Homens e moradores do interior são os que mais negligenciaram medidas de quarentena
Sensação de "invulnerabilidade" entre homens e crenças em alterações do vírus devido ao clima podem influenciar a situação; perfis foram construídos no início do decreto estabelecido pelo Ceará, há 15 dias
15:31 | Abr. 03, 2020
Homens e residentes de cidades do interior foram alguns dos perfis elencados entre os mais vulneráveis à infecção por Covid-19 no Estado. A pesquisa foi realizada conjuntamente por professores do curso de Odontologia da Universidade de Fortaleza (Unifor) e da Unichristus, Jiovanni Neri e Danilo Lima, e será publicada na edição de abril da Revista Ciência e Saúde Coletiva.
A pesquisa teve 2.259 participantes e foi elaborada no dia 19 de março, um dia antes das medidas de isolamento social passarem a valer no Ceará. Por meio de formulários divulgados online, os pesquisadores perceberam os grupos mais vulneráveis à doença no Estado durante o início do decreto. Perguntas sobre gênero, adesão voluntária a quarentena, nível de escolaridade e contato próximo com pessoas contaminadas foram alguns dos fatores considerados.
Os resultados reforçam que mais homens foram contaminados pela doença do que mulheres, como explica Jiovanne. "Há uma tendência histórica de homens se considerarem como invulneráveis e, devido a isso, eles se colocam muito mais em risco do que as mulheres." A negligência de adesão à quarentena de forma voluntária também reforça o dado: 15% dos homens que responderam a pesquisa não estavam respeitando as quarentenas do Estado e cerca de 56% estavam saindo constantemente de casa.
O estudo incluiu opiniões de muitos profissionais de saúde, setor onde a mão de obra é predominantemente feminina. Jiovanne informa que, historicamente, o autocuidado da mulher é muito maior que o dos homens e isso reforça a adesão às medidas de segurança estabelecidas pelo Estado.
Outros estudos também foram considerados na pesquisa e influenciaram nos resultados finais. Pesquisas realizadas em pandemias anteriores de Sars e Mers mostraram que essa "preferência" de contaminação por sexo pode ter a ver com o papel de cromossomos X da mulher e os hormônios sexuais no sistema imunológico delas. É importante saber que nenhuma pesquisa sobre o Covid-19 relatou ainda influência do sexo do paciente diante da contaminação. "Essas inferências foram feitas sob outros estudos. Mas o que podemos garantir é que elas se cuidam muito mais do que os homens".
Já em relação aos residentes do Interior, o pesquisador explica que a doença está sendo distribuída por meio de camadas sociais, conhecidas como "ondas". Em Fortaleza, os casos foram registrados primeiramente em bairros com bons índices socioeconômicos, como Meireles e Aldeota. Logo após, acometeu a classe média. A próxima etapa da doença, segundo Jiovanne, é a chegada em pessoas de baixa renda da Capital e em cidades do interior do Estado.
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A adesão a crenças sem comprovações científicas, como o calor e a influência de outras epidemias no Ceará, podem reforçar a não realização da quarentena voluntária nessas cidades do Interior e, assim, o aumento dos casos de coronavírus nessas regiões. Isso pode ocasionar uma influência negativa em leitos de UTI de Fortaleza, visto que os pacientes dessas regiões terão que ser transferidos para a Capital. O Governo do Estado está preparando mais de mil leitos para serem utilizados na retaguarda contra a pandemia.
Diferente dos países europeus e asiáticos, o Brasil tem pouca experiência com catástrofes e calamidades. Dessa forma, não existe uma cultura local de prevenção dessas situações. A reclusão em casa e o fato de nunca termos vividos algo parecido anteriormente podem reforçar a doença como algo simples ou passageiro, nos deixando em uma situação de vulnerabilidade.
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"No Momento em que o Governo deixa de se basear em dados científicos e passa a acreditar em crenças, o risco aumenta muito. O que precisamos enxergar é que nunca estaremos completamente preparados para a situação e devemos olhar o Brasil como um país que precisa melhorar seu âmbito de saúde e avançar na cobertura desses casos", explica o pesquisador, que informa que uma das principais preocupações é a ocupação de leitos de UTI por casos de coronavírus na substituição de outras doenças que também precisam utilizar os mesmos leitos para outros tratamentos.
Os resultados finais da pesquisa foram solicitados pela Prefeitura Municipal de Fortaleza e pretendem ser utilizados no combate a pandemia em todo o Estado. Como a pesquisa foi estabelecida no início do decreto, há 15 dias, esses perfis podem ser alterados, visto que existe a possibilidade de pessoas aderirem à quarentena domiciliar, por exemplo, dependendo das mudanças de rotina ocasionadas pela Covid-19.