Pandemia: reabertura pode causar "efeito bumerangue" em capitais nordestinas, diz Comitê Científico
Embora as capitais brasileiras tenham experimentado uma redução temporária nas taxas de ocupação dos leitos de enfermaria e UTI, elas ainda podem se deparar com uma "avalanche de casos graves", advindos do interiorO Comitê Científico de Combate ao Coronavírus, do Consórcio Nordeste, relata preocupação com o relaxamento social e critica reabertura econômica fora dos critérios estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Conforme o boletim divulgado pelo grupo na quinta-feira, 2, capitais nordestinas estão em risco de um efeito “bumerangue” que traria de volta os casos elevados da Covid-19, colocando em risco o sistema de saúde dessas capitais.
Segundo o boletim, apesar de as capitais brasileiras terem experimentado uma redução temporária nas taxas de ocupação dos leitos de enfermaria e de terapia intensiva (UTI), elas ainda podem se deparar com uma “avalanche de casos graves”, advindos do Interior. Dessa forma, o aumento no número de casos voltaria a produzir uma sobrecarga dos seus sistemas hospitalares, ameaçando-os com um colapso em um intervalo de tempo muito curto.
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Após passarem por períodos de isolamento social mais rígidos, São Luís, Fortaleza e Recife optaram por implementar planos de flexibilização das atividades econômicas. Nessa avaliação de reabertura, seria necessário um controle efetivo da propagação do coronavírus por um período de tempo seguro, de pelo menos duas a três semanas, conforme o relatório do Comitê Científico. Entretanto, com exceção de Fortaleza, nenhuma das outras cidades teriam apresentado documentação clara e “inequívoca” sobre esse controle.
Outro requisito seriam taxas controladas de ocupação de leitos de terapia intensiva, de forma a evitar a sobrecarga do sistema de saúde dessas capitais, que correm risco de novos casos graves em um efeito chamado “bumerangue”. “Nesta condição, o aumento de casos no interior dos estados resulta num fluxo de pacientes em estado grave para as capitais dos estados, uma vez que estas são as únicas que dispõem da infraestrutura hospitalar adequada (como leitos de UTI) para tratar destes casos”, explica o documento.
Em coletiva de imprensa online, na manhã desta sexta-feira, 3, o neurocientista Miguel Nicolelis, coordenador do Comitê científico, afirmou que Salvador está em uma "situação alarmante da pandemia". Por um mês, o grupo estudou a curva de infectados e a velocidade de ampliação dos casos e óbitos na cidade, bem como a ocupação de leitos de UTI. “Tivemos várias oscilações, as vezes subia para 86%, descia para 80%, caia mais um pouco. Vimos pela análise contínua que havia uma aceleração de casos e uma dinâmica que mostra que pode aumentar”, detalha.
Miguel acrescenta que, conforme os gráficos do boletim do Comitê Científico, o número de casos de Fortaleza era bem maior, mas graças ao lockdown eficiente, houve desaceleração. “Salvador está indo em direção oposta, os casos duplicam, em média, a cada 16 dias. Recife desacelerou muito mais, São Luís ainda mais, está dobrando a cada 22, 23 dias. Vimos que a curva de Salvador está em momento crítico. Por isso o aviso nesse momento”, complementa.
Índice de isolamento cai no Nordeste, onde grande parte da população ainda é suscetível à contaminação
O agravamento da Covid-19 no interior do Nordeste, e no interior do Ceará, onde registram-se números elevados do fator de reprodução da pandemia, também é motivo de preocupação. “As medidas [de combate ao avanço dos casos] são essas, conseguir manter e ir aumentando o isolamento social, fazer a busca ativa de casos nas casas das pessoas; temos que ter agentes fazendo testes, medindo a saturação de oxigênio com oxímetros, e se necessário, ajudar essas pessoas a se isolarem dos familiares”, detalha Miguel Nicolelis.
Depois de liderar o País em meses anteriores, o Nordeste viu seus índices de isolamento social caírem de forma “vertiginosa e disseminada” nas últimas semanas. Este fator, se mantido nos níveis atuais, contribuirá decisivamente para um crescimento de casos e mortes na região. À época, o índice de isolamento da população chegava a quase 60%, detalha Miguel Nicolelis. O ideal seria pelo menos 70%.
Também de acordo com o relatório do comitê científico, a subnotificação de casos pode continuar alta no Nordeste (entre 4 e 19 vezes). “Uma análise preliminar dos resultados obtidos através de um inquérito de soroprevalência para o coronavírus em Fortaleza revelou que a fração média da população que desenvolveu anticorpos para o coronavírus ficou em apenas 14.2%”, frisa o documento.
O relatório acrescenta que resultados semelhantes observados em outros estados brasileiros, como São Paulo e Espírito Santo, confirmam que uma fração importante da população nordestina e brasileira continua suscetível ao coronavírus.
Medidas para conter o avanço da pandemia
Os cientistas defendem que medidas de isolamento mais rígida devem ser adotadas em municípios interioranos. Aqueles que adotaram medidas mais relaxadas devem reverter a flexibilização. Principalmente os que estejam “apresentando curvas crescentes ou em platô em altos patamares de casos e óbitos, com fator de reprodução acima de 1, e que tenham excedido a taxa de ocupação de 80% de leitos (enfermaria e/ou UTI)”, ressalta o Comitê.
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Outra orientação é a instituição de barreiras sanitárias e bloqueio de tráfego não essencial. Assim como a implementação das "Brigadas Emergenciais de Saúde" em todos os estados do Nordeste, priorizando a busca ativa de casos nas suas fases iniciais, de forma a quebrar os altos índices de replicação do vírus. Por fim, o Comitê sugere a utilização do aplicativo Monitora Covid-19, com o objetivo de sincronizar estratégias regionais.
Fatores considerados para uma reabertura econômica segura
RT sensivelmente abaixo de 1;
Curvas de casos e óbitos com quedas consistentes e de grande monta por mais de 14 dias;
“É absolutamente necessário que cada estado faça inquéritos soroepidemiológicos regulares, para que, com a curva revelada, seja possível ter uma ideia aproximada da evolução do Covid-19”, diz trecho do boletim;
Para que qualquer reabertura ou flexibilização possa ocorrer, o Comitê recomenda que existam mais de 30% de leitos de enfermaria e/ou UTI disponíveis na localidade;
Segundo o comitê, quando preenchidas todas as condições epidemiológicas, sanitárias e de disponibilidade de leitos hospitalares, deve-se priorizar a seguinte ordem de abertura:
Parques, pistas e calçadões em praias;
Construção civil com redução de funcionários;
Comércio em feiras ao ar livre e lojas de ruas;
Treinamento de atletas profissionais;
Concessionárias e locadoras de veículos;
Serviços médicos, odontológicos e veterinários com agendamento;
Escritórios de advocacia, contabilidade e outros;
Shopping centers;
Eventos esportivos em estádios abertos (com distância mínima de 2m entre torcedores);
Academias;
Museus, cinemas e teatros com assistência reduzida;
Cultos etc. em templos religiosos.