Mais de 4,6 mil profissionais de saúde morreram por Covid-19 no Brasil, aponta estudo

Levantamento inédito analisa dados federais registrados entre janeiro de 2020 e dezembro de 2021. Impacto maior foi entre mulheres e auxiliares de enfermagem

14:06 | Out. 14, 2022

Por: Marcela Tosi
No Ceará, o Hospital Estadual Leonardo da Vinci foi a unidade de referência para atendimento de casos graves de Covid-19 (foto: Fernanda Barros/ O POVO)

Em dois anos de combate à Covid-19, 4.683 trabalhadores da linha de frente morreram em decorrência da doença no Brasil. Foram cerca de seis mortes de profissionais da saúde por dia ou uma morte a cada quase quatro horas. Aproximadamente 80% dos profissionais mortos eram mulheres e 70% trabalhavam como técnicos e auxiliares de enfermagem.

O levantamento divulgado nessa quinta-feira, 13, foi encomendado pela Federação Sindical Internacional de Serviços Públicos (PSI, Public Services International, da sigla em inglês) e realizado pelo estúdio de inteligência de dados Lagom Data.

Os dados revelam que as primeiras mortes causadas pelo coronavírus Sars-Cov-2 aconteceram em janeiro de 2020. Nos meses seguintes, enquanto os óbitos por outras causas se mantiveram em torno da média registrada em 2018 e 2019, os profissionais da saúde foram cada vez mais vitimados pela Covid-19.

Em maio, a doença chegou a constar como causa básica de 38,5% dos óbitos desse grupo profissional. Em 2021, os casos fatais da Covid-19 na linha de frente da saúde chegaram ao seu pico: as mortes registradas apenas entre março e junho superaram o total do ano anterior. Em março e abril, mais profissionais morreram pelo coronavírus do que por outras causas.

 

“A importância de fazermos este levantamento vai desde o reconhecimento destes trabalhadores que deram sua vida para salvarem outros à luta para que o piso salarial de enfermagem seja de fato uma realidade”, afirma Marcelo Netto, chefe de comunicações da ISP mundial, em Genebra.

Ele lembra que, desde o dia 21 de setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) validou a Lei 14.128/2021, que prevê a indenização de profissionais de saúde incapacitados de forma permanente por terem adquirido Covid-19 em função da natureza do trabalho.

Mulheres e auxiliares de enfermagem somam maior número

 

Quase oito em cada dez profissionais da saúde que morreram pela Covid-19 eram mulheres. Entre os atestados de óbito com sexo informado, 78% eram do sexo feminino (3.554 mortes) e 22% do sexo masculino (999 óbitos).

“Eram essas profissionais que estavam sempre lá, ao lado de quem sofria com a doença, da triagem de todos até a morte de alguns”, comenta Netto. “Podemos ainda destacar que quase a metade, 47%, eram mulheres pretas e pardas, que normalmente estão mais presentes nas atividades menos remuneradas.”

Ainda segundo a pesquisa, o impacto da doença foi maior nas ocupações com menores salários e mais próximas à linha de frente: 70% dos mortos trabalhavam como técnicos e auxiliares de enfermagem; em seguida vieram os enfermeiros (25%) e por último os médicos (5%).

Tanto nos dados oficiais de emprego formal quanto nos registros dos conselhos profissionais, médicos representavam 61% dos profissionais empregados no período. Enfermeiros eram 20% e técnicos de enfermagem, 18%.

A análise foi feita a partir do cruzamento de microdados do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados e Registros de profissionais do Conselho Federal de Medicina (CFM) e do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). Os dados ainda são preliminares, pois as informações do SIM do final de 2021 ainda estão em investigação.

Vacinação prioritária fez mortes caírem 

 

O relatório traz ainda o cruzamento entre os dados do Ministério da Saúde e informações sobre desligamentos por morte no Novo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados). Como o Novo Caged não capta a causa do óbito do trabalhador com carteira assinada, foram calculadas as chamadas mortes excedentes, ou seja, o total de desligamentos por morte no mês menos a média mensal de 2018/2019.

Nos primeiros meses da pandemia, a curva do excesso de desligamentos por morte entre os profissionais da saúde era mais elevada do que a da totalidade das ocupações no Brasil. Ou seja, os profissionais da saúde morriam proporcionalmente mais. Em maio de 2020, as mortes excedentes chegaram ao dobro da média anterior.

Quando o Brasil avançou na vacinação prioritária dos profissionais de saúde durante o primeiro trimestre de 2021, a mortalidade entre o grupo caiu mais rápido do que na população em geral, que demorou mais meses para ser vacinada. As mortes entre trabalhadores da saúde começaram a cair continuamente a partir de março. Já entre os demais trabalhadores, a queda constante teve início em junho.