'Mudou minha vida': os encontros com o papa que 'quebrava os protocolos'
Agência BBC

'Mudou minha vida': os encontros com o papa que 'quebrava os protocolos'

Fiéis que estiveram em Copacabana na visita do papa Francisco ao Brasil contam suas experiências. 'Em seis meses minha vida mudou', conta um deles.

Foto de Rennan Laurente segurando uma criança enquanto o papa Francisco o abençoa nas ruas de Copacabana.
Rennan Laurente
'Foi um delírio', diz Rennan Laurente, sobre a passagem do papa pelas ruas de Copacabana em 2013

A morte do papa Francisco, aos 88 anos, na última segunda-feira, deixou nos brasileiros uma mistura de sentimentos.

"Foi como se fosse alguém muito perto tivesse morrido, e a gente já sente essa falta", conta o analista de marketing Rennan Laurente. "A igreja fica órfã, mas a gente sente também."

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Laurente foi um dos milhares de brasileiros que estavam presentes na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, em julho de 2013, quando Francisco visitou o Brasil, em sua primeira viagem internacional como papa.

E é na memória daquele dia que Laurente se agarra para se confortar pela ausência do líder maior da igreja, o primeiro papa sul-americano e jesuíta da história da Igreja Católica.

Para receber a visita do papa, a família de Laurente, toda católica, abrigou dois peregrinos, vindos da Colômbia e da Venezuela. O evento com a presença do papa seria o encerramento de uma semana de atividades da Jornada Mundial da Juventude, o maior encontro do mundo direcionado a jovens católicos.

Laurente se recorda da via-sacra que eles participaram, os 13 quilômetros que andaram até a praia de Copacabana e da vigília que fizeram para esperar o papa no domingo. "Viramos a noite numa vigília, e me lembro que estava bem frio", conta.

Mas o sacrifício valeria a pena. No domingo, Laurente trabalhou como voluntário na organização do trajeto que o papamóvel faria por Copacabana. "Mas em nenhum momento passou pela minha cabeça que eu chegaria tão perto dele", diz.

Enquanto Laurente aguardava o papa passar, um casal se aproximou e pediu para que ele segurasse o filho deles, Miguel, que não tinha nem um ano de idade, para que o papa pudesse vê-lo ao passar.

"Eu segurei ele, mas estava muito retraído, porque o segurança fazia o sinal de não com o dedo", conta. Naquele momento o papa passou por eles, virou o corpo para Laurente e o chamou três vezes fazendo um sinal com a mão, segundo ele conta. "Foi um delírio, as pessoas jogaram toalhas, fitas, pediram a benção", diz.

O papa então beijou a cabeça de Miguel, fez o sinal da cruz em sua testa e depois abençoou Laurente, colocando a mão sobre sua testa.

Laurente conta que, passado o momento, as pessoas queriam encostar na criança, já que ela estava abençoada.

Mas o que o impressionou mais foi o gesto do papa. "A gente viu a gentileza e a nobreza no papa desde o início. O segurança disse 'não', mas ele quebrava os protocolos. Fez isso durante o percurso todo no Rio", diz Laurente. "Ele era um papa do povo e levou isso ao pé da letra."

A Jornada Mundial da Juventude ocorre desde 1986, acada dois ou três anos, em diferentes partes do mundo e costuma atrair multidões. Em 2013, o evento reuniu milhões de pessoas no Rio de Janeiro, sendo considerado um sucesso pelo Vaticano.

Rennan Laurente na Jornada Mundial da Juventude.
Rennan Laurente
Rennan Laurente foi voluntário na Jornada Mundial da Juventude, evento que se encerrou com uma missa celebrada pelo papa Francisco no Rio em 2013

A jornada, no entanto, ocorreu em um momento turbulento para o país, próximo ao que ficou conhecido depois como "jornadas de junho": uma série de protestos nas ruas cujo estopim foi a tarifa do transporte público.

Ainda assim, 3,2 milhões de pessoas estavam presentes na missa de Copacabana celebrada pelo papa Francisco.

Segundo pesquisa mais recente do Instituto Datafolha, metade (51%) da população brasileira era católica em 2022. Os dados sobre religião levantados pelo censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa (IBGE) em 2020 ainda não foram divulgados.

Murilo Bernardes.
Murilo Bernardes
Murilo Bernardes, que após ver o papa em Copacabana, tornou-se padre Murilo

'Em seis meses minha vida mudou'

Influenciado pela avó, Murilo Bernardes frequentava a igreja católica quando criança, mas se afastou da religião quando entrou na faculdade de análise de sistemas.

Formado, em um relacionamento estável e em um bom emprego, Bernardes conta que mesmo assim não se sentia feliz e realizado.

"Entrei em uma crise", diz. "Sentia um vazio no coração."

Ele conta que um amigo percebeu o momento que ele estava passando e o convidou para ir à Jornada Mundial da Juventude. "Eu fui, mas sem expectativas", conta. "Não esperava nada, queria conhecer gente nova só."

Mas ele diz que o evento mudou sua vida. "Era como se Deus estivesse falando através daquelas milhares de pessoas", conta.

"E olhando aquela multidão, eu pensei 'aqui é o meu lugar'."

De volta à sua cidade, Bauru, no interior de São Paulo, Bernardes estava decidido. "Voltei com o coração certo do que eu queria. Mudou minha vida", conta. "Em seis meses, eu saí do meu trabalho, neguei outra proposta de emprego e entrei no seminário."

E desde 2020, Bernardes é o padre Murilo em uma paróquia em Bauru. Aquela viagem mudou o percurso da sua vida.

"Ver o papa foi uma emoção muito grande. Ele é muito carismático e é como se estivesse olhando nos olhos de cada um que estava ali", conta.

O vazio no coração deu lugar a uma lembrança afetuosa. "Tenho uma relação de amor muito grande com o papa. Guardo com muito carinho aquele momento no meu coração."

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