Comitiva vai a Uruburetama averiguar denúncia de abuso sexual

15:47 | Jul. 17, 2019

Membros da rede cearense de defesa dos direitos da mulher foram, hoje (17), a Uruburetama, interior do estado, para averiguar as denúncias de violência sexual contra o prefeito afastado do município, José Hilson Paiva.

Em nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (Cremec) informa que o médico ginecologista e obstetra está sendo acusado pelo Ministério Público de praticar, desde 1986, o crime de abuso sexual e estupro de suas pacientes, conforme denúncias de mulheres que passaram por consulta ginecológica. Além disso, Hilson gravou 63 vídeos, filmados por ele próprio, com 23 pacientes. O material está em poder do MP.

A comitiva conta com representantes da Defensoria Pública do Ceará, do governo estadual, da Assembleia Legislativa, da Ordem dos Advogados do Brasil e de movimentos sociais. Segundo a defensora pública Jeriza Braga, o grupo partiu com a missão de identificar as demandas emergenciais que cada uma dessas instituições pode assumir.

“Estamos tomando pé da situação, buscando ampliar a rede de garantia dos direitos das mulheres no município, e claro, cobrar a devida responsabilização do autor. A mulher, quando vítima de violência, não tem a mesma paridade de armas e precisa de um olhar diferenciado de todas as instituições", disse Jeriza, que também é supervisora do Núcleo de Enfrentamento à Violência contra a Mulher.

Penalidades

O Conselho Regional de Medicina do Ceará estabeleceu, nesta segunda-feira (16), que Paiva está impedido de exercer suas atividades por seis meses. O prazo pode ser prorrogado por igual período.

Em nota, o Ministério Público (MP) do Ceará informou que uma investigação foi aberta e que algumas das vítimas já foram ouvidas pelos promotores de Justiça. "Medidas judiciais serão oportunamente tomadas visando elucidar todas as condutas delitivas e punir rigorosamente o responsável", acrescentou o órgão.

Uma convocação para depoimentos também foi anunciada para esta quarta-feira (17). Duas promotoras do MP estão realizando, desde o início da manhã, um trabalho de escuta ativa e agendamentos. Até as 13h, três mulheres se apresentaram como vítimas, manifestando intenção de prestar depoimento ao órgão.

Violência sexual

Além do desconhecimento sobre o que configura violência sexual, as mulheres disseram que não prestaram queixa porque dependiam da prefeitura para ter emprego. Localizada a 110 quilômetros da capital, Uruburetama tem cerca de 20 mil habitantes, conforme contagem do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Na biografia publicada no site da prefeitura de Uruburetama, José Hilson Paiva é descrito como alguém que "sempre ajudou a população local, servindo-se de seus conhecimentos na área da medicina em defesa dos menos favorecidos".

"Suas convicções políticas sempre estiveram atreladas a bandeira da saúde pública, por isso, nunca cobrou honorários pelos diversos atendimentos prestados aos municípios cearenses. Passando a ser respeitado e admirado por muitos, o que contribuiu para sua eleição a prefeito de Uruburetama em 1989", diz o texto.

Segundo a nota do Cremec, o vice-presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), Diogo Sampaio, assistiu aos vídeos que revelariam a consumação dos crimes e declarou que “são imagens de um criminoso que não faz medicina”.

“É muito triste a pessoa usar a confiança depositada nele, pelas pessoas da sua região, para abusar delas num suposto atendimento médico", disse Sampaio.

"Além da gravação do atendimento, sem o consentimento das pacientes, o que por si só já é um absurdo, temos ainda o fato de que as pacientes nunca foram examinadas de verdade nesses anos todos, podendo inclusive ter apresentado doenças, que poderiam ter sido evitadas ou tratadas, se fossem atendidas corretamente. Porém, nada disso foi feito. E o mais grave é que as imagens demonstram claramente estupro das pacientes”, acrescenta.

Código

O Código Penal brasileiro define estupro como o ato de "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso". A pena prevista para o crime é de reclusão, cuja duração varia de seis a dez anos.

O Boletim Trimestral de Conjuntura da Violência contra a Mulher no Ceará (CVCM), do Instituto Maria da Penha, que ajuda a dimensionar a violência contra mulher no estado, contabiliza 44 homicídios de mulheres no primeiro trimestre deste ano. Desse total, cinco foram classificados como feminicídios, ou seja, cinco mulheres foram mortas pelo simples fato de serem mulheres.

A violência sexual também tem se repetido com frequência na região. Embora não discrimine as vítimas por gênero, a base de dados da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Ceará registra 904 ocorrências de crimes sexuais, referentes aos primeiros seis meses do ano. Somente em junho, 156 casos foram notificados às autoridades.

A Agência Brasil não conseguiu contato com José Hilson Paiva.

* Com informações das assessorias de imprensa da Defensoria Pública do Ceará e da AMB