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Forte holandês que é marco histórico de Fortaleza completa 370 anos

Erguido às margens do Riacho Pajeú, Forte Schoonenborch foi a segunda tentativa holandesa de colonização do Ceará e lançou bases para a cidade de Fortaleza. No local fica atualmente a 10ª Região Militar, em frente à Catedral

15:51 | 10/04/2019
Maquete do Museu do Ceará mostra forte (na ponta direita) no contexto da Vila de Fortaleza em 1726 (Foto: Aurélio Alves/O POVO)
Maquete do Museu do Ceará mostra forte (na ponta direita) no contexto da Vila de Fortaleza em 1726 (Foto: Aurélio Alves/O POVO)(Foto: Aurélio Alves/O POVO)

Era 10 de abril de 1649 quando o comandante holandês Matias Beck ergueu, à margem esquerda da foz do Riacho Pajeú, uma cerca de pau-a-pique sobre um monte isolado. A posição estratégica, com vista panorâmica para as hostis terras do Ceará, seria fortificada com estacas de carnaúba dias depois e batizada de Forte Schoonenborch. Estava plantado símbolo de ocupação que, séculos mais tarde, viria a identificar e batizar a vila de Fortaleza.

Era a 2ª tentativa de colonização do Ceará feita pelos holandeses, que voltavam à região com 298 homens cinco anos após serem expulsos por indígenas do antigo forte São Sebastião (atual Barra do Ceará). O receio de novos ataques por terra era tão grande que, durante anos, toda a expedição neerlandesa operou de dentro da fortificação, desenhada pelo engenheiro inglês Richard Carr e erguida com parapeito e paliçada em formato de polígono pentagonal.

Réplica de gravura do Forte Schoonenborch da Holanda, hoje em exposição no Paço Municipal
Réplica de gravura do Forte Schoonenborch da Holanda, hoje em exposição no Paço Municipal (Foto: Reprodução)

Cinco anos depois da criação do forte, 1654, os portugueses voltariam a controlar a região, alterando o nome da fortificação – que fazia referência ao governador holandês de Pernambuco, Walter van Schoonenborch – para Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção. Quando a ocupação é elevada à condição de Vila, em 13 de abril de 1726, o povoado já carregava no nome a referência à antiga edificação holandesa e tinha ela como “centro”.

O receio de ataques por terra, no entanto, continuava o mesmo, com os principais canhões da paliçada voltados não para o mar, como costume em ocupações portuárias, mas para a própria cidade. A orientação pouco usual do armamento chamou a atenção inclusive do viajante anglo-português Henry Koster, registrada em 1811 no livro Viagens ao Nordeste do Brasil. “Notei que a peça de maior forçada estava voltada para a Vila. A que estava montada para o mar não tinha sequer calibre suficiente para atingir um navio no ancoradouro comum”.

Na foto: Forte São Sebastião, primeira fortificação do Ceará.Foto: Divulgação, em 22/03/1987
Na foto: Forte São Sebastião, primeira fortificação do Ceará.Foto: Divulgação, em 22/03/1987 (Foto: Divulgação)

Para o historiador Antônio Luiz Macêdo e Silva Filho, na obra Fortaleza: Imagens da Cidade (2004), não é exagero imaginar que o posicionamento do armamento “expressava um modo repressivo de manter a ordem social, intimidando o surgimento de rebeliões e ondas de descontentamento popular”. Ele explica: “No Brasil colonial, tradicionalmente se atribui a ereção de bastiões militares à defesa territorial dos ataques navais de concorrentes europeus”.

Mantida com poucas alterações estruturais pelos portugueses a partir de 1654 - com a exceção de reformas de manutenção e da construção de uma pequena capela -, a fortaleza veio a ser totalmente remodelada apenas em 1812, após o desmoronamento de parte da antiga estrutura. Na área arruinada, o engenheiro Silva Paulet traçou novo alicerce do forte: quadrado, com 90 metros de lado e baluartes em cada ponta – formato próximo do mantido atualmente.

A nova fortaleza foi construída com mão de obra voluntária e escrava, chegando a ter, em 1816, vinte e sete peças de artilharia. Em 1910, o forte foi desarmado, passando a funcionar como monumento histórico. Atualmente, funciona no espaço a 10ª Região Militar do Exército Brasileiro, que mantém museu e agenda de visitação ao monumento.

10ª Região Militar do Exército funciona hoje no antigo espaço da Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção (Aurélio Alves/O POVO)
10ª Região Militar do Exército funciona hoje no antigo espaço da Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção (Aurélio Alves/O POVO) (Foto: Aurélio Alves/O POVO)

O Schoonenborch não foi o primeiro forte, nem mesmo a primeira fortificação  holandesa no território que hoje é Fortaleza. Mas foi, conforme explica o professor João Marcos Alves, da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), marco em torno do qual a cidade se desenvolveu - o Centro cresceu ao redor da atual 10ª Região Militar, não da Barra do Ceará. Por isso, para o historiador Raimundo Girão, com respaldo de pesquisadores como Câmara Cascudo, o 10 de abril de 1649 demarca a fundação de Fortaleza. Ele não ignorava as experiências anteriores, na Barra do Ceará, que remontam a 1603. Porém, o entendimento era de que a "velocidade inicial" para desenvolver Fortaleza foi o Schoonenborch. Por isso, Girão defendia que o aniversário de Fortaleza fosse comemorado em 10 de abril.

O assunto rendeu intensa polêmica intelectual no começo da década de 1960. O historiador Ismael Pordeus defendia a comemoração do aniversário de Fortaleza a partir da fundação do Forte de São Sebastião, fundado em 20 de janeiro de 1612, por Martim Soares Moreno. Por trás da controvérsia estava uma questão de fundo: a ideia de uma cidade de origem portuguesa, portanto católica, ou holandesa e protestante.

Em meio às divergências, o aniversário de Fortaleza não foi fixado oficialmente nem numa data nem na outra. Escolheu-se 13 de abril de 1726, quando ocorreu uma formalidade: a transformação do povoado que já existia em vila, por decisão do rei de Portugal.

Pesquisa histórica: Fred Souza/O POVO Dados

Carlos Mazza, do O POVO Dados