Ministro indicado por Bolsonaro é condenado por improbidade administrativa
O Ministério Público de São Paulo acusa Ricardo Salles de cometer irregularidades na elaboração do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê, em 2016[FOTO1]Ricardo Salles, advogado indicado por Jair Bolsonaro para assumir o Ministério do Meio Ambiente, foi condenado nesta quarta-feira, 19, por improbidade administrativa. O juiz Fausto José proferiu a sentença que ainda suspendeu os direitos políticos de Salles por três anos, determinou o pagamento de uma multa e a "proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios."
Em maio de 2017, o Ministério Público de São Paulo (MP-SP) moveu uma ação civil pública ambiental e de improbidade administrativa, que resultou na condenação de Salles.
Os advogados do secretário do Meio Ambiente de São Paulo na gestão de Geraldo Alckmin (PSDB) recorrerão da decisão no momento “adequado”, segundo indicou em entrevista ao UOL. Para Salles, o juiz "deixa claro que não houve crime ambiental", que ele "não teve nenhuma vantagem pessoal nesse caso" e que a "condenação é ilegal".
A ação
De acordo com o MP-SP, durante o processo de elaboração do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental da Várzea do Rio Tietê, em 2016, "foram cometidas diversas irregularidades pelos demandados", com mudanças que podem causar danos ao meio ambiente, além de intimidação de funcionários e alteração de documentos.
O plano de manejo abrange uma área de proteção ambiental de 7.400 hectares. Ela foi criada em 1987 e compreende 12 municípios da Grande São Paulo.
De acordo com o juiz, o plano estabelece o zoneamento da região e as “normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade"'.
A acusação ainda diz que mapas elaborados pela Universidade de São Paulo (USP), a pedido da Fundação Florestal, foram alterados. Esta coordena e administra o plano de manejo, além de participar do esboço do seu decreto da mesma Área de Proteção Ambiental (APA). “Alguns funcionários da Fundação Florestal foram pressionados a elaborar mapas que não correspondiam à discussão promovida pelo órgão competente. Posteriormente, alguns funcionários foram perseguidos", escreveram os promotores.
Para assegurar a ação, o MP-SP também colheu depoimentos de especialistas afim de mostrar plano de manejo defendido por Salles poderia apresentar danos ao meio ambiente.
"Os professores Cleide Rodrigues e Jurandyr Luciano Sanches Ross não hesitaram em afirmar que a mudança de zoneamento e a permissão para a atividade mineradora, por exemplo, têm aptidão para lesar o meio ambiente", diz o documento.
O que diz Salles
Ao magistrado, Ricardo Salles declarou incansavelmente que as políticas de meio ambiente devem ser efetivadas com "desapego ideológico". No entanto, o juiz Fausto José Martins Seabra rebateu os argumentos do futuro ministro.
"A tutela do meio ambiente equilibrado está acima de convicções político-partidárias. Cuida-se de interesse difuso que transcende o indivíduo, o grupo, a categoria ou a classe. Tem por escopo a salvaguarda das gerações humanas atuais e futuras, bem como a proteção de outras formas de vida existentes no planeta.", escreveu.
Disse ainda que o material apresentado pela acusação comprovam “de modo satisfatório” que Salles incidiu no artigo 11, I, da Lei nº 8.429/92, “reiterando-se que tal proceder independe do prejuízo aos cofres públicos ou do enriquecimento do agente, exigidos nas figuras dos artigos 9º e 10º da LIA", afirmou o magistrado.
Opiniões sobre sua área de atuação
Indicado para o Ministério do Meio Ambiente por Bolsonaro, Ricardo Salles já atuou como diretor jurídico da Sociedade Rural Brasileira.
O advogado defende um menor intermédio do Estado na atividade dos produtores rurais. Além disso, é a favor de uma proteção maior à categoria no que diz respeito à relação com os movimentos sociais.
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“Essas invasões, essa coisa de MST, quilombola, índio ameaçando propriedade produtiva, isso é um grande problema, isso é um atraso”, declara em vídeo no seu canal no Youtube.
Salles ainda critica o projeto de lei “dos bois”, que esteve em tramitação no Congresso neste ano e previa a proibição do embarque de animais vivos nos portos. “Isso o Estado não pode fazer. Nós temos que garantir um ambiente seguro, estável, previsível, para que a produção rural possa ir cada vez mais para frente”, afirmou em vídeo divulgado em seu canal do YouTube.
O ministro indicado diz ainda que órgãos como o Ibama atuam de forma “ideológica” e não jurídica. Para ele, como disse à Folha, a multa aplicada a Bolsonaro por pesca em área de preservação ambiental é exemplo disso.
“Ele [Bolsonaro] não foi multado por pescar. Ele foi multado porque estava com uma vara de pesca. O fiscal presumiu que ele estava pescando. Então, veja bem, o exemplo que você [repórter do jornal] deu já mostra como a questão ideológica permeia a atuação estatal nesses casos. É preciso ter muito equilíbrio antes de rotular.”
No entanto, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o futuro ministro disse que a gestão de Bolsonaro irá “cumprir as leis”, como o Código Florestal. Declara ainda que não haverá “perseguição ideológica” em sua administração. “Haverá harmonia entre o meio ambiente e todos os setores produtivos. Eles têm de trabalhar em estrita parceria, não só com agricultura, mas com setores relativos à parte da indústria, construção civil, moradia.”
Conjuntura
Ainda em outubro, após a eleição, Jair Bolsonaro publicou em sua conta no Twitter que condenados por corrupção não teriam espaço em seu governo.
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"Nossos ministérios não serão compostos por condenados por corrupção, como foram nos últimos governos. Anunciarei os nomes oficialmente em minhas redes. Qualquer informação além é mera especulação maldosa e sem credibilidade", declarou Bolsonaro.
Salles disse ao UOL que a decisão de prosseguir como ministro do Meio Ambiente cabe ao presidente eleito. "Formalmente não é [um impedimento para assumir o ministério]. Se ele [o presidente] entender que é algo que não me permite assumir, a decisão é dele. Se ele mantiver a decisão, ainda pretendo assumir", declara.
O condenado faz parte de uma lista de nomes que têm “desgastado” a imagem de Bolsonaro, segundo palavras de seu filho Eduardo, antes mesmo de assumir. O filho do futuro presidente é envolvido em um atrito com o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
Além disso, o futuro chefe da Casa Civil no governo, Onyx Lorenzoni (DEM), é investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por repasses via caixa dois por parte da empresa JBS.
O jornal Folha de S. Paulo teve acesso aos documentos que mostram que Lorenzoni recebeu R$ 100 mil em agosto de 2012, em meio às eleições municipais. O coordenador da equipe de transição de Bolsonaro já havia admitido receber R$ 100 mil de caixa dois, para campanhas eleitorais e disse que deveria "pagar pelo erro". No entanto, não citou este outro caso de 2012.
Redação O POVO Online