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Brutais amores chineses
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Brutais amores chineses

|Cinema do Dragão|Maior nome atual do cinema da China, Jia Zhangke volta com força com o filme de gangster Amor Até as Cinzas, seu nono longa de ficção. A obra entra em cartaz hoje
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O filme fala sobre a China em histórias trágicas de amor e riqueza
 (Foto: Cohen Media Group)
Foto: Cohen Media Group O filme fala sobre a China em histórias trágicas de amor e riqueza

Jia Zhangke só passa despercebido para quem nunca viu um dos filmes dele. Violento, surpreendente, inteligente, passional e profundamente político, o cinema do chinês de 49 anos é um dos mais ricos do mundo e vem do maior e talvez mais contraditório país do mundo. Por isso e pela qualidade de tudo o que filma, Jia Zhangke é hoje um dos cineastas mais importantes do globo. Ainda que a grande maioria da população não o conheça.

Depois do sucesso relativo - restrito aos circuitos alternativos, como quase toda obra oriental ou mesmo europeia - de seus dois últimos filmes, Jia está de volta com Amor Até as Cinzas. O filme trabalha o contexto socioeconômico da China em histórias trágicas de amor e riqueza. Em Datong, cidade da província de Shangxi - onde o diretor nasceu -, a bela dançarina Qiao (Zhao Tao) nutre uma paixão pelo mafioso Bin (Fan Liao). Durante uma briga de gangues, a jovem dispara um revólver na tentativa de proteger o namorado e, por conta disso, acaba condenada a cinco anos de prisão. Passado o tempo de encarceramento, ela procura Bin para tentar de nado.

O filme esteve na seleção oficial do festival de Cannes do ano passado, onde foi muitíssimo bem recebido. O cineasta, aliás, concorreu à Palma de Ouro da mostra da riviera francesa com seus últimos três filmes: 24 City (2008), Um Toque de Pecado (2013) e As Montanhas Se Separam(2015). Com nove longas-metragens de ficção e dois documentários lançados, Jia Zhangke acumula premiações em festivais como os de Berlim, Chicago, Veneza, São Paulo, Cannes e no Asian Film Awards.

Apesar da aclamação internacional, Jia não tem lá a vida mais fácil no próprio país. Um Toque de Pecado, premiado como melhor roteiro de Cannes 2015, teve negado o lançamento local por conta do conteúdo político, que, ainda que indiretamente, critica o regime autoritário chinês. Essa relação conflituosa até atrapalha a disseminação internacional do cinema do autor. Seus filmes, por exemplo, nunca figuraram como escolhidos pelo fechado governo chinês para representação da China no Oscar de melhor filme em língua estrangeira. Talvez por isso a nação, apesar da profícua produção cinematográfica e das infladas presenças de público nas salas de exibição, só recebeu até hoje duas indicações na categoria: Amor e Sedução (1990) e Herói (2002), ambos de Yimou Zhang (o primeiro, co-dirigido com Fengliang Yang).

Em Amor Até as Cinzas, Jia Zhangke novamente trabalha com Zhao Tao, com quem é casado desde 2012. Os dois fizeram parceria em todos os filmes do chinês desde seu segundo, Plataforma (2000). Apesar do repeteco, em entrevista ao site norte-americano IndieWire, o cineasta revelou que a proposta da nova obra difere das anteriores.

"Em filmes anteriores, eu tendia a lidar mais com fatores externos que (os personagens) estão lidando. (...) Com este em particular, eu queria examinar mais das emoções internas e como elas mudam no espaço de 17 anos". O filme começa em 2001, se estendendo até 2018, período de grande prosperidade econômica na China, mas também de crescimento de violentas fontes paralelas de poder - gangues -, tema recorrente na filmografia de Jia Zhangke. Também à IndieWire, o diretor disse que busca mostrar "as minorias silenciosas", "pessoas que são maioria, mas são invisíveis". "Depois de 1949, quando a República Democrática da China foi estabelecida, a sociedade civil que costumávamos ter desapareceu completamente porque a economia designou todos a uma unidade", disse, acrescentando que, com a reabertura, houve grande mobilidade, fator que criou os personagens centrais do filme.

Amor Até as Cinzas estreia hoje no Cinema do Dragão. Para quem gosta das obras de Jia Zhangke, o espaço oferece ainda uma sessão dupla com os dois filmes mais recentes do cineasta chinês. No próximo domingo, às 17h20min, a sala alternativa do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura recebe As Montanhas Se Separam" (2015) e Amor Até as Cinzas, em sequência.

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