Coluna - Quando a derrota é festiva e vitoriosa
Não é papo de perdedor resignado. Quem conversa com o técnico do Greminho, Hamilton Silva, e acompanha a repercussão entre as jogadoras do time, constata: Eles saem da primeira fase do Campeonato Carioca Feminino no próximo domingo (6) felizes pela participação. Surpreendem quem achou inicialmente (grupo no qual me incluí em um primeiro momento) que foi uma falta de bom senso do Flamengo aplicar um placar de 56 a 0. Fazer o que? Segurar as jogadoras?
Este episódio lembrou-me outra vitória histórica, de 13 a 0 dos Estados Unidos sobre a Tailândia na última edição da Copa do Mundo de Futebol Feminino. De um lado havia os que chamaram as norte-americanas de arrogantes e exageradas pelas comemorações e gols. De outro lado havia muitos que entenderam que a melhor seleção do mundo fez o trabalho que deveria ser feito, e mostrou respeito ao não pegar leve diante de um frágil oponente.
Eu fico com a pureza da resposta do técnico carioca Hamilton Silva, com o qual conversei por telefone: “Encarei a derrota com naturalidade. Em momento algum critiquei. Vemos essa participação como oportunidade. Desde que chegamos ao Cefan [Centro de Educação Física da Marinha, local da partida], fomos muito bem recebidos. Não houve menosprezo, ou humilhação”.
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AssineO volume de críticas gerou reação da Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro (Ferj), que publicou nota explicando os motivos de realizar um campeonato com times tão heterogêneos. A instituição afirmou: “Aplaudimos o fair-play e a coragem das atletas, bem como os clubes que se propuseram ao primeiro passo de importante caminhada. Continuaremos com nossos objetivos, mas sem deixar de abrir a porta da esperança”.
Esperança é o que realmente motiva muitas atletas e clubes, mas é fato que o placar do jogo entre Flamengo e Greminho, entre tantos outros da primeira fase do campeonato, retrata o abismo de realidade física, técnica e estrutural que há no futebol feminino.
O próprio Greminho feminino foi formado há pouco mais de um mês, e reúne no elenco jogadoras de 15 a 36 anos. Elas treinam duas vezes por semana em uma praça pública no bairro de Kosmos, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Eram cinco meninas que treinavam com o time masculino (que existe há dez anos) e que se animaram ao serem convidadas a participar do campeonato. Ao lado do técnico, as jogadoras se dispuseram a correr atrás de novas atletas para a equipe. No primeiro jogo da competição, contra o Campo Grande, chegaram com 14 jogadoras e perderam por 13 a 0. Agora, depois da repercussão do placar contra as rubro-negras, o time conta com 35 participantes.
VisibilidadeDeu certo? “Eu acho que não só o Greminho, mas todos os times amadores passaram por essa diferença. Isto porque você enfrenta clubes grandes com realidades completamente diferentes. Por outro lado, traz a visibilidade que precisamos. Quando é que eu teria a possibilidade de encarar um clube grande?”, pergunta Hamilton, que se divide entre a função de motorista autônomo com e de técnico do time.
Há que se reconhecer que, se não fosse o placar, o Greminho não seria assunto das editorias de esporte. E se não fosse a esperança, as jogadoras nem tentariam um campeonato. E se não fosse o sonho de se tornar treinador, Hamilton nem conduziria o Greminho como projeto social. Agora o sonho é ter condições melhores e ter mais estrutura. “Isso mexe conosco”, encerra o técnico.
Se ainda restou alguma dúvida de que há realização de alguns apesar das derrotas nessa história toda, só resta a você fazer uma visita ao agora festivo Greminho.
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