A vítima Invisível: documentário da Netflix tenta fazer justiça a Eliza Samudio

Obra relembra o crime sob o prisma da vítima e apresenta quem foi Eliza para além dos rótulos criados à época. Ex-goleiro do Flamengo, Bruno foi condenado a 22 anos de prisão

Uma vítima apagada sob a luz da fama do assassino. É sob essa ótica que o documentário "A Vítima Invisível: o Caso Eliza Samudio", que estreia na Netflix nesta quinta-feira, 26, pode ser descrito.

A obra é como uma nova lâmpada do marcante caso da morte da ex-modelo, vítima de um brutal e não totalmente elucidado assassinato. Tal cenário, por muitos anos, teve o ex-goleiro do Flamengo, Bruno, como protagonista ao ser apontado como um dos mandantes do crime.

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Em 1 hora e 44 minutos de duração, o documentário produzido pela Boutique Filmes, com roteiro de Carol Pires e Caroline Margoni e direção de Juliana Antunes, elucida quem era o que eles chamam de "vítima invisível". Eliza Samudio, ainda que tivesse sido alvo do crime, ficou por muito tempo oculta da mídia. O objetivo do trabalho cinematográfico é puramente esse e isso fica claro desde os minutos iniciais.

Para que o próprio telespectador capte quem era a jovem, a história de infância é abordada, expondo relacionamentos familiares turbulentos e a forma como isso a afetava a ponto de ela prometer para a tia que só voltaria para casa “se tivesse rica”. Agrura esta que a colocou num caminho de busca por sucesso — ainda que não exatamente pela fama.

A história trágica guarda semelhanças ao doloroso livro "Estela sem Deus", de Jeferson Tenório, no que diz aos aspectos de repetição e naturalização de padrão de violência, além de injustiças sociais, machismo e todos os seus males. Ainda assim, o documentário é tão real quanto se pode ser, trazendo depoimentos de testemunhas, arquivos familiares e de pessoas envolvidas no caso.

Na história narrada, a ingênua busca por sucesso de Eliza se deu primeiro como goleira — fato este nem era tão público assim —, e depois se desembestou para outros caminhos. Ainda que a carreira dela como modelo não tenha sido citada, ainda que ela seja apresentada como ex-modelo diversas vezes, é possível intuir quando os caminhos dela e do goleiro Bruno se entrelaçam e quando tudo passou a ficar obscuro.

Mesmo falando de um homem considerado então ídolo de uma nação, como é chamada a torcida do Flamengo, "A Vítima Invisível" acerta principalmente quando não oculta Bruno, mas o faz sem torná-lo protagonista, já que a ideia do documentário é justamente tornar visível o lado de Eliza Samudio. Estão lá, no ex-goleiro retratado pela obra, os deslumbramentos com a fama, a naturalização frente a comportamentos tóxicos do mundo masculino e do ambiente futebolístico.

Um outro lado que é mostrado é justamente o inverso ao vendido por Bruno, que a apontava constantemente como “uma maluca”, “aproveitadora” e “caçadora de fama”. O próprio réu, em início de processo, assumiu que a ex-amante nunca havia lhe pedido dinheiro, por exemplo, fato este que só foi apontado no andamento do processo, em depoimentos contraditórios.

Quanto ao estigma de "caçadora de fama" atribuído à vítima após a morte, o doc faz a leitura de que a imprensa foi utilizada por Eliza Samudio não por uma tentativa de visibilidade própria, mas como escudo de proteção por violências que ela sofria, já que lhe foi negado o direito à proteção mesmo após uma denúncia de agressão.

Em um dos recortes das inúmeras vezes em que a mídia aparece espetacularizando o caso, há depoimentos de Eliza em que o discurso dela acentua que "fama não daria saúde nem a ela e nem ao filho". Algo que a história provou.

Ao final de tudo, "A vítima Invisível" sensibiliza, mas também causa indignação, não só por expor como a vítima foi invisibilizada, sendo alvo de machismo, mas ainda por captar como todo o absurdo do frio assassinato não elucidado nunca pareceu maior que a fama e o talento do réu para público, torcedores e imprensa.

Em dado momento, uma das pessoas envolvidas no caso pergunta: “E se ela fosse um homem?”. A resposta do documentário é bem clara em dizer que, se não fosse um caso de feminicídio, talvez a vítima não fosse invisibilizada como foi.

"A Vítima Invisível: o caso Eliza Samudio"

Onde assistir: Netflix

Duração: 1 hora e 44 minutos

Direção: Juliana Antunes

Produzido por: Gustavo Mello

Produção Executiva: Adriana Gaspar, Thais Morresi

Chefe de Montagem: Jordana Berg

Direção de Fotografia: Janice d’Ávila

Roteiro: Caroline Margoni e Carol Pires

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