Distúrbios do sono se tornam mais graves durante a pandemia; saiba como dormir melhor

Sedentarismo, preocupações excessivas e o medo da contaminação pelo novo coronavírus podem afetar a qualidade do sono dos brasileiros. Especialistas orientam como preparar o corpo e o lar para o descanso

 

A mudança repentina de hábitos, somada aos diversos fatores ansiogênicos promovidos pela pandemia, tem agravado os distúrbios de sono entre os brasileiros. De acordo com médicos, a má qualidade do sono pode ocasionar ou agravar outros problemas de saúde, como a obesidade e os transtornos mentais. Os especialistas destacam que a preparação do corpo para um sono de pelo menos sete a oito horas, sem interrupção causada por estímulos como luz ou barulho, podem contribuir positivamente para a saúde do corpo e do cérebro.

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Os distúrbios do sono têm se tornado cada vez mais comum durante a pandemia, revelou uma pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde, em maio. Chamou a atenção que 41,7% dos 2 mil entrevistados relataram dificuldade para dormir, ou que passaram a dormir mais do que o costume neste período de quarentena. Conforme o neurologista especializado em medicina do sono, Manoel Sobreira, os distúrbios se agravam durante a pandemia devido a fatores como mudança de rotina, preocupações excessivas e o receio de contaminação com o novo coronavírus, por exemplo.

“Na quarentena, as pessoas ficaram mais reclusas em casa, passaram a ter mais autonomia em relação aos seus horários e menor exposição à luz. E essa ausência de rotina afeta o ritmo circadiano”, explica o neurologista. Segundo Manoel, isso altera os hábitos de uma pessoa, que passa a dormir mais ou menos, e chega a ficar mais sonolenta. Além disso, a pessoa que tem privação do sono pode passar a apresentar problemas de concentração e memória. Em cenário mais grave, pode até sofrer de um Acidente Vascular Cerebral (AVC).

Outra questão agravada pela pandemia se trata dos fatores ansiogênicos. Se a pessoa já apresentava algum grau de ansiedade, o cenário de incertezas pode provocar mais preocupações, que afetam a qualidade sono. “Acaba sendo uma consequência. As pessoas ficaram com medo de adoecer ou perder o emprego. Ficam preocupadas se um familiar vai ser exposto à doença. Tudo isso pode levar a repercussões”, esclarece Manoel.

O médico destaca que há pelo menos 84 doenças relacionadas ao sono. Entre as principais queixas relatadas por quem apresenta algum distúrbio, estão a dificuldade para dormir, a paralisia do sono, e o ronco, entre outros. Essas condições podem cooperar para outros sintomas, como o cansaço, desatenção, comprometimento da memória e cefaleias.

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Outro problema desencadeado pelos distúrbios do sono é a obesidade. “Doenças como apneia e outras relacionadas à privação do sono aumentam a produção de hormônios que levam a uma menor saciedade, fazendo com que o indivíduo coma mais e ganhe mais peso”, destaca o neurologista, Manoel Sobreira.

Respiração 

O aumento de peso também é ressaltado pelo otorrinolaringologista Braz Nicodemo Neto, diretor técnico do Hospital Paulista. Ele explica que a dificuldade de respirar é um dos problemas que prejudicam o descanso de uma pessoa. Conforme estudo da Royal Philips, publicado em 2018, sete em cada dez brasileiros sofrem com doenças do sono. Enquanto a insônia é o problema mais comum, a síndrome de apneia e hipopneia obstrutiva do sono – popularmente conhecida apenas como apneia – ocupa a segunda colocação.

“É uma doença caracterizada pelo ronco e episódios recorrentes de obstrução total [apneia] ou parcial [hipopneia] das vias aéreas superiores. O esforço respiratório, no entanto, é mantido. Quem sofre com a síndrome costuma apresentar sonolência excessiva durante o dia, sensação de sono não reparador, dificuldade de memória e concentração. Além disso, o quadro contribui para hipertensão, diabetes, arritmia, AVC, dentre outros”, explica o otorrinolaringologista em nota.

O sono ruim afeta principalmente a produção de dois hormônios relacionados à obesidade: a leptina e a grelina. Enquanto o primeiro promove uma sensação de saciedade, reduz o apetite e aumenta o gasto energético; o segundo reduz a sensação de saciedade, fazendo com que o indivíduo sinta mais fome. “Dormir mal diminui a produção de leptina e amplia a produção de grelina, segundo estudos médicos”, esclarece Nicodemo.

O aumento de peso pode colocar a pessoa em um ciclo vicioso: “O paciente que dorme mal apresenta cansaço e sedentarismo ao longo do dia. Associado a um quadro de ansiedade e estresse, este estado pode levar a um ganho de peso e, consequentemente, piorar ainda mais a qualidade do sono”, complementa Nicodemo. Segundo o médico, quanto mais obeso, pior será o sono do paciente, pois sua respiração registra mais dificuldades.

Por isso, procurar ajuda médica é essencial, tanto para o tratamento contra a obesidade como para a síndrome de apneia e hipopneia. “É preciso procurar atendimento médico especializado se os problemas não forem pontuais”, orienta Nicodemo. A avaliação é multidisciplinar, considerando que a origem dos problemas pode estar associada a diversos fatores.

Como dormir melhor?

Conforme os médicos, o sono de qualidade está relacionado a uma rotina, que envolve dormir e acordar em horários regulares, evitando o “descompasso” do organismo no dia a dia. Além disso, inserir atividades físicas e uma “higiene do sono” - ou seja, a preparação do corpo para dormir - são ações que podem repercutir positivamente para a adaptação das pessoas aos novos hábitos, conforme a neuropsicóloga Samantha Maranhão. “Em uma rotina a gente faz uma ceia, toma um banho e prepara o ambiente para ir dormir”, descreve.

Evitar o uso de tela pelo menos 30 minutos antes de dormir e tomar um banho morno são outras recomendações. “Essa parte da higiene do sono é fundamental. A pessoa também deve evitar compartilhar o espaço do trabalho com aquele de dormir”, frisa Samantha, que é também preceptora multiprofissional do Centro de Educação e Pesquisa em Saúde Anita Garibaldi, do Instituto Santos Dumont.

A alimentação adequada também contribui para o descanso. O ideal é fazer refeições leves no jantar, evitando comidas de difícil digestão. No caso das atividades físicas, elas devem respeitar um espaço mínimo de quatro horas entre o exercício e a hora de deitar. Além disso, deve-se evitar bebidas alcoólicas ou que contenham cafeína, no período noturno. Outra dica é praticar atividades mais relaxantes antes de dormir, segundo o neurologista Manoel Sobreira.

Evitar a imersão e o consumo excessivo de informações negativas é outra medida para que a ansiedade não seja agravada e comprometa o descanso de uma pessoa. “Tem muita notícia boa, que traz esperança, e é preciso se agarrar nesses exemplos positivos”, complementa Samantha. Segundo a neuropsicóloga, ter momentos de relaxamento é fundamental, sobretudo para os mais ansiosos. “Cada um pode ter sua estratégia, tem que gosta mais de cozinhar, outro de dançar ou ouvir música. O que a gente sempre recomenda são atividades que envolvam a respiração, como sentir e ouvir ela”, exemplifica.

A neuropsicóloga acrescenta que manter o convívio social pode ajudar nesse processo, de trabalhar a saúde mental para que não haja repercussões negativas para o sono. Mesmo que de forma remota, as pessoas podem tentar aproximações com familiares e amigos. “[Pode] procurar ligar para alguém que gosta, marcar videochamada para o ver o rosto dela. Mesmo que de forma virtual, pode-se manter o ciclo de amizade e convívio social ativo”, salienta.

Como preparar o ambiente da casa para dormir?

Com a pandemia e o decreto de quarentena, as pessoas ficaram mais reclusas em casa, algumas compartilhando o ambiente doméstico com as atividades laborais. A mudança repentina, somada aos diversos fatores ansiogênicos promovidos pela situação de emergência na saúde, causa impactos diversos no organismo e sistema nervoso de uma pessoa, conforme Edgard Morya, coordenador de Pesquisas do Instituto Internacional de Neurociências Edmond e Lily Safra em Macaíba - Rio Grande do Norte.

“A pessoa não está mais trabalhando ou praticando esporte, vai ter que criar novos hábitos. Como pode fazer isso? Ela pode interagir de outro forma com as pessoas que estão na casa dela; incluir atividades físicas, que liberam neurotransmissores que promovem bem-estar”, elenca o pesquisador. Edgard destaca que o maior tempo de exposição a tela do computador durante a noite também dificulta a qualidade do sono. O hábito impede a liberação de hormônios que cooperam para o sono reparador.

Todos temos ciclo de sono com fases leves e profundas. Estímulos como luz ou barulhos podem vir a prejudicar o descanso, causando sonolência durante o dia, fadiga e cansaço, além de problemas de concentração ou memória. Como as pessoas estão passando mais tempo em casa, o pesquisador Edgard Morya frisa que elas podem aproveitar esse período de quarentena para identificar esses elementos, no ambiente doméstico, que comprometem o seu momento de descanso.

“Pode prestar mais atenção se tem luz ou barulho entrando, por onde [os estímulos] chegam, e tentar usar alguma coisa para vedar aquele local; se há uma janela, que quando passa um carro a luz do farol entra e, sem perceber, aquilo está te incomodando”, exemplifica. Outra opção é utilizar acessórios para os olhos e ouvidos para diminuir o estresse. O estímulo luminoso das telas também interfere na produção de hormônios. O ideal é preparar o quarto para que ele fique o mais escuro possível, evitar exposição a tela, e praticar atividades de relaxamento antes de dormir, finaliza Edgard.

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