Especialistas apontam como a desigualdade social aumenta efeitos do coronavírus em Fortaleza

Tema foi abordado por cinco pesquisadores em palestra virtual organizada pelo Programa de Pós-graduação em Saúde Pública da Universidade Federal do Ceará (UFC)

23:02 | Mai. 21, 2020

Por: Alan Magno
Especialistas avaliam que o isolamento social é menos efetivo nas periferias porque o Poder Público não oferece amparo suficiente para a população mais vulnerável (foto: Fabio Lima)

Existência de grande desigualdade social em Fortaleza é um dos fatores responsáveis por intensificar os efeitos do coronavírus na Capital. A conclusão foi debatida por cinco pesquisadores em palestra virtual organizada pelo Programa de Pós-graduação em Saúde Pública da Universidade Federal do Ceará (UFC). A iniciativa do encontro partiu do Observatório de Políticas Públicas em Saúde da Famed/UFC (OPP saúde), em parceria com o Comitê de Enfrentamento à Covid-19 da própria Famed.

A professora Maria Lúcia Bosi, coordenadora do Laboratório de Avaliação e Pesquisa Qualitativa em Saúde(Lapqs), mediou a conversa e iniciou o debate destacando a “banalização do debate sobre o isolamento” — maneira como se referiu ao modo com o qual as políticas públicas de isolamento estão sendo desenvolvidas.

A periferia não é devidamente analisada na concepção das diretrizes internacionais de isolamento, segundo a pesquisadora. “As pessoas precisam escolher entre se isolar ou sobreviver. O Estado não está provendo as mínimas condições para a população economicamente mais vulnerável se isolar”, pontuou.

Ao destacar os bons níveis de isolamento social alcançados em bairros nobres da Capital, a socióloga Danyelle Nilin, integrante do Laboratório de Estudos em Política, Educação e Cidade (Lepec) foi categórica em sua afirmação. “As classes mais altas podiam, por ter maiores condições, praticar o isolamento social. Mas isso faz com que eles utilizem cada vez mais a mão de obra da periferia”, destaca.

O Lepec realizou dois levantamentos para medir os deslocamentos e as aglomerações e a vida das comunidades durante a pandemia. 

O primeiro foi realizado entre os dias 8 e 11 de abril com 1977 pessoas de 120 bairros de Fortaleza e apontou que 40% dos entrevistados tinham alguém na família que estava saindo para trabalhar. Apontou ainda que 45% das famílias com renda acima de dois salários, continuavam usando faxineira, babás e domésticas.

“Esse acontecimento revela como as classe de maior poder aquisitivo têm uma inconsciência sobre a desigualdade e os perigos disso”, completou Fausto Nilo, arquiteto e compositor.

Sobre o fluxo do vírus e a concentração de óbitos na Capital, Jader de Oliveira Santos, professor do Programa de Pós-graduação em Geografia da UFC, destacou estudo — ainda não publicado —, fruto de uma parceria com o departamento de Geografia da Universidade Estadual do Ceará (Uece). Nele, afirma ter comprovado “resultados inevitáveis”.

O estudo mostra o início da propagação do vírus nos bairros mais nobres da Capital, posteriormente se disseminando para a periferia e o número de óbitos se concentrando em áreas mais pobres, onde as políticas de assistenciais são mais precárias e de difícil acesso.

“Uma das facetas da desigualdade dessa crise”, explicou. Ele pontuou ainda que o vírus não deve ser encarado como “democrático”, pois assume em seus impactos, características marcantes da desigualdade social existente em nossa sociedade.