PT prevê criar Guarda Nacional e despolitizar as Forças Armadas

Modernizar as Forças Armadas em razão da nova realidade geopolítica mundial ditada pelo conflito da Ucrânia e afastar os militares da política. Essa é a estratégia do PT para recuperar o diálogo institucional com a caserna em um eventual novo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva.

"Não quero general de esquerda, mas legalista e consciente de seu dever", afirmou ao Estadão o ex-ministro da Defesa e ex-chanceler Celso Amorim. Ele disse considerar como "passado" a Comissão Nacional da Verdade (CNV), um das principais razões de atrito entre o partido e os militares no governo Dilma Rousseff. "O momento é de normalização. Vivemos o momento da CNV, que foi necessário. Esse momento está superado. Não vamos mexer mais nisso."

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Para Amorim, a situação a ser enfrentada hoje é outra. "Em termos de programa, vivemos em uma situação tão anormal agora que é preciso recuperar a normalidade. Essa é a primeira coisa. Despolitizar as Forças Armadas e elas passarem a se dedicar à sua tarefa principal - que eu sei que não é a única -, que é a defesa da Pátria. E isso passa pela modernização das forças."

Tecnologia

Um futuro governo de Lula e Geraldo Alckmin (PSB), segundo ele, deve usar a Defesa para o desenvolvimento tecnológico, com a construção de aviões, embarcações e mísseis nacionais. "Cada vez mais os acordos comerciais vão cercando outros instrumentos de política industrial, mas não os de Defesa. Defesa está fora da OMC (Organização Mundial do Comércio)", disse Amorim.

Formuladores de propostas petistas para a Defesa defendem ainda a criação de uma Guarda Nacional para atuar em crises ligadas à segurança pública - afastando, assim, o Exército das ações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) -, além da busca de alianças regionais para a dissuasão de ameaças extrarregionais. O candidato petista encomendou sugestões a um grupo de especialistas da área.

Ex-presidente Associação Brasileira de Estudos de Defesa (Abed), Manuel Domingos Neto é um dos consultados. Segundo ele, estuda-se ainda a estruturação de uma polícia de fronteira, de uma polícia florestal e de uma guarda costeira. Ele defende, ainda, um modelo de transição para a profissionalização das Forças Armadas que abandone o alistamento obrigatório, a exemplo dos Exércitos europeus e dos Estados Unidos. "É preciso uma nova concepção de Defesa que obedeça a quatro princípios: coesão nacional; amizade com vizinhos; capacidade científica e tecnológica; e forças coerentes com esses pontos."

Desconfianças

Porém, as desconfianças entre petistas e militares contaminam o debate. Ao mesmo tempo que Amorim e Domingos Neto procuram um diálogo institucional, setores do partido continuam a tratar os militares como um "puxadinho" do governo Jair Bolsonaro (PL). É o que mostra, por exemplo, resolução do Encontro Nacional de Direitos Humanos do PT, de 12 de dezembro de 2021.

No documento, lê-se que "a atual cúpula das Forças Armadas é cúmplice desta conduta do governo Bolsonaro". Segundo ele, "não há como separar as Forças Armadas da catástrofe que é o governo Bolsonaro."

O texto provoca calafrios nos generais. Muitos acusam o PT de ser incapaz de diferenciar Forças Armadas e Ministério da Defesa. Lembram da postura institucional do general Edson Leal Pujol, o que lhe custou o comando na atual gestão. E não têm mais paciência para responder a perguntas sobre golpe.

Generais também dizem ter disposição para o diálogo institucional e a busca da modernização desde que não sejam só para diminuir o poder das forças, retirando tarefas ligadas à segurança interna, promovendo uma espécie de vingança pela participação na gestão Bolsonaro.

Também dizem acreditar ser difícil copiar o modelo americano de Forças Armadas e ter recursos para montar uma guarda costeira ou abandonar o serviço militar obrigatório em nome da profissionalização. E reafirmam que a prioridade deve ser que o orçamento da Defesa saia de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2%. "O modelo atual é o mais viável para o País, pois otimiza recursos", disse o deputado federal e general da reserva Roberto Peternelli (União-SP).

Interrupção

O diálogo entre as forças políticas e o Exército foi interrompido na campanha eleitoral por ordem do general Marco Antonio Freire Gomes, atual comandante do Exército. Interlocutor de parte dos generais, o professor de Filosofia Denis Lerrer Rosenfield afirmou que quatro pontos são fundamentais para os militares: "A manutenção da Lei de Anistia, a não reabertura da Comissão da Verdade, a manutenção do sistema de promoções dos generais e do currículo das academias".

O recado tem um alvo certo. Em 2016, documento do PT lamentava que o partido não tivesse modificado os currículos das academias militares e promovido "oficiais com compromisso democrático e nacionalista." É deste documento que a campanha de Lula pretende se distanciar. Domingos Neto foi mais longe. Para ele, é "besteira mudar o currículo". "Quem botou isso prestou um desserviço. O currículo é estabelecido em função da missão." Segundo ele, essas propostas levadas a Lula devem ser estudadas em um grupo que apresentará um projeto de modernização da Defesa.

Já Amorim defendeu até a postura de Pujol na pandemia de covid-19. Entre seus interlocutores estão o general Enzo Peri, ex-comandante do Exército, e o almirante Julio Soares de Moura Neto, ex-comandante da Marinha. Por fim, Amorim disse acreditar que a mudança de comando deve levar em consideração o critério da antiguidade.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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ELEIÇÕES 2022/LULA/GUARDA NACIONAL/FORÇAS ARMADAS/DESPOLITIZAÇÃO

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