pela Federação Russa, com sede em Moscou. Por lei, o único partido permitido era o Partido Comunista. Porém, de 1922 e 1991, a URSS adotou uma série de políticas híbridas, nem sempre em consonância com as teses marxista.
Em fevereiro de 1917, na esteira da Primeira Guerra Mundial, o imperador da Rússia foi derrubado por uma revolta popular, daí emergiu um grupo chamado menchevique, mais reformista. Diante da lentidão das reformas mencheviques, o país, assolado por uma crise econômica, com a derrota militar e a pobreza crônica, continuou em convulsão e, em outubro, o grupo bolchevique, liderado por Lênin, tomou o poder nesta que é considerada a primeira revolução socialista da história.
Apesar da série de medidas de caráter marxista adotadas por Lênin, o líder russo também propôs a Nova Política Econômica (NEP), que permitia práticas de natureza capitalista para aquecer a economia a curto prazo. Com a morte de Lênin em 1924 e a posterior ascensão de Josef Stálin, a NEP foi substituída pelo plano de metas quinquenais, que estabelecia como a indústria e a economia deveriam estar a cada cinco anos. Os planos quinquenais, ainda que reformados, orientaram a economia soviética pelas décadas seguintes.
Com a morte de Stálin na década de 50, as reformas de Nikita Kruschev flexibilizaram a produção industrial e aumentaram o comércio exterior. Nos estertores da União, na década de 80, o líder reformista Mikhail Gorbachev introduziu a perestroika, uma série de medidas para reestruturar a economia soviética, entre elas a autorização para importar produtos estrangeiros, redução de subsídios estrangeiros e liberalização do comércio exterior.
Durante sua existência, a União Soviética alcançou incontestáveis sucessos. É o caso do pioneirismo na corrida espacial, ao enviar o primeiro homem, o primeiro animal e o primeiro satélite ao espaço. Nas Olimpíadas, sempre se destacou como uma potência esportiva. O Império agrário e semifeudal do czar, em algumas décadas, experimentou uma industrialização pesada, com desenvolvimento de importantes indústrias bélica, automotiva, química e siderúrgica, além de melhoria na vida da população - ainda empobrecida - e fortalecimento dos sistemas educacionais, tornando o país um dos polos de formação acadêmica do mundo.
Politicamente, a URSS foi caracterizada pela centralização do poder político nos comitês do Partido Comunista e um forte Estado policial, em que diversos serviços controlavam a produção cultural e a manifestação política e reprimiam grupos minoritários, em especial no Cáucaso e na Ásia Central. Portanto, distantes do ideal marxista de Estado abolido e sem mecanismos de coerção social.
O professor de História da Universidade de São Paulo (USP) e autor do livro Os Russos, Angelo Segrillo, aponta que a natureza do Estado soviético é um dos principais debates entre teóricos. “As opiniões se dividem em três correntes principais: a URSS foi realmente socialista; a URSS não era socialista e sim uma forma de capitalismo de Estado; a URSS não era totalmente nem socialista nem capitalista e sim alguma forma de regime misto ou híbrido”, descreve.
Segrillo estudou no Instituto Pushkin, em Moscou, nos anos finais da URSS e conheceu a realidade soviética. “Os pontos de discórdia principais são a questão da democracia, ‘havia democracia socialista na URSS?’, e a questão se meios de produção estatizados como na URSS significam que os meios de produção eram socializados. Em minha opinião, a URSS era um regime que ficou preso na transição do capitalismo para o socialismo, sendo um regime híbrido, nem totalmente lá nem cá, mas mais para o socialismo”, diz o historiador. E conclui: “A URSS não foi um monólito imóvel e passou por transformações”.
Quem foi Stálin e qual seu foi legado
Em 1953, seu último ano de vida, Josef Stálin mandou prender 40 médicos do hospital do Kremlin, sede do governo russo. Foi só o primeiro passo: a seguir, centenas de outros profissionais de medicina foram aprisionados. Junto à detenção veio uma intensa campanha contra os médicos perseguidos, em sua maioria judeus, acusados de espionagem para os Estados Unidos, o Reino Unido e Israel. Mas a principal acusação era, afinal, atentar contra a vida do “general de aço” e comandante da União Soviética - Stálin.
Nascido em uma família pobre na Geórgia, o dirigente soviético é possivelmente a figura mais controversa deste período. Ele chegou ao poder após a morte de Lênin e governou com mão de ferro por 33 anos. Para alguns, é lembrado pelos planos quinquenais que permitiram a industrialização da URSS e a recuperação do poderio militar do país, além da vitória sobre o nazismo de Adolf Hitler - no que regime soviético passou a celebrar como a Grande Guerra Patriótica.
Para outros, é marcado pela forte repressão política, que caçou companheiros do partido comunista, deportou e condenou dissidentes e levou milhões à morte através de reformas estruturais. Pouco após chegar ao poder, caçou rivais do Politburo (a direção do Partido). O caso mais famoso é o de Leon Trotsky, que disputou a liderança da URSS com Stálin, foi exilado e, por fim, assassinado no México a mando do ditador. Em 1939, sob égide de Stálin, toda a cúpula do Partido Comunista que fez a revolução de 17 tinha sido eliminada.
“Stalin talvez simbolize alguns dos pontos altos e baixos da experiência soviética: ganhos econômicos e sociais significativos, ao lado de repressão pelo lado político”, pontua o historiador Angelo Segrillo. Stálin pode ser considerado um criminoso? "’Crimes’ é um termo impreciso quando se trata de política, mas talvez esse elemento moral possa ser aplicado a Stalin no caso específico da relação com seus próprios companheiros: mandou matar antigos companheiros do partido bolchevique e violou a própria legalidade socialista da URSS em suas repressões”, aponta.
Entre 1936 e 1938, promoveu os “grandes expurgos”, em que mais de 1,3 milhão de pessoas, entre dissidentes, membros do clero, camponeses e outros foram enviados aos gulags, campos de trabalho forçado. Desses, 700 mil estavam mortos ao fim do segundo ano. De acordo com a jornalista Anne Applebaum Elizabeth, em seu livro “Gulag - Uma história dos campos dos prisioneiros soviéticos”, mais de 3 milhões de pessoas foram mortas somente no gulag de Kolyma, na Sibéria.
Foi durante o governo de Stálin que a URSS ascendeu como superpotência no mundo, ao lado dos Estados Unidos. Também foi quando o megaestado soviético atingiu sua forma pela qual ficou conhecido, com 15 países componentes. Na Rússia, o legado do ditador permanece em debate. Em seu discurso ao Comitê Central do Partido Comunista, em 1956, Nikita Kruschev denunciou o que chamou de crimes de Stálin “contra o socialismo”. Em seguida, iniciou uma flexibilização do controle social. Segundo a história oficial, Stálin morreu de hemorragia cerebral, em um episódio cercado de inconsistências. O tirano teria ido para o quarto após um jantar e lá ficou até a noite do dia seguinte - sem que ninguém o procurasse. Após ser encontrado caído no chão, o socorro médico só foi chamado entre 12 e 14 horas depois. Foi internado, não resistiu e morreu aos 74 anos.
O comunismo matou mais que o nazismo?
Após a demissão do secretário especial da Cultura do governo federal, Roberto Alvim, por propaganda nazista, o deputado federal Eduardo Bolsonaro afirmou, em sua conta no Twitter, que o comunismo matou 100 milhões de pessoas em todo o mundo, mais que o nazismo. O filho do presidente da República também é autor de um projeto de lei que criminaliza o comunismo no Brasil. Mas, afinal, a afirmação é verdadeira?
Segundo historiadores, o regime nazista foi responsável pela morte de 19 milhões de pessoas durante a Segunda Guerra Mundial. No mundo todo, contudo, nos vários fronts de batalha, envolvendo os regimes japonês e italiano, o número é impreciso. Fala-se de 55 milhões de mortos entre a Europa e a Ásia. Outros pesquisadores chegam a 80 milhões. Todavia, o consenso - assim como o de que os judeus foram as principais vítimas do nazismo - é de que o país mais afetado, com maior número de vítimas, foi a União Soviética, com mais de 12 milhões de mortos nas trincheiras contra os nazistas.
Já a cifra citada por Eduardo Bolsonaro é imprecisa. Não há dados oficiais que a sustentem. O número aparece no “Livro Negro do Comunismo: Crimes, Terror e Repressão”, elaborado por estudiosos europeus, e cita 94 milhões de vítimas diretas ou indiretas de regimes totalitários de inspiração comunista, a maior parte destes na China de Mao Tsé-Tung.
Alguns episódios citados na obra são historicamente registrados, como as deportações aos gulags e tragédia conhecida por Holodomor, quando milhões de camponeses ucranianos morreram de fome após as reformas de Stálin para a coletivização das fazendas agrícolas. As cotas de alimentos diminuíram e quem resistiu a entregar a propriedade foi cassado pelas autoridades. As populações das zonas coletivizadas foram proibidas de emigrar e desenvolver outras atividades comerciais. A colheita, naturalmente, fracassou.
Segundo dados secretos revelados após a desintegração da URSS, pelo menos 4 milhões de ucranianos morreram no Holodomor, que deriva do ucraniano "moriti golodom" e se traduz como "matar de fome". Em novembro de 2006, o episódio foi oficialmente reconhecido pelo Parlamento da Ucrânia e por vários países, inclusive a Geórgia, terra natal de Stálin.
A “ameaça comunista” no Brasil
Um espectro ronda a Europa - o espectro do comunismo. Com esta frase, Karl Marx e Friedrich Engels abrem o Manifesto Comunista de 1848. Se ali estas palavras pressagiam, com algum humor, um movimento considerado inevitável pelos autores, isto é, a revolução proletária, no Brasil o tom sempre foi de ameaça. Ao menos, como ameaça foi entendido ao longo de toda a história republicana do País.
Bem como uma aparição fantasma, o comunismo só precisou ser apercebido uma vez. O testemunho e os alertas vindouros fizeram o trabalho pelo anos seguintes, em que volta e meia, a “ameaça comunista”, o “perigo vermelho”, é convocado na língua da classe política para invocar um inimigo à espreita, latente, que atemoriza a população. Foi a Intentona Comunista de 1935, uma revolta armada capitaneada por Luís Carlos Prestes para derrubar, por meio de um golpe, o presidente Getúlio Vargas, que chegou ao poder, também, por meio de um golpe. A Aliança Nacional Libertadora (ANL) e o Partido Comunista Brasileiro (PCB) pegaram em armas e foram às ruas em Natal, Recife e no Rio de Janeiro. Em Natal, chegaram a instalar um governo, com duração de quatro dias.
O movimento foi esmagado, mas sua atuação serviu de pretexto para a instalação do Estado Novo em 1937, quando Vargas assumiu a verve autoritária e atribuiu a si poderes de ditador. “O episódio de novembro de 1935 levou à criação de uma mitologia negativa em torno da chamada “intentona comunista”, que foi reproduzida nas décadas seguintes”, explica o professor da Universidade Federal de Minas Gerais Rodrigo Patto Sá, autor do livro Em guarda contra o perigo vermelho: o anticomunismo no Brasil, 1917-1964.
O fantasma do comunismo foi invocado, décadas depois, durante o governo de João Goulart, iniciado em 1961. A América ainda prendia a respiração pela Revolução Cubana, em 1959, que terminou com a instalação de um regime comunista de partido único. “Os movimentos anticomunistas nunca deixaram de estar presentes, mas, após a ascensão de João Goulart à presidência, aumentaram o seu ativismo, preocupados com a aliança que o novo presidente mantinha com grupos de esquerda. Eles temiam também os movimentos sociais que se fortaleceram à época e demandavam reformas sociais. As propostas de reforma de base foram apresentadas como antessala do comunismo, assim como a política externa independente do governo Goulart”, discorre o historiador.
Em 64, Goulart era deposto por um golpe militar aventado o pelas Forças Armadas brasileiras que, de acordo com Rodrigo Patto Sá, “passaram a ser mais mobilizados pelo tema após a insurreição de 1935, que deu origem a uma forte tradição anticomunista, especialmente os militares. Eles criaram uma celebração anual no dia de 27 de novembro para rememorar o episódio, além de monumentos em diferentes lugares, especialmente no Rio de Janeiro. Essa celebração foi usada não apenas para construir uma versão repulsiva sobre o significado do comunismo, mas, também, para unir os militares em torno de inimigo comum, que era considerado uma ameaça estrangeira à pátria”.
Mesmo após o fim da ditadura militar na década de 80 e a eleição de um partido de esquerda para o governo federal por quatro pleitos seguidos, a ameaça de um golpe comunista continua a povoar o imaginário político brasileiro e serve de combustível para o motor ideológico do bolsonarismo, com forte retórica anticomunista. O presidente, sua família e apoiadores já lançaram dardos contra diversos personagens e iniciativas, taxadas de comunista.
Ainda que não tenha, concretamente, dado as caras nas últimas oito décadas, o enredo fantasma do comunismo continua na memória. "O Brasil nunca esteve à beira do comunismo. Muitas pessoas acreditaram na existência de uma 'ameaça vermelha', mas, com frequência, não tinham visão clara sobre o significado de comunismo, às vezes confundiam-no vagamente com qualquer proposta de esquerda ou de tentativa de reforma social. No entanto, muitas lideranças sabiam perfeitamente que o comunismo não estava no horizonte, mas manipularam o medo para engrossar as mobilizações de direita e justificar a estruturação de regimes ditatoriais”, conclui o professor Patto Sá.