Covid: a nova onda na China e os impactos no resto do mundo
As consequências desta onda sem precedentes no País asiático pode respingar mundialmente. Mas é "muito improvável" que o Brasil enfrente nova onda na mesma proporção que as anteriores
08:14 | Jan. 03, 2023
País mais populoso do mundo, a China enfrenta uma onda sem precedentes de novos casos de Covid-19. O governo chinês suspendeu repentinamente as duras restrições sanitárias, que perduraram pelos quase três anos desde o início da pandemia, e tem uma população mais suscetível ao vírus. As repercussões da situação no país, contudo, podem reverberar nos demais, como o Brasil.
Alguns especialistas estimam que cerca de 60% dos 1,4 bilhão de habitantes da China – aproximadamente 10% da população global – pode ser infectada com o coronavírus nos próximos meses. Muitos hospitais estão lotados, e as farmácias sofrem com escassez de medicamentos. Crematórios também relatam recebimento de alto número de corpos.
Anderson Fernandes de Brito, virologista e pesquisador do Instituto Todos pela Saúde (ITpS), explica que a China adotou "uma estratégia implacável" de Covid zero, "isolando os casos positivos com um sistema rígido de controle". As medidas eram vistas por muitos com "excessiva", sendo recentemente revista e abolida.
"Com isso, até recentemente, o baixo número de casos e mortes podia ser creditado àquela estratégia. Já nas últimas semanas, quando o isolamento rígido dos infectados foi abandonado, a situação da China é incerta, tanto quando a casos/óbitos, quanto às variantes circulantes", relaciona.
O infectologista Igor Queiroz, da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), aponta que a China foi "um grande exemplo em relação à infraestrutura, montagem de hospitais, isolamento e respeito às regras", mas fez com que o País ficasse "fechado" por um grande período de tempo.
O cenário de aumento de internações e mortes — extraoficiais — não se reflete nos dados públicos aos quais a população tem acesso. "O que levanta questionamentos quanto à transparência do contexto atual naquele país", aponta Brito.
Além disso, o governo chinês anunciou recentemente que não publicaria mais estatísticas sobre a doença, que são alvo de críticas pela enorme defasagem entre os números oficiais e a onda atual no País.
Outra fonte de controvérsia é a nova metodologia de contabilização das autoridades, na qual apenas as mortes de pacientes com Covid-19 por insuficiência respiratória serão levadas em consideração como causadas pela doença.
População chinesa mais suscetível
Mas por que a população da China está mais suscetível? Segundo Anderson Fernandes Brito, a disseminação de variantes mais transmissíveis e evasivas explica em parte os casos. Por lá, as principais linhagens circulantes são a BA.5.2 e BF.7.
Mas a gravidade se deve principalmente a duas razões, conforme o virologista: "A existência de amplas parcelas da população que nunca tiveram contato com o vírus, bem como a baixa cobertura vacinal e a plataforma vacinal utilizada (vírus inativados), menos eficaz na prevenção de casos graves, em especial entre idosos, uma parcela da população que não tem aderido à vacinação".
Das pessoas com mais de 80 anos, apenas 66,4% estão com a vacinação (três doses) completa, segundo as autoridades de saúde.
"Se tem um vírus que se espalha rapidamente em uma população altamente suscetível, como são os chineses, o que ocorre é um aumento do número de casos, e em uma população grande como a chinesa isso vai, consequentemente, fazer com que eles tenham um grande número de casos graves e até mesmo de óbitos", corrobora Igor Queiroz.
Os impactos da onda na China para o resto do mundo
Do ponto de vista mundial, Queiroz explica que "podem surgir novas mutações, variantes e subvariantes, impactando no número de casos no mundo inteiro". "Sem falar nos impactos econômicos que podem gerar. Os chineses exportam produtos para o mundo inteiro", alerta.
Brito explica que países que estão "igualmente desprotegidos com baixas coberturas vacinais estão correndo riscos similares aos enfrentados pela China". No caso do Brasil, aqueles que não receberam as doses de reforço estão sob mais risco. "O cenário chinês impacta o Brasil em relação à essa parcela da população, que poderá desenvolver casos graves de Covid", avalia o pesquisador do ITpS.
"Considerando a nossa cobertura vacinal atual, aumentos descontrolados de casos graves e hospitalizações no Brasil, similares aos vistos em 2020 e 2021, são muito improváveis", pondera Brito. "Para evitar que isso aconteça, no entanto, é essencial que sigamos oferecendo a 3ª e 4ª doses de reforço naquelas pessoas que ainda não foram imunizadas", conclui.
O infectologista Igor Queiroz acrescenta que é importante que o Brasil fique em alerta e mantenha a vigilância por meio dos dados. "Também é importante evitar locais aglomerados, utilizar máscara, não tossir ou espirrar próximo a outras pessoas", orienta.
Outros especialistas apontam também que a nova onda na China pode dificultar a aquisição de medicamentos e insumos de saúde, produzidos em grande parcela pelo País asiático.